Carlos Alberto Torres, o capitão do tri mundial, em 1970, esteve ontem em Curitiba para integrar o projeto Gols Pela Vida, do Hospital Pequeno Príncipe, apadrinhado por Pelé. Ex-jogador de Fluminense e Santos, o Capita recebeu o carinho dos pacientes e disse que irá convidar outros campeões para ajudar a instituição. À noite, ainda participou de um jantar beneficente no Graciosa Country Club. Antes disso, foi entrevistado pela Gazeta do Povo. Sobre o Brasileiro, afirmou ironicamente que parece não haver nenhum time com vontade de ser campeão.
Como você avalia o Brasileirão, que termina no domingo?
Parece que ninguém quer ganhar. O Fluminense estava na frente, deixou para o Cruzeiro, que deixou para o Corinthians, que devolveu para o Fluminense. É aquele pensamento de classificar para a Libertadores. Tem de pensar em ser campeão, parece que ninguém quer mais isso. Não entendo como um clube como o Fluminense, que tem um patrocinador que deu os jogadores para ser campeão, tem um aproveitamento baixo. Tinha de estar com mais de 80 pontos.
O Flu é seu time de coração?
Gosto muito do Fluminense, me identifico. Foi onde comecei. Joguei no juvenil, nos dois primeiros anos como profissional e depois fui pro Santos, onde fiquei por 11 anos. Se tivesse um clube para eu me identificar, seria o Santos. Acho que no esquema profissional não se pode ter essa coisa de o cara chegar e beijar o escudo. Acho isso a maior falsidade.
Qual o diferencial para os argentinos Conca e Montillo serem os maiores destaques?
Acho que é a dedicação. A gente que é do meio sabe que os argentinos têm muito mais dedicação que os brasileiros. Não é a raça, é dedicação mesmo. Você vê o Conca, que jogou todos os jogos, até machucado. Tem brasileiro que sente uma dorzinha e não joga. É uma questão de mentalidade, e até de cultura.
Você já viu a famosa "mala branca" que hoje ronda o Brasileirão?
Na nossa época o profissionalismo era nada. A gente ganhava o suficiente para botar comida em casa, fazer supermercado, comprar um carrinho que não era nem do ano. Não tinha essa coisa de mala. Ia sair de onde o dinheiro?
O que você acha de torcedores pedindo para o próprio time entregar e prejudicar um rival?
Não é legal, sou contra isso. A torcida tem de ter sempre o espírito de apoiar. Você vê o goleiro defendendo tudo e a torcida xingando. Não é o verdadeiro torcedor.
O que você acha do Neymar e das polêmicas em que se envolveu?
É um bom garoto, com grande futuro. Vai ser o maior do Brasil. Em dois anos no máximo. Conheci ele, o pai dele, e gostei muito. Os problemas que passou são da idade. Acho difícil o Santos mantê-lo por mais dois anos. [O clube] Fez certo no sentido de valorizar o jogador, para depois valer bem mais.
Qual sua maior alegria com o futebol hoje?
Talvez muita gente não entenda. O que me dá alegria são os jogos na Europa. Dinâmicos. Agora mesmo teve um Barcelona e Real Madrid...
Um jogaço...
É essa a palavra. Há quanto tempo você não ouve falar de um jogo assim no Brasil. Toda hora que vou para fora do país procuro me interar das coisas, o porquê da incrível organização do futebol inglês.
É possível fazer isso no Brasil?
Até daria, mas é difícil. Principalmente pela legislação. Lá fora os clubes são empresas. A Lei Pelé diz que os clubes tinham um prazo para se tornar empresa, mas não vingou. Aqui são sociedades desportivas cujos presidentes são eleitos pelos associados. Na Europa a maioria tem um dono, que contrata alguém para presidir. Se o cara não trabalha bem é: me desculpa amigo e tchau. Aqui não tem isso.
Dentro de campo, o que lhe atrai no futebol europeu?
A televisão, os clubes e a Federação chegaram a um acordo lá. Esse é o grande segredo. Pura e simplesmente para tornar o futebol algo dinâmico. Se você assiste a um jogo e ele está morno, você muda de canal. Eu paro de ver a partida e vejo um filme. O que eles fizeram? Diminuíram o tamanho dos campos. Não há condição de ter um jogo dinâmico no Maracanã.
Aprova a escolha do Ney Franco para treinador da seleção sub-20?
O Ney é um grande treinador. É um cara sereno e já mostrou que tem facilidade de trabalhar com jovens. Acho que foi uma grande escolha do Mano [Menezes] e da CBF.
Algum jovem chama atenção?
Primeiro o Neymar. O Botafogo lançou um agora no meio de campo [Lucas Zen]. O próprio Santos vem lançando uma série de atletas, mas eles dependem de oportunidades. Você vê o Fluminense, que contratou vários nomes de nível e montou um time para ser campeão, mas os jovens não têm espaço. O Tartá, que ainda é novo, teve chance porque vários se contundiram. Mas nós temos jovens bons. Tem aquele que era do Vasco e foi para a Inter de Milão [Phillipe Coutinho].
E a relação da imprensa com os jogadores?
Se um cara é bom, tem capacidade, sabe que vai virar estrela, tem de estar preparado. Temos mil exemplos de grandes jogadores que nunca deram problema, como o Kaká. Ou tem uma vida regrada ou vai fazer outra coisa. O cara sabe que precisa tomar cuidado, a imprensa está em cima. Na nossa época não tinha isso, poucos cobriam o futebol. Hoje, infelizmente, tem aqueles que vão justamente para registrar um deslize.
O Brasil vai conseguir sediar a Copa de 2014 com sucesso?
Se fizerem tudo que é necessário, estádios, infraestrutura, aeroportos, hotéis e tudo que a Fifa exigue, lógico que sim, já que somos a terra do futebol.
Quais as chances de tudo acontecer como se deve?
Fico preocupado. O tempo está passando e não se vê nada. Todo mundo fala em aeroportos, mas cadê as obras? Os estádios também são problemas. Não ouço falar nada. Isso deveria ser mais noticiado.
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