Escola, trabalho, relacionamento, lesões, falta de apoio, de dinheiro, outras prioridades. O funil que filtra a carreira de jovens promessas tem várias facetas. Para cada destaque do esporte, milhões ficam pelo caminho. Uns felizes; outros, frustrados. A maioria com a bagagem esportiva infiltrada nas suas novas profissões.
Contemporâneos de estrelas das quadras, piscinas e tatames paranaenses em algum momento mudaram o rumo. Veem o sucesso alheio e que passou tão perto de camarote.
"Mudei até meus horários de trabalho para acompanhar as lutas da Natália Falavigna na Olimpíada de Pequim [2008]", conta a gerente de marketing Fernanda Pires.
Talento do tae kwon do nos anos 90, foi ela quem convidou a paranaense para começar a praticar a modalidade, na qual se tornaria uma referência internacional. A gravidez precoce fez Fernanda assumir outro papel.
"A maneira como o atleta vai lidar com esse momento de transição depende dos motivos que o levaram a abandonar a carreira. Nunca é fácil. A pessoa deixa para trás o mundo que ela conhecia, suas referências. O esporte era a identidade dela", comenta a psicóloga do esporte Chayane Godoy.
"Se a pessoa conseguiu alcançar os objetivos, muitas vezes isso fica como uma boa lembrança e a transição se torna mais fácil", reforça.
Quando a aposentadoria é muito a contragosto, a sensação de fracasso pode ser uma companhia constante. "Muitos atletas transpõem aquele desejo não realizado para o filho. Incentiva para que pratique determinado esporte, acompanha em viagens, faz de tudo. Só que a criança pode não ter o mesmo interesse do pai", analisa a psicóloga Marcia Regina Walter, presidente da Sociedade Brasileira de Psicologia do Esporte, com sede em Curitiba.
Segundo ela, não há um levantamento oficial por modalidade, mas o número de desistências é muito grande, podendo chegar a 90% no futebol, por exemplo. "Trabalhei com vários atletas que tinham um potencial enorme e poderiam ser expoentes. A maioria não consegue se manter por falta de incentivo", aponta Marcia.
A favor dos quase-atletas sempre estará, ao menos, a vivência esportiva. Disciplina, hierarquia, socialização e a forma como vão enfrentar os desafios são transferidos para o cotidiano. "Só o fato de ter praticado uma modalidade fará diferença. O esporte tem um papel social muito importante. A pessoa ainda vai saber lidar de forma melhor com as conquistas e fracassos do dia a dia", aponta Chayene.
"No mínimo a pessoa será mais saudável, pois muitas vezes mantém a prática esportiva como lazer. E ainda tem aquele grupo social com quem irá se relacionar", cita Marcia, com um exemplo que se enquadra perfeitamente: a do ex-jogador Paulo Preto.
Ele defendeu a Cocamar entre 83 e 93 ao lado de uma geração expressiva do vôlei paranaense. "Mantemos contato até hoje", conta o advogado.