Boleiros
Para evitar rivalidade, papas Francisco e Bento XVI não assistirão à final juntos
A rivalidade entre Argentina e Alemanha, finalistas da Copa, não se estenderá ao Vaticano. A Igreja Católica informou, ontem, que o papa Francisco não assistirá à decisão com seu antecessor, Bento XVI.
Torcedor do Bayern de Munique, Joseph Ratzinger tem um perfil bem menos boleiro que o de seu sucessor. Em 1985, um ano antes do Mundial do México, em que os argentinos bateram os alemães, o então cardeal de Munique escreveu um texto sobre o torneio, incluído depois no livro Buscai as coisas do alto.
"Nenhum outro evento no mundo consegue ter um efeito tão grande, o que demonstra que este evento esportivo toca algum elemento primordial da humanidade. O jogo vai muito além da vida cotidiana. Simboliza a própria vida, e a antecipa de modo livremente estruturado", escreveu, exaltando o trabalho em equipe e o aprendizado de uma leal rivalidade embutidos no futebol. "Se formos mais fundo, o fenômeno de um mundo apaixonado por futebol pode nos dar muito mais do que só um pouco de diversão", concluiu.
A Cidade do Galo foi a casa da Argentina na Copa de 2014 e, para se sentir à vontade, os visitantes decoraram tudo à sua maneira. Na fachada frontal do hotel, frases de incentivo sobre um fundo alviceleste lembravam os "trapos" pendurados nos alambrados dos estádios. Mas foi na face lateral que ficou a imagem mais imponente. Um painel de dez metros de altura, com uma foto do time e do técnico Alejandro Sabella com o mais ilustre torcedor da seleção, o 24.º jogador na busca pelo tricampeonato mundial: o papa Francisco.
Torcedor declarado e sócio do San Lorenzo, Francisco tornou-se um talismã do futebol e da seleção argentina. O Ciclón saiu de uma fila de seis anos no primeiro campeonato nacional disputado após seu hincha mais famoso assumir o trono de Pedro. Agora, está a quatro jogos de, enfim, vencer uma Libertadores, conquista que todos os outros grandes argentinos e até o pequeno Vélez Sarsfield têm.
Com a seleção, a relação do pontífice é vista como igualmente abençoada. A foto que virou painel em Minas Gerais foi tirada em audiência no Vaticano, antes de amistoso com a Itália, em agosto do ano passado. Depois do encontro, a Albiceleste fez 15 jogos e perdeu apenas um 3 a 2 para o Uruguai, nas Eliminatórias, com os argentinos já classificados e a Celeste jogando a vida.
A esperança de uma "ajuda divina" por intermédio de Francisco foi personificada por um comercial do canal local TyC Sports. A propaganda usa trechos do discurso do papa na Jornada Mundial da Juventude, ano passado, no Rio, como se fosse uma preleção para os jogadores. O resultado é um texto que realmente parece ter sido feito para um time, não para fiéis. O anúncio termina com o slogan: "Se um argentino fez isso no Brasil, imaginem 23".
Os 23 escolhidos de Sabella tiveram a caminhada pelos gramados brasileiros acompanhada com atenção e bom humor por Francisco. Um de seus encontros semanais com os fiéis na Praça São Pedro coincidiu com o dia do jogo com a Nigéria. O pontífice girou como um hincha a camisa da seleção que recebeu de um torcedor.
No dia do jogo com a Suíça, pelas oitavas de final, o Vaticano publicou no perfil de Francisco no Twitter uma charge brincando com a nacionalidade da sua guarda pessoal. "Vai ser guerra", divertiu-se o próprio papa antes do jogo.
Imagens do seu rosto em bandeiras e máscaras viraram itens obrigatórios para os milhares de argentinos que vieram assistir à Copa no Brasil. Em uma mensagem escrita em português no dia da abertura do torneio, pediu que o Mundial pudesse se transformar em uma festa de solidariedade entre os povos. Uma semana depois, ao jornal La Vanguardia, da Espanha, revelou um pedido dos fiéis. "Os brasileiros pediram que eu fosse neutro, e eu vou cumprir com a minha palavra, porque Brasil e Argentina sempre foram antagonistas."
Neutralidade que será exercida amanhã, no Vaticano, onde ele assistirá ao jogo. Se tudo der certo para os argentinos, em breve Sabella e seus comandados voltarão à Santa Sé atualizar a foto que abençoou a campanha. E pôr mais um milagre futebolístico na conta do papa boleiro.
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