O famoso “acordo de cavalheiros”, que veta a utilização de atletas emprestados em partidas contra suas equipes de origem, foi considerado ilegal pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). A Primeira Comissão Disciplinar acatou denúncia e puniu Corinthians, Flamengo, Internacional, Grêmio, Coritiba, Sport e Atlético-MG. Por 4 votos a 1, todos receberam advertência. Cabe recurso.
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A punição, no entanto, deverá ter resultado prático nulo. Isso porque, em geral, os acordos entre equipes preveem o pagamento de multas elevadas um ao outro no caso de utilização de atletas emprestados em partidas entre as equipes.
A denúncia da procuradoria partiu após um inquérito conduzido pelo auditor Décio Neuhaus, que compõe o Pleno (última instância) do STJD. Neuhaus ouviu jogadores de clubes da Série A emprestados a outras equipes e considerou a existência de acordos para que eles não entrassem em campo contra os clubes dos quais eram oriundos. No caso de Flamengo e Corinthians, a questão envolvia o contrato de compra e venda do peruano Paolo Guerrero. A partir do relatório, a procuradoria do STJD decidiu oferecer denúncia.
“A procuradoria entende que o acordo, seja ele expresso nos contratos ou não, traz uma situação inusitada mundo afora e que é conhecida no Brasil, mas que é coibida pelo regulamento”, disse o procurador William Figueiredo. “Isso pode trazer resultados danosos para aqueles clubes que estão disputando o chamado G4, ou aqueles que estão na zona de rebaixamento”, sustentou, pedindo a punição dos envolvidos.
No total, 12 clubes foram julgados nesta segunda-feira - Palmeiras, Goiás, Atlético-MG, Vasco, Internacional, Coritiba, Cruzeiro, Sport, Flamengo, Corinthians, Grêmio e São Paulo. Todos eles mandaram advogados de defesa.
Como todos os casos eram semelhantes, as defesas acabaram colaborando umas com as outras em suas sustentações. E elas eram complementares umas às outras: houve quem argumentasse que a denúncia foi mal elaborada, houve quem considerasse que ela não era passível de análise - já que foi baseada no Regulamento de Registro e Transferência da CBF, e não no Regulamento Geral de Competições da entidade -, houve quem lembrasse que os clubes não envolvidos (e que, portanto, poderiam ser prejudicados) não se manifestaram contra os acordos.
Já a defesa do Internacional foi ainda mais veemente, e defendeu que o acordo deve existir. “Trata-se de um contrato comercial entre três partes (dois clubes e um jogador), e não um acordo de cavalheiros”, afirmou o advogado Daniel Cravo. “E se o clube chegar para o atleta e falar que, nesse caso, não irá emprestá-lo? Ele vai preferir ficar a temporada inteira sem jogar? E se o jogador, que tem parte do salário pago pelo clube de origem, for lá e marcar um gol contra, que irá tirar o time da Libertadores? Como fica?”, indagou.
Advogado do Corinthians, João Zanforlin lembrou que o acordo entre o clube do Parque São Jorge e o São Paulo (empréstimo do atacante Alexandre Pato) foi firmado antes da redação do texto do Regulamento de Registro e Transferência da CBF, datado de janeiro deste ano. E ironizou: “A CBF anda querendo imitar as coisas da Fifa, como se a Fifa fosse bom exemplo”. Zanforlin ainda lembrou que a CBF validou o contrato de transferência de Pato entre os dois clubes.
Na leitura de seus votos, o relator Felipe Bevilacqua apontou “falta de capricho” da procuradoria, que teria anexado à denúncia provas insuficientes. Por esse motivo, ele absolveu São Paulo, Vasco, Cruzeiro, Palmeiras e Goiás. Mas puniu Internacional e Coritiba (empréstimo do atacante Wellington Paulista), Flamengo e Grêmio (zagueiro Erazo) e Atlético-MG e Sport (atacante André) em R$ 5 mil.
O Corinthians também foi punido, e nesse caso o relator foi duro citando o caso do atacante Paolo Guerrero. “De cavalheiros, o acordo não tem nada”, disse Bevilacqua. “Viola todos os princípios de ética, moral e esportivo”. Ele puniu o Flamengo em R$ 10 mil e o Corinthians em R$ 5 mil.
Os demais auditores tiveram votos semelhantes, com pequenas variações nas penas. Um deles absolveu o caso envolvendo a transferência de Guerrero porque não se tratava de contrato de empréstimo.
Mas coube ao auditor Luiz Felipe Bulus a melhor reflexão. “Vamos punir em até R$ 100 mil? Mas só o caso envolvendo o Pato trata de uma multa (de descumprimento) de R$ 5 milhões! O mais baixo que eu vi era de R$ 500 mil”, ponderou. “Tenho dúvida se essa prática é nociva ou não, mas acontece em muitos ramos.” Ele ainda considerou que o regulamento não é claro ao proibir a prática, e absolveu todos os clubes.