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O estádio Krestovsky, a Nave Espacial. | /Divulgação
O estádio Krestovsky, a Nave Espacial.| Foto: /Divulgação

Os locais o batizaram de “A Nave Espacial” – um disco voador gigantesco e futurista pousado às margens do Mar Báltico. O estádio Krestovsky, que deverá sediar várias das partidas internacionais de futebol da Copa das Confederações da Fifa neste ano, em junho, e da Copa do Mundo do ano que vem, é um dos projetos de construção russos que estão há mais tempo em andamento.

E, como muitas vezes ocorre no país, é um poço sem fundo de escândalos financeiros.

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O governo de Vladimir Putin tem como costume conduzir projetos de desenvolvimento básico de infraestrutura como parte dos esforços de promoção do país no palco mundial. E esse estádio, que conta com 68.134 lugares, também conhecido como “Arena do Zenit”, é emblemático do tipo de projetos de prestígio ligados aos eventos esportivos internacionais, como a Universíada de Verão realizada em Kazan em 2013 ou as Olimpíadas de Sochi de 2014.

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Essa estratégia atraiu comentários ambíguos em Sochi, onde parece que houve melhorias na qualidade de vida, mas às custas de mais de US$50 bilhões e alegações incessantes de corrupção. Os observadores dão o aviso de que a “Nave Espacial” pode estar seguindo um caminho parecido.

“Ninguém nega que a cidade precisava construir um estádio novo. Mas, de algum modo, eles conseguiram encontrar a forma mais dispendiosa, mais cara e menos transparente de fazer isso”, diz Lyubov Sobol, advogada da Fundação pela Luta contra a Corrupção, um grupo associado ao líder da oposição Alexei Navalny, que está numa cruzada contra a corrupção. “Agora as autoridades dizem que o estádio está pronto e tudo está certo. Mas eles acrescentam que se houver mais investimentos – quantos bilhões a mais? –, então ele vai estar absolutamente pronto. Ele não só está não pronto, como tem muitos defeitos”.

O projeto começou em 2004, como parte de um plano modesto de reformar o estádio Kirov, da era soviética, lar do Zenit, o time de futebol de São Petersburgo, com uma estrutura maior e mais moderna, capaz de sediar partidas internacionais. O custo estimado à época era de 6,5 bilhões de rublos (US$120 milhões).

Esse projeto, desde então, já passou por várias mudanças, incluindo de empreiteiras, com vastas somas de dinheiro surgindo sem registro e o custo disparando e somando pelo menos sete vezes o custo original, tendo subido para 44 bilhões de rublos (cerca de US$730 milhões). A obra foi declarada concluída no mês passado, mas os especialistas afirmam que está longe de ser entregue ainda e que o preço final deverá chegar a mais de 1 bilhão de dólares para a cidade de São Petersburgo.

Doze estádios modernos em onze cidades estão perto de ser entregues, sete dos quais são novos, para acomodar a Copa do Mundo de 2018, que será sediada pela Rússia. Moscou está oficialmente gastando cerca de US$11 bilhões para apoiar a construção do estádio, das linhas de trem de alta velocidade, hotéis e outras instalações para os jogos da Fifa. Como indicação de que nem tudo está andando bem, o governo russo incluiu no seu orçamento um aumento súbito de US$ 325 milhões no mês passado, sem oferecer qualquer explicação.

O estádio Krestovsky já está incluído como parte do projeto da Copa do Mundo, e muito dinheiro foi gasto para adequá-lo ao padrão Fifa. Porém, diferente do que aconteceu com todos os outros, o estádio de São Petersburgo não recebe qualquer subsídio de Moscou e está sendo construído inteiramente às custas do orçamento local, porque foi, desde o começo, concebido como um projeto municipal.

“Essa é uma das coisas que mais deixa o pessoal aqui perplexo. Todas as outras cidades estão construindo ou reformando os seus estádios com dinheiro federal. Mas nós estamos pagando o preço integral”, diz Dmitry Sukharev, chefe da divisão de São Petersburgo do Transparency Internacional, uma organização global não governamental de luta contra a corrupção. “Quando o preço de um estádio sobe, a cidade precisa tirar o orçamento das escolas e hospitais, porque concluir a construção é uma prioridade política”.

