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Nilson Borges, ex-meia-atacante do Atlético, sofre com as dores no joelho direito desde que abandonou o futebol, em 1972 | Hugo Harada/Gazeta do Povo
Nilson Borges, ex-meia-atacante do Atlético, sofre com as dores no joelho direito desde que abandonou o futebol, em 1972| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

Nilson Borges abandonou os gramados há 42 anos. O mesmo período em que o ex-jogador do Atlético, hoje aos 72, sofre com as dores da velha profissão. Tortura que aflige a maioria dos boleiros que atuaram até o início dos anos 90, antes dos avanços da medicina esportiva e estruturação dos departamentos dos clubes.

Uma pesquisa do departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) traduziu em números o suplício. Realizado em 2013, o estudo analisou 100 ex-atletas entre 30 e 70 anos de idade, com média de 17 anos de carreira profissional.

O joelho surgiu como o grande vilão. Do grupo de ex-boleiros, 54% realizaram infiltrações de medicamento na principal articulação do corpo enquanto jogavam, 34% tiveram lesões, 67% fizeram cirurgias e 97%, ainda se queixam de dores.

É justamente este o aborrecimento diário do Bocão, como Nilson Borges ficou conhecido. "Sofri uma entrada maldosa quando jogava pelo Bahia, em 1972, de um jogador chamado Denílson. Destruiu o meu joelho esquerdo", relembra o ex-craque do Rubro-Negro.

Do gramado da Fonte Nova o camisa 11 foi para a faca. "Os médicos operaram só o músculo, a recuperação foi terrível, demorou muito mais do que devia, não deu nada certo. Voltei a jogar com dores até que um dia desisti", comenta o funcionário do Furacão há mais de 20 anos.

Desde então, Nilson tem dificuldades para andar. "Fiz três cirurgias depois e o meu joelho ficou osso com osso. Os médicos já disseram que minha única alternativa é colocar uma prótese, mas eu prefiro esperar", relata.

Se jogasse hoje em dia, a situação do atleticano seria outra. "O estudo da fisiologia, os médicos, os equipamentos, diagnóstico, tudo melhorou de uma forma geral", diz o ortopedista Mohty Domit, há quase 40 anos no ramo do futebol, ex-médico do Paraná.

Membro do departamento médico da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), o também ortopedista Edilson Thiele reforça e compara: "Não tinha fisioterapia, exame de imagem, preparação física individualizada, avaliações de pré-participação. Quando cheguei ao Atlético, em 1990, era só o médico e o massagista".

O cenário dos clubes mudou radicalmente. Nas equipes de Série A do Brasileiro, por exemplo, os departamentos médicos dispõem de profissionais para todas as áreas. Ortopedistas, fisioterapeutas, nutricionistas etc, além de recursos modernos.

Assim como Nilson Borges, o ex-zagueiro e lateral Cláudio Marques viveu e sofreu com a precariedade dos anos 70. "Aplicavam uma pomada chamada Antiflogestine que servia para tudo. No mais, era só contraste, tratamento com bolsa quente e gelo", relembra o ex-jogador do Coritiba e do Corinthians.

Em 1979, Cláudio defendia o Coritiba contra o Matsubara quando machucou o joelho esquerdo. Foi parar na mesa cirurgia e teve todo o menisco (cartilagem no meio do joelho) retirado, procedimento padrão na época. No futebol de hoje só se remove a parte lesionada.

"Até hoje eu manco, dói para caminhar. Aliás, pode reparar que a maioria dos ex-jogadores manca. Tenho artrose, ligamento estourado, meu joelho está tão ruim que a perna ficou mais torta que a direita. Vivo a base de remédios", declara Cláudio Marques, 64 anos, hoje representante comercial.

Companheiro de Cláudio nos tempos áureos do Alviverde, o ex-volante Hidalgo também reclama de ter sido jogador nos velhos tempos, quando os cuidados médicos com os atletas eram rudimentares. "Nós ficávamos entregues a tudo", recorda o popular Capitão Hidalgo.

A principal precaução dos clubes contra lesões entre os anos 50 e 80 eram injeções de vitamina B12 após os treinamentos. "Tomávamos tudo que se possa imaginar. De uma forma perigosa, inclusive", recorda o ex-coxa.

O problema é que nem sempre as agulhas eram esterilizadas. Por causa disso, é comum jogadores que contraíram o vírus da hepatite C. Transmitida pelo sangue, a doença causa a inflamação do fígado e, se não for tratada, pode ocasionar cirrose e câncer hepático.

Hidalgo não teve esse azar. Mas o desgaste dos tempos de bola e a ausência de cuidados adequados cobrou seu preço. "Tenho dificuldade para andar até hoje. Por causa de um desgaste numa cartilagem do quadril. Há 20 anos preciso fazer uma cirurgia, mas tenho muito receio de anestesia", diz o atual comentarista de rádio de 71 anos.

Suporte

Em abril de 2015, no Rio de Janeiro, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) promoverá um encontro dos médicos dos clubes das três divisões principais do Campeonato Brasileiro para auxiliar na prevenção e tratamento das lesões. As equipes receberão informações sobre preparação dos atletas e estatísticas dos principais problemas que acometem os jogadores de futebol ao longo da temporada.

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