Entrevista
Muriqui, jogador do Guangzhou.
Sem muito destaque em clubes brasileiros, Muriqui foi para a China em 2010 e tornou-se protagonista. Defendendo o Guangzhou Evergrande, o jogador, de 25 anos, terminou como artilheiro da liga local em 2011 e foi eleito o jogador do ano no país asiático. No clube que trouxe Conca a peso de ouro, o verdadeiro ídolo ainda é Muriqui. O atacante conversou, por telefone, com a reportagem.
Por que você acha que se deu tão bem no futebol chinês?
Procurei aprender com eles, principalmente a questão de obediência tática, porque no Brasil os atletas são mais relaxados com isso.
Como você se adaptou com tanta facilidade ao país?
O mais complicado é a língua, totalmente diferente, não dá para entender quase nada.
Os primeiros seis meses foram os mais difíceis, pois fiquei sozinho. Tinha um casal de amigos que me ajudava muito. Podia, por exemplo, comer arroz, feijão na casa deles e isso amenizou um pouco.
Já pensou em se naturalizar chinês por causa da seleção?
Nunca houve nada de concreto, apenas especulações pelo fato de a seleção daqui não estar em uma boa fase. É uma coisa que tem de se pensar muito, porque, além do lado profissional, mexe com o pessoal. Mas agora isso não está na minha cabeça, só quero ajudar meu clube.
Planeja ficar muito tempo no futebol chinês?
Tenho mais dois anos de contrato e já fizeram proposta por mais quatro. Estou esperando para decidir.
Franquias
O campeonato foi profissionalizado na China apenas em 1994, chamado ainda de Liga Jia-A. A Super Liga Chinesa passou a ter essa denominação uma década depois, em 2004. Os times de maior tradição no país são Beijing Guoan, Dalian Shide, Shandong Luneng e Shanghai Shenhua. A competição tem um formato de disputa simples e ocorre de março a dezembro. São 16 equipes e todas se enfrentam em turno e returno. Os dois últimos colocados são rebaixados. Uma curiosidade é que, assim como costuma ocorrer com os times de vôlei e basquete no Brasil, os times de futebol mudam de nome com frequência e, algumas vezes, até de cidade pois são franquias. Isso porque os clubes estão diretamente ligados a patrocinadores e donos. (AR)
DM chinês inquieta os brasileiros
A estrutura do departamento médico é o que mais deixa a desejar nos clubes chineses. Sem aceitar métodos ocidentais de tratamento, as soluções oferecidas aos jogadores que atuam no país se resumem basicamente à água quente, massagem e acupuntura. "É de dar dó quando um jogador que está lá machuca o joelho, por exemplo. Em geral, os atletas demoram para se recuperar, ficam com sequelas", relata o técnico Zequinha.
"Às vezes existe um ou outro aparelho fisioterapia, mas é difícil. Tem que sair do país para tratar", complementa.
Foi o que fez o atacante Cléo. Problemas musculares o deixaram fora de várias partidas da última temporada. Mesmo na equipe mais rica da China, o setor médico também é precário. Para se recuperar de vez, o paranaense teve de vir ao Brasil para um tratamento com o médico da seleção, José Luiz Runco.
"Não tem médico que possa tratar de uma contusão. Eu tive lesões e precisei sair de lá. Nesse aspecto, eles ainda são amadores", conta. (AR)
Sem tradição com a bola nos pés, a China trabalha na surdina para fortalecer seu mercado interno. Com investimento pesado, o país asiático vai se transformando em promessa de Eldorado para os jogadores de regiões mais prósperas no futebol. A peregrinação inclui muito "pé de obra" brasileiro.
De 2002 a 2010, período fornecido pela CBF, o Brasil enviou 153 jogadores para o incipiente campeonato chinês. No ano passado, 23 atletas nascidos por aqui jogavam do outro lado do planeta mesmo sem tradição alguma no esporte, já é o 15.º campeonato estrangeiro com mais presença verde-amarela.
