Para descer os dois degraus que ligam o quarto à sala da casa alugada no bairro Uberaba, à beira do poluído Rio Belém, ele precisa da ajuda da mulher, Roseli. As pernas não obedecem, o quadril dói, a visão não colabora. Aos 62 anos, os passos lentos e claudicantes de Mário da Rocha em nada lembram o meia Marinho, que nas décadas de 70 e 80 teve passagens marcantes por Colorado e Pinheiros, times embrionários do Paraná.
Um desfecho amargo para o jogador que já carregou a alcunha de "Interminável" por só ter pendurados as chuteiras do futebol profissional aos 39 anos, em 1991, mas que ainda esticou a carreira até 1999, em temporadas da Suburbana, pelo Santa Quitéria, Vila Hauer, Vila Fanny.
Desde o início dos anos 2000, Marinho convive com a quase-cegueira já passou por dois transplantes de córnea e hoje tem apenas 50% da visão e agora, as dificuldades para caminhar o confinaram dentro de casa e já nem para os jogos dos campeonatos amador máster vai mais acompanhar, como antes fazia. "Era bom. Encontrava os do meu tempo, os que me conheceram, tinha com quem conversar", diz, entristecido, vítima de diabetes.
Jogador dos tempos da Lei do Passe, foi ídolo do Pinheiros, onde, entre 1984 e 1987, chegou a quatro finais do Paranaense, com dois títulos, Marinho vive hoje das memórias do campo, da renda do Auxílio-Doença (cerca de R$ 700) e da ajuda dos poucos amigos dos tempos de bola que ainda o visitam.
"É difícil ficar sem andar e pensar que minha vida toda foi correndo pelos campos. Sei que os torcedores que lembram de mim, lembram com alegria. Tenho alguns amigos do futebol, como o Chiquita, o Dionisio Filho, o Tutti, o Poletto, que me ajudam [financeiramente]. É triste falar, mas sou de um tempo no futebol que a gente se preocupava em jogar, não ligava muito como eram os contratos, era emprestado para um clube aqui, outro ali. Muitos clubes que ganharam comigo não reconhecem isso", cobra.
O ex-jogador fala que os médicos ainda não sabem a causa das dores no quadril e pernas e ainda espera a liberação de exames na rede pública de saúde; a mulher diz que já se suspeita de algo bem mais sério.
Dos mais de 20 anos dedicados ao futebol começou no juvenil do Britânia, em 1967 , porém, as lembranças mais recorrentes não são as dos títulos estaduais ou os prêmios individuais o meia de 1,68 m de altura, que se destacava pelo posicionamento em campo e a liderança do time foi seis vezes escolhido o craque do Paranaense nem tampouco as excursões internacionais que fez com o Colorado para a Turquia e para a Romênia.
A história que Marinho mais detalhadamente conta é a que não se concretizou: a de ter jogado no Santos de Pelé. Próximo a 1970, quando servia o exército e ainda jogava pelo Britânia, foi convocado para defender a seleção paranaense juvenil para o Campeonato Brasileiro de Seleções.
"No time, estava também o Levir Culpi, o Dirceu [ex-Coritiba, que defendeu a seleção brasileira], um timaço. Perdemos para a seleção de São Paulo por 1 a 0 na semifinal. Nesse jogo, o Zito [ex-seleção brasileira e então dirigente do Peixe] me viu jogar e veio falar comigo para eu ir para Santos. Eu tinha de cumprir ainda mais seis meses de caserna, mas ele falou que eu podia fazer isso lá. Compraram passagem para eu ir, mas minha mãe não quis. Aí, desanimei, e fui trabalhar no Bamerindus [hoje HSBC]. Deixei o futebol, por um tempo, só voltei pro profissional em 1974, no Colorado."
Outra memória marcante foi um momento de glória, mas não de Marinho, mas do atleticano Ziquita, na terceira fase do Estadual de 1978. O meia ainda defendia o Colorado, que vencia por 4 a 0, jogando no Joaquim Américo, até os 30 minutos do segundo tempo, quanto o centroavante rubro-negro começou a improvável virada. Em 13 minutos, Ziquita empatou o jogo em 4 a 4. "Esse é o jogo que não esqueço. Eu sinceramente não sei até hoje o que deu no time... Entendo o que foi o apagão da seleção contra a Alemanha..."
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