Nem mil e um pesadelos, na terra das mil e uma noites, poderiam prever uma tragédia assim. Acabou. Triste assim, frio assim, duro assim: acabou. Acabou cedo, na precocidade do primeiro jogo, no fiasco da estreia. Acabou quando deveria ter começado. O time gaúcho sangra o vermelho de sua camisa diante de uma eliminação histórica, diante da certeza que nenhuma lenda árabe poderá recriar. O Inter não será bicampeão do mundo em 2010. O Mazembe, com vitória de 2 a 0 nesta quarta-feira (14), no estádio Mohammed bin Zayed, em Abu Dhabi, garantiu classificação para a final do Mundial de Clubes da Fifa.
A tragédia está mais nas arquibancadas do que no campo. Milhares de colorados cruzaram o mundo para ver o Inter campeão nos Emirados Árabes. Acabaram agredidos por um dos maiores desastres dos mais de 100 anos de vida do clube gaúcho. No dia em que a torcida fez história, o time pagou mico. Nem mil e um pesadelos poderiam prever.
Os dois gols do Mazembe saíram no segundo tempo, com Kabangu e Kaluyituka. Talvez não tenha sido exatamente justo, mas o Inter pouco fez para merecer sorte melhor o Inter do campo, claro, porque o Inter das arquibancadas fez seu papel. Com a vitória, o surpreendente time da República Democrática do Congo duelará com o Inter de Milão ou o Seongwan, da Coreia do Sul, na decisão.
Melhor, mas não o bastante
Faltou DAlessandro atordoar os adversários com dribles e lançamentos. Faltou Kleber ter aquela precisão de sempre. Faltou Bolívar encontrar o posicionamento que ameniza a lentidão. Faltou muita coisa para o Inter no primeiro tempo do empate por 0 a 0 com o Mazembe. Um tanto pelo nervosismo decorrente da estreia, outro tanto pela dificuldade imposta por um adversário longe de ser bobo, o time colorado não conseguiu ter encaixe nos 45 minutos iniciais. Os primeiros passos vermelhos no Mundial de Clubes foram titubeantes.
O Inter começou melhor. Deu pinta de que iria fazer um gol logo, logo. Rafael Sobis, com um minuto de jogo, já mandou chute por cima. Wilson Matias cabeceou com perigo pouco depois. DAlessandro arriscou para fora. Rafael Sobis insistiu em cobrança de falta, também para fora. E ele mesmo teve a melhor chance, em tabelamento com Alecsandro, mas Kidiaba defendeu.
Os primeiros dez minutos foram promissores. O problema é que o rendimento vermelho, a partir daí, foi caindo gradativamente. Cabeceio de Índio na segunda trave quase virou gol. Testada de Tinga também foi ameaçada. Mas o Mazembe, conforme o tempo passava, mais confiança ganhava. Jamais houve pressão, até porque os africanos fogem daquela imagem de um time meramente veloz e forte. Houve organização.
Os adversários colorados ameaçaram duas vezes. Em ambas, entraram em velocidade pela ponta esquerda, sem acompanhamento de Bolívar. Renan precisou intervir.
Roth armou o Inter no esquema 4-5-1, com Rafael Sobis no meio. É um esquema que dá solidez defensiva, mas empobrece o ataque. Os colorados, é bem verdade, mais atacaram do que foram atacados no primeiro tempo. Mas é pouco.
Segundo tempo
O mundo parou aos sete minutos do segundo tempo para cada colorado para os 11 em campo, para os milhares nas arquibancadas, para os milhões espalhados pelo mundo. Cada camisa vermelha, estivesse onde estivesse, ficou congelada quando Kabangu recebeu aquela bola, olhou para o gol de Renan, viu um espaço aberto à direita, mandou a bola lá, encontrou a lateral da rede, soltou o grito de gol. Não podia ser verdade. Enquanto o goleiro Kidiaba pulava no chão em sua comemoração, batia um sentimento coletivo de que simplesmente não podia ser verdade.
Roth percebeu que tinha que agir. Tirou Tinga e Alecsandro, colocou Giuliano e Leandro Damião. Surgiram chances. Sobis mandou uma pancada, e Kidiaba pegou; Giuliano entrou na área, cara a cara com o goleiro, e Kidiaba salvou mais uma. Incrível.
Os ponteiros do relógio martelavam desespero na alma colorada. Onde estava DAlessandro? Onde Kleber tinha ido parar? Onde tinha se escondido a explosão de um time que trabalhou quatro meses seguidos só pensando no Mundial? Perguntas, perguntas e mais perguntas. Faltavam as respostas. Faltava o gol para uma torcida que, em estado de choque, até tentava continuar cantando.
Mas viria o silêncio. Viria o golpe final. Viria o gol de Kaluyituka aos 40 minutos. Nem mil e um pesadelos poderiam prever que o Inter seria eliminado do Mundial de Clubes já na estreia.
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