Não houve ainda protestos públicos por causa disso, diferente do que aconteceu quando o governo local tomou a decisão polêmica de transferir a icônica catedral de Santo Isaac de um museu para uma igreja em funcionamento, “porque o estádio é um tipo de escândalo mais lento”, diz ele. “Todo mundo quer um estádio novo. E isso vai se arrastando, ficando cada vez mais caro, e é difícil saber de quem é a culpa por ficar nesse vai-não-vai. Isso não é um assunto do momento, mas todo mundo está ciente que ele existe”.

O estádio precisa ser entregue, completamente concluído, até junho, para a Copa das Confederações da Fifa, que serve de ensaio para a Copa do Mundo, quando oito jogos deverão ocorrer lá. No mês passado, ele foi declarado oficialmente pronto pela segunda vez e sediou dois eventos demonstrativos, depois de relatos nos noticiários de que o próprio Putin havia pessoalmente feito uma intervenção para dar um “pontapé no lombo” das autoridades locais, pelos atrasos.

O fato de que os custos do estádio Krestovsky são cerca de três vezes maiores do que os de quaisquer outros estádios sendo construídos para os jogos da Fifa deixa claro que tem algo errado aí. Ele foi concebido para ser uma maravilha tecnológica, com um gramado móvel e um teto retrátil capaz de derreter neve. Mas ninguém consegue explicar o porquê dos custos tão altos, nem para o onde todo o dinheiro está indo.

O vice-governador Igor Albin, responsável pela construção, culpa as várias mudanças que ocorreram no projeto e aponta a decisão de Moscou de designar o estádio como palco dos jogos da FIFA como uma das maiores fontes dos problemas de encarecimento da obra. Numa carta ao Christian Science Monitor, Albin culpou a falta de iniciativa dos subempreiteiros e “os processos de inflação durante a construção e novas exigências de segurança” para o estádio, que foram incluídas nos decretos posteriores do governo.

O antecessor de Albin no cargo, Marat Oganesyan, foi preso em novembro do ano passado e acusado de organizar um esquema de corrupção de 50 milhões de rublos (cerca de US$ 1 milhão) com as empreiteiras envolvidas na construção de estádio. A mídia russa cita que Albin teria admitido que até 700 milhões de rublos (US$ 14 milhões) teriam desaparecido do orçamento do estádio.

Boris Vishnevsky, deputado liberal da Assembleia Legislativa de São Petersburgo, diz que a quantidade de dinheiro desviada é maior ainda. “Isso vem de cima, do alto escalão do país, e não há responsabilidade por nada”, diz ele.

Outro ponto de interrogação que paira sobre o problema diz respeito à demissão súbita da principal empreiteira do estádio no ano passado, a Transstroy, firma que pertence ao oligarca russo Oleg Deripaska, e sua substituição pela firma de construção local Metrostroy, uma empresa pública privatizada recentemente.

O governo de São Peterburgo está processando a Transstroy pelo não cumprimento das suas obrigações contratuais. A Transstroy, por sua vez, entrou com uma reconvenção alegando não ter sido paga pelo governo.

Numa resposta por e-mail ao Monitor, um porta-voz da Transstroy pôs a culpa pelos transtornos nas alterações do projeto, na má administração e nas oscilações na taxa de câmbio do rublo. “Essa situação foi agravada pela situação financeira difícil, a insolvência das grandes empreiteiras e, em alguns casos, pela sua desonestidade”, diz ele.

Os ativistas anticorrupção afirmam que os processos podem abrir uma janela na longa saga do estádio Krestovsky, que até agora tem sido opaca para a observação externa.

“Nós não conseguimos trabalhar com os documentos, a informação é escassa e diferentes fontes dão explicações diferentes”, diz Sobol, a advogada anticorrupção. “O que é preciso aqui é uma auditoria complexa de tudo, mas eu duvido que chegaremos a ver isso acontecer”.

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