Um modelo de licitação inédito no Brasil incluído no Regime Diferenciado de Contratações (RDC) para as obras da Copa e da Olimpíada, aprovado na semana passada na Câmara dos Deputados, permitirá ao governo delegar às empreiteiras todas as suas etapas, do projeto básico à conclusão dos empreendimentos. Na "contratação integrada", como é chamada, o governo fornece apenas um anteprojeto, em que dá as linhas gerais de seus objetivos com a obra e a empresa vencedora elabora o projeto e toca o empreendimento. O modelo, porém, gera dúvidas em especialistas. Para eles, isso pode retirar do poder público um importante mecanismo de controle do cumprimento dos contratos.
"A contratação integrada é praticamente uma não licitação", diz Pedro Serrano, professor de direito administrativo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. "Com o projeto básico nas mãos, o governo podia verificar se a obra foi realizada de forma adequada. A contratação integrada é deixar o lobo tomando conta das galinhas."
O modelo proposto no RDC é adotado por alguns estados norte-americanos, mas não é compatível com o sistema público brasileiro, na avaliação de Serrano. "Nunca existiu isso no sistema jurídico brasileiro", afirma. Ele critica ainda uma possível falta de objetividade na licitação. Como o governo não oferece um projeto básico no modelo de contratação integrada, as empreiteiras estarão livres para apresentar projetos completamente diferentes entre si. "Os projetos podem ser tão díspares que nem sequer é possível compará-los. Não existem critérios para isso."
José Carlos Oliveira, economista da Universidade de Brasília (UNB), ressalta que esse método poderá aumentar os gastos com as obras. "Se o governo não deixa claro o que quer, os custos posteriores, para adequar o projeto a seus objetivos, podem ser ainda maiores no futuro."
O texto do RDC diz que a contratação integrada poderá ser usada quando for "técnica e economicamente justificada", mas não especifica quais são as justificativas possíveis.
Na opinião dos especialistas, a polêmica em torno do sigilo dos orçamentos para as obras também não foi resolvida na Câmara. Uma mudança no texto deixou claro que os órgãos de controle terão acesso aos valores estimados pelo governo e os orçamentos serão divulgados ao fim das licitações. Serrano, porém, diz ver inconstitucionalidade na medida por ferir o princípio da "publicidade".
Para Carlos Pereira, da Fundação Getúlio Vargas, ainda que os órgãos de controle tenham acesso aos orçamentos, o sigilo não permite a fiscalização pela sociedade.
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