Ex-presidente do Paraná, Ruben Bohlen critica o grupo Paranistas do Bem, que o pressionou para deixar o comando do Tricolor.| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

“Queriam me fazer de fantoche. Talvez existam pessoas que aceitem esse rótulo. Mas, comigo, isso jamais aconteceria”. Foi assim que o ex-presidente do Paraná Clube, Rubens Bohlen, quebrou o silêncio sobre sua conturbada renúncia do cargo, após pressão do grupo Paranistas do Bem, em março, antes do início da Série B.

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HQ: A renúncia em quadrinhos

Duzentos e seis dias após deixar a sala da presidência alegando ter sofrido ameaças, Bohlen recebeu a reportagem da Gazeta do Povo em um escritório de advocacia, no bairro Mercês. Com um diário dos tempos em que ainda era mandatário do Tricolor debaixo do braço, o ex-cartola esmiuçou episódios que levaram à sua saída, discorreu sobre a atual situação paranista e revelou: não frequenta mais a Vila e a sede social. “Olhar para algumas pessoas me causa náuseas, para não dizer nojo”.

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Citados durante a entrevista, o empresário Carlos Werner e o presidente Luiz Carlos Casagrande, o Casinha, foram procurados pela reportagem e preferiram não se pronunciar antes da publicação.

Confira a entrevista:

Como tem sido sua rotina após deixar a presidência?

Você fica como um peixe fora d’água. Eu tinha uma rotina diária no clube, trabalhando e resolvendo problemas. Hoje estou excluído desse processo. Sou aposentado e estou vivendo a vida. Longe de todos os burburinhos.

Tem frequentado a sede do clube ou ido aos jogos?

Não. Olhar para a cara de algumas pessoas me causa náuseas, para não dizer nojo. Não faz bem para a minha saúde. Olhar para pessoas que estavam ao seu lado e tramaram contra você é repugnante. Tenho vergonha. Essas pessoas deveriam sentir o mesmo.

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Quem seriam essas pessoas?

Os Paranistas do Bem e gente de dentro da minha diretoria.

Seriam os seus vices Aldo Coser e Luiz Carlos Casagrande, o Casinha, que ficaram na atual gestão?

Não tem como dissociar. É claro que estavam juntos com o grupo, faziam parte de tudo. Podem jurar de pés juntos que não. Mas, quem estava lá no dia a dia sabe o que acontecia nos corredores, ninguém é bobo.

Talvez se eu fosse uma pessoa voltada a conchavos e acordos obscuros eu tivesse sido bem visto por esse grupo. Minha honestidade pesou contra. O Carlos Werner me disse que o clube precisava de ‘vaquinhas brancas’ e de ‘vaquinhas pretas’ na diretoria. As últimas seriam para fazer o jogo sujo

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Antes da renúncia, você disse que estava sendo vítima de um golpe, pois tentavam comprar seu cargo em troca de R$ 4 milhões. Você mantém essa versão?

Foi um golpe sim, com a diferença de que acabei renunciando. Tiraram minha governabilidade. Em uma das reuniões do Conselho Consultivo, caíram as máscaras. Esperavam que eu abrisse mão do cargo. O presidente do Deliberativo [Rodrigo Vissotto] cochichou para o presidente do Consultivo [Benedito Barboza] a palavra impeachment. Que atrocidade cometi na presidência para falarem sobre impeachment?

 

Você guarda mágoas?

Da instituição, não. Mas, de algumas pessoas, sim, pela falsidade. Quem quer ajudar o clube não impõe condições. Tentei de tudo, inclusive uma parceira com os Paranistas do Bem. Tínhamos todas as condições de fazer isso; falei que deixaria que ficassem com o futebol e eu tocaria o social.

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Por que o grupo queria tanto a sua saída?

Falaram em falta de credibilidade. Talvez se eu fosse uma pessoa voltada a conchavos e acordos obscuros eu tivesse sido bem visto por esse grupo. Minha honestidade pesou contra. O Carlos Werner me disse que o clube precisava de “vaquinhas brancas” e de “vaquinhas pretas” na diretoria. As últimas seriam para fazer o jogo sujo.

O que seria esse jogo sujo? Quem seriam as vaquinhas pretas?

As coisas mais obscuras. Pressionar pessoas, por exemplo. Quem tem de responder sobre as vaquinhas pretas é o Carlos Werner. Ele que agora denomine quem são.

Algumas pessoas achavam imprescindível você sair do cargo...

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Questionei muito o Carlos Werner sobre isso. Eu sabia que quem assumiria com minha saída seria o primeiro-vice [Casinha]. Agora, por que esse grupo preferia que o Casinha assumisse? Disseram que é porque ninguém tem problemas com o Casinha, mas, que tipo de problemas? Eles se merecem. O Casinha seria o presidente, mas não teria o poder ativo dentro do clube.

Qual a sua opinião sobre o Casinha?

Muito se fala do Casinha. Mas falar sem provas é difícil. As pessoas conhecem o Casinha.

Olhar para a cara de algumas pessoas me causa náuseas, para não dizer nojo. Não faz bem para a minha saúde. Olhar para pessoas que estavam ao seu lado e tramaram contra você é repugnante. Tenho vergonha. Essas pessoas deveriam sentir o mesmo

Na época em que pediam sua saída você chegou a pedir 30 dias para apresentar um projeto, mas não teve esse tempo. Qual seria esse projeto?

