Atletas fazem preparo emocional
"A falta ou o excesso de confiança e adrenalina são ruins antes de um combate. O treino mental deve equilibrar isso." Com estas palavras o psicólogo Fabiano Mello resume o trabalho que, segundo ele, é capaz de dar o suporte emocional para que os lutadores de vale-tudo não se sintam intimidados diante do adversário, câmeras, luzes e público. De acordo com ele, o começo desse trabalho é bem parecido ao que se aplica na psicologia clínica. "Faço entrevistas detalhadas, sobre família, profissão, objetivos, entre outros, e avaliações com um ou outro teste para depois, conhecendo melhor o atleta, definir a melhor estratégia de intervenção", explica.
Com base nisso, Mello usa uma técnica para programar a mente para um acontecimento específico, no caso, a luta. "Isso inclui sessões de relaxamento e respiração, no qual peço para o lutador se imaginar no grande dia, caminhando até o ringue, ouvindo o apresentador, visualizando o público e o adversário, tudo isso com a sua música ao fundo", ressalta. Segundo o profissional, um dos objetivos desse método é fazer com que nada surpreenda ou desequilibre o atleta naquele dia. "Mostro vídeos e fotos do evento, por meio do qual ele pode ir aos poucos se familiarizando com a atmosfera do local, com as cores e tudo o mais", destaca. (FM)
Música preferida ecoando no ginásio lotado, caminhada lenta a passos firmes rumo ao ringue e o olhar sereno contrastando com a vontade de impor um contundente nocaute.
Foi assim equilibrando a inevitável adrenalina instigada antes de uma luta de vale-tudo com a calma típica de uma pescaria que André Dida fez o combate mais importante da sua carreira, no último dia 12 de março, contra o japonês Hiroyuki Takaya, em Nagoya, no Japão.
"Cheguei lá muito motivado, com aquela ansiedade positiva, sem nervosismo. Não adianta estar ótimo fisicamente e mal da cabeça", lembra Dida, que, na ocasião, fez sua primeira luta de vale-tudo em solo estrangeiro e estreou no K-1 Heros, evento de crescente prestígio que tenta disputar com o Pride a atenção dos fãs japoneses.
Por trás da tranqüilidade que ajudou Dida a conquistar uma vitória por nocaute técnico em pouco mais três minutos de combate está a contribuição de Fabiano Mello, psicólogo curitibano que está desenvolvendo um trabalho de vanguarda: a preparação psicológica de lutadores de MMA (Mixed Martial Arts, arte marcial mais conhecida no Brasil como vale-tudo).
O expediente foi testado e aprovado pelo lutador de 23 anos que é uma das promessas da Academia Chute Boxe. "Nesse esporte há muita adrenalina. Antes ficava muito ansioso e, além de usar o excesso de vontade de forma errada, ainda ficava pensando no que ia acontecer se eu perdesse. Felizmente superei isso", comemora.
Dida já vinha recebendo a ajuda do psicólogo desde setembro do ano passado, quando começou a se preparar para o Storm Samurai 12, que aconteceu em novembro, no Círculo Militar, em Curitiba. No evento, além de vencer seu combate sem muitas dificuldades, Dida foi escolhido o melhor lutador, o que lhe rendeu uma autêntica espada de samurai como prêmio.
Dida foi o primeiro atleta a se interessar pelo trabalho do psicólogo. Fanático por vale-tudo desde a adolescência, há um ano Mello decidiu juntar a paixão juvenil com a atuação profissional, restrita até então à área clínica e corporativa. Uma conversa com uma colega que atuava em um clube de futebol foi o que bastou para que ele se aventurasse na psicologia esportiva, mas em um ramo ainda inexplorado (pelo menos no Brasil).
Na companhia do sócio Fernando Botto (que hoje atua fora do país), ele passou a observar os treinos da Chute Boxe, pôs no papel um projeto se propondo a preparar psicologicamente os lutadores da academia e o apresentou ao mestre Rudimar Fedrigo, líder da escola. "Ele gostou e pediu que falássemos com os lutadores", recorda.
Atualmente, além de Dida, outros dois atletas da Chute Boxe (Jean Silva e Luiz Azeredo) também recebem individualmente a atenção do psicólogo. Eles confirmam a tendência do aumento do profissionalismo nessa modalidade de luta em função, principalmente, da proliferação de eventos de MMA no planeta e das altas somas em dinheiro que alguns deles chegam a movimentar (que, entre patrocínios, organização, cotas de TV e bolsas de lutadores alcançam as cifras dos milhões de dólares). Mais do que mero entretenimento, o MMA é cada vez mais visto como um grande negócio.
Assim, segundo Mello, além da preparação técnica e física, parece natural que cada vez mais lutadores dediquem atenção também ao lado emocional. Para o psicólogo, tal empenho é fundamental para que todo o tempo dedicado aos duros treinamentos seja bem aproveitado no momento de pisar em um ringue.
"Vários treinam, mas os pouquíssimos que chegam no topo são justamente os que conseguem chegar sempre bem preparados física e psicologicamente. Não há nada mais frustrante para um lutador do que perder por nervosismo, pelo branco que pode dar diante de um ginásio lotado ou pelo excesso de adrenalina que faz com que eles se cansem rapidamente em um combate. É comum vermos ótimos atletas sem reação em uma luta e muitos não conseguem imaginar que a razão disso está na cabeça", alerta.