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Mesmo detalhes são capazes de indicar o grau de organização de uma liga. Na NBA, as equipes são obrigadas a ter um uniforme claro e um escuro. Criada para ajudar o público quando ainda havia televisores preto e branco, a medida virou uma maneira de as equipes ganharem dinheiro com uniformes de igual peso. A Premier League regula absolutamente todos os detalhes da camisa. Número, nome do jogador e tamanho da marca do patrocinador (um apenas) se encaixam em parâmetros comuns a todas as equipes.

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Estádios vazios, violência, desequilíbrio financeiro, baixo nível técnico. A cada rodada o Campeonato Brasileiro lembra o quanto precisa de uma reforma para dar um retorno compatível com o tamanho – ao menos histórico – do futebol nacional. Para encontrar a solução, é inevitável engolir o orgulho e buscar exemplos fora. E por fora entenda-se não apenas do país, mas do próprio futebol. Na Europa e nos Estados Unidos, ligas de diferentes modalidades apresentam exemplos de relacionamento com o torcedor, busca por receita, formação de jogadores e distribuição de dinheiro que deram certo por lá. E que, com a devida adaptação ao cenário nacional, ajudem a reduzir o 7 a 1 de cada domingo nos gramados brasileiros.

Finanças

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De todas as contrapartidas em discussão na Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte (LRFE), a que exigirá maior mudança de hábito é a que limita os gastos com o futebol a 66% da renda bruta. Passo fundamental para bater outra meta, de, em cinco anos, zerar o déficit anual. Em 2013, a média de gastos com futebol foi de 68% – em algumas equipes, passou de 100% – e o déficit médio beirou os 10%.

A Europa deu os primeiros passos para quebrar essa lógica em 2004, quando a Uefa começou a definir as diretrizes do Fair Play Financeiro. Criados especialmente para inibir os gastos de bilionários, os parâmetros começam a ter impacto mais direto na atual temporada. O PSG deve se livrar de Edinson Cavani amanhã, último dia da janela de transferências, para manter os gastos dentro do permitido. Na Espanha, o Real Múrcia foi rebaixado da segunda para a terceira divisão por não comprovar saúde financeira para a temporada.

No esporte americano, o controle de gastos é guiado pelo teto salarial. Liga mais lucrativa do país, a NFL permite a todas as suas equipes o gasto anual de R$ 130 milhões com elenco, sem exceções. Na NBA, é possível furar o teto, mas cada dólar extra tem valor maior no balança financeira do clube. A MLS, do futebol, pratica um sistema híbrido: existe teto, mas três jogadores do elenco podem receber que o clube bem entender. Países que endureceram mais o controle de despesas tiveram resultados melhores em suas ligas. Na Bundesliga, os clubes gastam 40% da receita com salários. Perdem em poder de atratividade de grandes craques, mas ganham em confiança dos investidores.

"A qualidade do investidor é outra. Na Alemanha é Adidas, Audi, Volkswagen, Allianz. No Brasil não há segurança para o investidor, mesmo com potencial de retorno. Mesmo na Inglaterra a qualidade do investidor é inferior", diz o economista Fernando Ferreira, diretor da Pluri Consultoria.

Público

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Nos três últimos anos, nenhum clube atraiu mais torcedores que o Borussia Dortmund. Média de 80.297 por partida e apenas 30 lugares vazios no Signal Iduna Park na temporada passada. Marca impressionante simbolizada pela enorme arquibancada atrás de um dos gols. Pela bagatela de 9 euros, é possível fazer parte da "muralha amarela", a incansável torcida que forma mosaicos e pula do início ao fim dos jogos. Pula porque ali não há cadeiras, um dos segredos da liga que mais cresce no mundo: um espaço onde se pague barato.

Atender um desejo do público é estratégia comum nas ligas bem-sucedidas. A Bundesliga promove um aumento médio nos ingressos de 3,2% ao ano, em um país com inflação na casa de 2% ao ano.

Mesmo quem não tem uma política de preços populares, encontra maneiras de manter a casa cheia. O Barcelona cobra pelo mesmo lugar 23 euros para um jogo com o Córdoba e 98 euros para o clássico com o Real Madrid. O associado que não vai ao Camp Nou pode aderir a um programa em que avisa a ausência e divide com o clube o lucro pela revenda do ingresso. A ideia é manter o estádio cheio, lógica vinda dos EUA. "Cada lugar é visto como um produto numa gôndola de supermercado. O gestor do espaço não pode admitir que aquele produto encalhe no estoque", diz Erich Beting, editor do site Máquina do Esporte.