A intenção é clara, pegar carona no aguardado boom do futebol nesta superpotência econômica e esportiva. E a explicação está na estratégia adotada pelo mercado comunista: oferecer altos salários e atrair atletas de maior qualidade para melhorar, por tabela, o nível técnico da Liga. Um círculo vicioso, mas para o bem.
No ano passado, o meia argentino Conca, por exemplo, foi para lá, contratado por cerca de R$ 15,5 milhões com ganhos mensais de quase R$ 2 milhões. O francês Nicolas Anelka é outro que, em 2012, desfilará no campeonato vermelho.
Os clubes estrangeiros também estão de olho no crescimento do interesse pelo futebol na nação mais populosa do mundo. O pensamento está no grande potencial consumidor, tanto que gigantes como Real Madrid e Manchester United costumam ir até a China em suas pré-temporadas. No Brasil, em uma estratégia de marketing, o Corinthians trouxe um chinês para compor o elenco.
José Carlos de Oliveira, de 64 anos, o Zequinha, foi um dos primeiros brasileiros a se aventurar nos estádios chineses. Recebeu um convite por, nos tempos de Atlético, ter trabalhado com a comissão técnica da seleção sub-20 do país, que passou um período no Rubro-Negro. Logo na primeira temporada, em 2000, o time conquistou um inédito título da Segunda Divisão.
Pronto. Foi o suficiente para se tornar ídolo. Emendou trabalhos na região até 2006. Após quase cinco anos parado, aceitou uma nova missão e assumiu o Wuhan Zhongbo, equipe modesta na terra de Mao Tse Tung. "Eu não estava mais a fim de ir, mas agora estou com a saúde boa [já sofreu dois enfartes] e a China é um lugar gostoso, tenho pessoas conhecida no clube. Quero ajudá-los", conta ele, que encara 30 horas de viagem para participar de sua 8.ª temporada na competição.
O guarapuavano Cléo, ex-jogador do Atlético, é outro paranaense na terra da Grande Muralha. Ele aceitou o convite para atuar no Guanghzou Evergrande, o time de Conca, no ano passado. Mesmo fora de boa parte da temporada por causa de uma lesão, o atacante conseguiu marcar dez gols na última temporada. "O clube montou uma base para ser campeão e conseguimos", vibra.
Os bons salários têm como contraponto o processo de adaptação a uma cultura bem diferente da brasileira. "Fui bem tratado quando estive lá, mas a gente sente muito a questão do idioma e da alimentação", relembra o ex-jogador Marlon Lopes que, em 1999, deixou o Paraná para passar cerca de três meses na China.
"Não é comum no dia a dia, mas oferecem as comidas exóticas como escorpiões e cobras. E a comunicação funciona só por meio do intérprete. É difícil usar metáforas do futebol e os chineses são ruins de mímica", diz o experiente Zequinha, entre risos.
Apesar disso, os brasileiros afirmam que há espaço para o futebol avançar em larga escala na região como tudo que diz respeito ao gigante oriental. Um passo importante foi dado há cerca de três anos ao se investir contra a corrupção nos jogos.
Acusados de envolvimento em esquemas de compra e venda de partidas começaram a ser julgados em dezembro do ano passado. O próprio Zequinha admite que chegou a receber uma proposta para entregar jogos na temporada de 2003. "Larguei o clube e denunciei. Esse tipo de coisa atrapalhou muito o futebol por lá, contaminou os jogadores e tirou o interesse de muitos torcedores", opina.
"O pessoal gosta de futebol, enche os estádios. Os clubes estão se estruturando e vão investir cada vez mais, então a liga vai crescer. Só tem que dar tempo para isso", reforça Cléo, que começa a criar raiz em uma China ainda figurante com a bola nos pés. Henrique, filho de cinco anos do atleta, é prova disso. Ao cumprimentar outro garoto em uma praça de Guarapuava, solta um simbólico Ni hao oi, em mandarim.
Talvez para essa geração, a distância entre a qualidade do futebol praticado por lá e a concretização do sonho de superpotência da bola chinês já seja bem menor.
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