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É o projeto que foi apresentado pela chapa de oposição na eleição de setembro. Estava tudo bem encaminhado e alinhado, mas as pessoas não acreditam. Que projeto esse grupo atual apresentou? Que projeto o porta-voz do Werner, Leonardo Oliveira [candidato vencedor da eleição], apresentou? Ele aparecia nas reuniões com uma folha de papel rasgado em mãos falando em triplicar as verbas de tevê. Que poder o Paraná teria para fazer isso sozinho?

De que forma os episódios da renúncia afetaram sua vida pessoal?

Saí de Curitiba e fiquei dez dias fora, com minha esposa, sem querer ouvir nada. Até hoje ouço o mínimo possível. Teve presidente que fez coisa muito pior e hoje é endeusado.

Além de companheiros de diretoria, você perdeu amigos nesta caminhada?

Fiquei decepcionado com algumas pessoas, não nego. Mas não vem ao caso citar nomes.

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Sete meses depois, como você avalia o trabalho do Paranistas do Bem?

O aporte financeiro de R$ 4 milhões foi prometido por dez pessoas, que pagariam R$ 400 mil cada. Eu duvido que cada um deu sua parte. No máximo três pessoas daquele grupo teriam condições de investir, mas acho que ficou nos ombros de uma só pessoa. Respeito o Werner, me ajudou muito na minha gestão, mas ele fazia parte da minha diretoria. Como não chamar isso de golpe?

Não vou desejar o mal para o meu clube. Espero que o padrinho dele [Leonardo de Oliveira, presidente eleito para a gestão 2016-2019], o Werner, o ajude financeiramente. Se isso não acontecer, temo pela instituição. Temo por como as coisas estão acontecendo. Abdicaram de projetos consistentes da minha gestão. Mas a ganância e poder, quando você assume, sobem para a cabeça

Foi precipitada a promessa do grupo de acesso baseado no aporte de R$ 4 milhões?

Claro que foi. Não conseguiriam o acesso de jeito nenhum. Eu citei esse valor certa vez aleatoriamente. E eles acreditaram que bastaria.

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Dizem no clube que, se você não tivesse saído, o Paraná já teria fechado as portas.

Isso não aconteceria. Achei um desrespeito tremendo não levarem em consideração o Ato Trabalhista [acordo com o Ministério do Trabalho] que vínhamos fazendo. Seria a solução para o clube. Nas reuniões, entretanto, o Paranistas do Bem chamou isso de ‘projetinho’. Me arrependo de ter confiado em algumas pessoas. Preciso colocar a cabeça no travesseiro e dormir tranquilo. Se para obter as coisas no clube você precisa ser desonesto e fazer negociações escusas, isso não fiz.

 

O Leonardo Oliveira tem condições de fazer uma boa gestão nos próximos três anos?

Não vou desejar o mal para o meu clube. Espero que o padrinho dele, o Werner, o ajude financeiramente. Se isso não acontecer, temo pela instituição. Temo por como as coisas estão acontecendo. Abdicaram de projetos consistentes da minha gestão. Mas a ganância e poder, quando você assume, sobem para a cabeça.

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Em 2013, o Paraná esteve muito perto do acesso, mas desperdiçou. Em algum momento os jogadores ‘amoleceram’ por falta de salários?

Não acredito nisso. Tivemos jogadores íntegros. Falávamos das dificuldades financeiras olho no olho. Não privilegiávamos ninguém. Não posso falar de outras gestões, mas na nossa gestão acredito que o time nunca tenha entregado um jogo por causa de salários atrasados. Os jogadores me apoiaram até o fim.

Essas pessoas que estão no clube queriam me fazer de fantoche. Talvez tenha pessoas que aceitem esse rótulo. Comigo isso jamais aconteceria. Procurei fazer o máximo pelo clube e, se não fiz mais, foi pelas dificuldades cotidianas e pelo boicote que vinha sofrendo. Não tinha condições de pôr dinheiro do clube, mas também nunca retirei um centavo

Os Paranistas do Bem cogitam a venda da Kennedy e até mesmo o fim do social. O que acha disso?

Acho que o caminho será esse. Falam, e não posso comprovar nada, pois não estou mais no clube, que a falta de pagamento de gás das piscinas tinha a conotação política de esvaziar o quadro social. Haja vista que a arrecadação do social vem caindo a cada mês.

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Qual a sua opinião sobre venda de patrimônio? Na sua primeira gestão o clube vendeu a sede social do Tarumã.

Foi uma decisão judicial, um leilão. Esperávamos que sobrasse cerca de R$ 10 milhões para o clube investir no futebol, mas não aconteceu. Divulgamos no site do clube para onde foi todo o dinheiro da venda.

Sua gestão foi muito próxima do empresário Marcos Amaral. A situação financeira precária torna o Paraná um campo livre para os empresários lucrarem?

Comprei algumas brigas com empresários no período em que estive lá. Em 2014, não posso negar, o Amaral nos ajudou muito em um período de dificuldade. Recebemos muitas críticas pelo excesso de volume de jogadores. Mas não é diferente do que está acontecendo agora, com essa diretoria.

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Gostaria de acrescentar algo mais?

Vejo que essas pessoas que estão no clube queriam me fazer de fantoche. Talvez existam pessoas que aceitem esse rótulo. Mas comigo isso jamais aconteceria. Procurei fazer o máximo pelo clube e, se não fiz mais, foi pelas dificuldades cotidianas e pelo boicote que vinha sofrendo. Não tinha condições de pôr dinheiro do clube. Mas também nunca retirei um centavo.