Times da NBA chegam a derrubar o preço para jogos de baixa procura a menos de um dólar. Tanto a liga de basquete como a de beisebol oferecem, também, carnês intermediários, em que o torcedor compra um pacote de dez jogos à sua escolha. "Um jogo precisa ser visto como um produto que é colocado à venda. A ida do torcedor é uma das últimas preocupações de um gestor no esporte brasileiro", define Beting.

Globalização

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109.901 torcedores registraram, em julho, o maior público do futebol em um estádio norte-americano… com um jogo entre Manchester United e Real Madrid. A multidão arrastada por dois dos quatro maiores clubes do mundo indicou o sucesso de uma estratégia consolidada entre os europeus, a de buscar novos mercados.

Saturados no próprio quintal, clubes como Barcelona, Chelsea, Real Madrid, Man­­ches­­ter United, Bayern e Liverpool partiram em bus­­ca de novos continentes. Começaram pela Ásia, fincaram um pé na Austrália e, este ano, fizeram dos EUA a sede da sua pré-temporada.

No fim de julho, um dos gráficos na apresentação do balanço financeiro do Barça lembrava um tabuleiro de War. O clube tem, hoje, 30 parceiros comerciais espalhados por 17 países e quatro continentes. Estrutura que assegurou uma receita de R$ 1,5 bilhão e levou os catalães a apontarem Brasil e Rússia como próximos alvos. "Somos a equipe que mais cresceu em nível mundial e a única com potencial para melhorar seus contratos. Assim, vamos reforçar nossa presença mundial", disse o vice-presidente econômico do Barça, Joan Faus.

Timidamente, os brasileiros buscam uma presença mais global. O Cruzeiro fez amistosos nos Estados Unidos nos dois últimos anos, mas ainda não apresentou resultados concretos. O Atlético começa a dar os primeiros passos no mercado indiano, com parceria e cessão de cinco jogadores para a nova liga do país.

"É um caminho interessante", diz o consultor de gestão do esporte, Amir Somoggi. "O futebol brasileiro não tem um clube global e a seleção está em crise. É uma oportunidade para crescer. No Japão, por exemplo, vários clubes brasileiros foram campeões mundiais, mas nenhum atua nesse mercado", cita.

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Formação

A revolução que levou a Alemanha ao tetracampeonato mundial no Brasil teve o investimento nas categorias de base como fator preponderante. O projeto elaborado pela Federação local após a eliminação na primeira fase da Euro-2000 obrigava os clubes a investir na formação de jovens jogadores. Para garantir a qualidade das instalações e da formação, os clubes deveriam ter centros de treinamento certificados segundo parâmetros rigorosos. Hoje, são 50 pelo país com a graduação máxima.

Além de manter suas estruturas, as equipes passaram a ser obrigadas a ter um determinado número de jogadores feitos em casa no elenco: oito. Nem precisava estipular um mínimo. O limite de gastos com salários inibia investimentos abusivos. A solução era apostar em garotos, naturalmente mais baratos, e inevitavelmente bons por terem sido formados em centros de treinamento de ponta.

O modelo alemão logo foi ampliado para o continente. Também com o objetivo de frear os gastos milionários, a Uefa instituiu cotas de pratas da casa nas suas competições. Um time de Liga dos Campeões tem de dividir o elenco em duas listas. Na "A" são 21 nomes, sem qualquer tipo de restrição. Na "B" estão aqueles formados nas categorias de base, independentemente da nacionalidade. Um modelo interessante, mas não infalível.

"Enquanto jogou pelo Arsenal, o Fàbregas sempre foi inscrito na lista B. Mesmo já sendo o craque do time, ele continuava se enquandrando na categoria pratas da casa porque tinha jogado o tempo necessário na base do clube", exemplifica Ubiratan Leal, editor do site Trivela, especializado em futebol internacional. Na edição 2014/15, o Barcelona, ex-clube de Fàbregas, usará a lista B para inscrever o marroquino Munir, reserva de Neymar.

