Na terça-feira, ao receber o prêmio de melhor atleta do ano, João Derly confessou que estava mais nervoso do que no Mundial, quando conquistou o ouro na categoria meio-leve, medalha inédita para o judô brasileiro. Na quarta, já refeito da emoção, o gaúcho de 24 anos desfrutava de mais esta conquista. Hospedado em um hotel em Copacabana, ele adiou sua volta a Porto Alegre para atender a todos que o procuraram.
"Eu ainda nem parei para pensar direito no que isso significa. No esporte, a vitória é uma sensação a que nos acostumamos. Mas lá, no prêmio Brasil Olímpico, foi diferente", contou ele, admirado com a vista da praia na cobertura do hotel.
Para Derly, sua vitória e a de Natália Falavigna, campeã mundial de taekwondo, representam um grande avanço para os esportes que, pela primeira vez, receberam o prêmio máximo do Comitê Olímpico Brasileiro (COB). O "chato", confessou, foi ter que tirar fotos ao lado dela.
"Ficou engraçado, ela é bem mais alta (1,78m). Perguntaram se eu lutaria com ela. Mas não dá para enfrentar a Natália, é só olhar para o seu tamanho. E apanhar de mulher é muito feio", brincou ele, do alto de seus 1,64m. "Eu só a conhecia pela televisão e, no dia do prêmio, fomos conversando na van do hotel até o Teatro Municipal. Depois, ela disse que nossa conversa deu sorte. Geralmente, os homens se tornam campeões mundiais antes das mulheres. Com ela foi o contrário."
Derly voltou para casa ontem à noite, mas as tão esperadas férias de Natal e Ano Novo terão que esperar. O excelente desempenho no Mundial lhe rendeu um convite para participar da Copa Jigoro Kano, no dia 15 de janeiro. A prova é a mais tradicional do Japão e reúne os melhores do mundo. Depois, o judoca disputa a Super Copa do Mundo, em Paris, e a etapa da Copa do Mundo em Leonding, na Áustria. Dependendo de seus resultados, Derly garantirá vaga na seleção brasileira para o Pan-Americano Sênior em Bariloche, em maio; e o Mundial por equipes em Paris, em setembro. Com a agenda cheia, ele afirma estar mais tranqüilo para treinar:
"Com o título mundial, consegui dois patrocinadores (um banco e uma empresa de telefonia celular). Eles estão me dando estrutura para poder me dedicar só ao esporte. Antes, eu tinha um apoio nas viagens, mas precisava dar aulas de judô para me sustentar."
As conquistas de 2005 coroam a persistência e dedicação de João Derly. Em 2003, ele mudou de categoria (do peso-ligeiro, até 60kg, para o meio-leve, até 66kg) e acabou ficando fora das Olimpíadas de Atenas, no ano passado. Na seletiva para os Jogos, ele teve que lutar com Leandro Cunha e perdeu a vaga na equipe. Mesmo assim, diz, essa foi a melhor decisão que podia tomar porque, devido a sua constituição física, sempre foi um sacrifício manter os 60kg da categoria ligeiro.
"Foi uma reviravolta na carreira. Minha característica é de explosão e, como sempre tinha que perder peso, ficava debilitado. No nosso esporte, qualquer 500g fazem diferença, imagina seis quilos."
Agora, o judoca quer aproveitar a visibilidade para concretizar o sonho de levar o judô às comunidades carentes de Porto Alegre. Projeto pronto, só falta um nome, e parceiros, para torná-lo realidade.
"O projeto é inspirado no trabalho de Flávio Canto. Tenho esta vontade há muito tempo e o momento é esse. Eu ganhei o Mundial num sábado e, na segunda, já tinha dez crianças inscritas no Sogipa, o clube que treino. Isso prova a influência que a gente tem", concluiu ele que, nesta quarta, visitou o Instituto Reação, de Canto, na Rocinha.