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O futebol brasileiro começa a esboçar um modelo. Para 2015, a CBF estuda a realização de um Brasileirão Sub-20 por pontos corridos. Falta, porém, o principal: criar condições para que a formação de jogadores seja mais eficiente e qualificada no país.

Televisão

Esporte mais popular dos Estados Unidos, o futebol americano tem uma distribuição de receita quase socialista para os padrões do país mais capitalista do mundo. Prestes a assinar um novo contrato nacional de transmissão de US$ 7 bilhões/ ano, a NFL divide o bolo de maneira exatamente igual entre as 32 equipes da liga. Uma medida que restringe o desequilíbrio aos contratos regionais.

"Nos contratos regionais prevalece o tamanho do mercado. Equipes de cidades maiores ganham mais, mas como são poucos jogos na temporada regular [16] a diferença é reduzida. No beisebol, como são mais jogos [162 na temporada regular], a diferença na distribuição acaba sendo maior", compara o jornalista Ubiratan Leal, editor do ExtraTime, site especializado em esportes americanos.

A negociação coletiva que garante o equilíbrio no futebol americano tem exatamente o mesmo efeito nas principais ligas do futebol europeu. A Bundesliga divide os 700 milhões euros anuais de maneira que o time mais rico receba o dobro do mais pobre, seguindo apenas critérios técnicos. É montado um ranking dos cinco últimos anos, no qual o líder (sempre o Bayern) recebe o maior valor e os demais vão recebendo uma fração a menos, até que o 18.º time do ranking fique com 50% dos bávaros. Ainda há uma parcela reservada à segunda divisão.

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Menos radical que a Alemanha e os americanos, a Inglaterra também tem um modelo de divisão mais justa. A receita total é dividida em três blocos. O primeiro é subdividido em partes iguais entre os 20 clubes. O segundo, de acordo com a classificação na temporada. O terceiro, seguindo o número de jogos transmitidos. Aqui, há um porém: cada time recebe o equivalente a no mínimo dez jogos na tevê.

Adepta da negociação individual como no Brasil, a Espanha está rediscutindo seus critérios. Hoje, Barcelona e Real Madrid recebem o triplo do Valencia (terceiro mais agraciado pelo dinheiro das transmissões) e sete vezes a cota dos times que subiram da Segunda Divisão. A partir de 2016/17, o repasse a Barça e Real será congelado, enquanto os demais clubes terão aumentos graduais que aproximem a partilha espanhola do modelo inglês.

Novas fontes

A Premier League começou a temporada 2014/15 com um inimigo: o aplicativo de compartilhamento de ví­deos Vine. Cada gol ou lance de jogo com os quatro segundos suportados pelo serviço desvaloriza o contrato anual de 3 bilhões de libras pela transmissão do torneio. Bolada destinada, também, a pagar a venda de pacotes de gols e melhores momentos nos sites dos jornais The Sun e The Times. Na televisão convencional, já é consagrada a venda dos lances capitais da rodada para a BBC.

Enquanto no Brasil a captação de receitas de marketing resume-se, basicamente, a televisão e patrocínio de camisa, o mundo corre para descobrir novas formas de ganhar dinheiro. Os americanos puxam esse movimento para driblar restrições impostas pelo modelo de ligas. As equipes não podem exibir patrocínio na camisa e contratos mais básicos, como de fornecimento de material esportivo, são de monopólio. A solução é buscar outras formas de ativação.

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"Como não podem expor sua marca no uniforme, as empresas americanas entenderam que o marketing esportivo vai além da visibilidade e que precisavam explorar negócios com o clube. Então elas passaram, por exemplo, a usar as arenas e os eventos das equipes para fazer relacionamento com clientes e torcedores", explica o consultor de gestão esportiva, Amir Somoggi.

Formada à semelhança das ligas americanas, a inglesa Premier League adaptou o modelo ao futebol. Os clubes têm liberdade para negociar contratos de patrocínio, mas ampliaram a oferta a exposições distantes dos gramados. "O Manchester United vende cotas de patrocínio para mercados específicos, como um banco para ações no mercado asiático. O clube tem 1,5 milhão de consumidores ativos no site, não precisa oferecer apenas espaço na camisa", explica Somoggi.