O discurso do técnico Bernardinho é previsível: ou ele se irrita e solta a língua, ou sai pela tangente, usando discursos de auto-ajuda, puxando para si apenas situações que interessam. Isso não o torna um mau treinador, nem tira o mérito da incrível campanha que teve à frente da seleção ao longo desses sete anos com 25 finais e 21 títulos em 27 torneios.
Contudo, ao final de mais um ciclo, é possível ver um desgaste do comandante. Seja no convívio com a imprensa, seja com os atletas. A discussão com Gustavo, pouco antes do início da Olimpíada, foi apenas mais um incidente que demonstra isso. O último é a "incerteza" do técnico em continuar no cargo.
Depois da derrota para os Estados Unidos, a terceira da equipe titular em seqüência para os americanos, e a perda da medalha de ouro, pela primeira vez o técnico afirmou que não sabe qual será o seu futuro, que terá de avaliar a situação.
"É o momento de ter calma, de analisar. Vou ver se tenho disposição de ficar na caverna", disse, referindo-se ao enorme tempo que o selecionado lhe consome, lhe tirando o tempo de ficar com a família, por exemplo. Mas, logo em seguida ele demonstra o interesse na manutenção do trabalho. "Por que não? (continuar a frente da seleção). Se eu for a pessoa adequada, estou pronto para coisas novas."
Coisas novas, no caso, é a reformulação do elenco, que já tem a despedida anunciada de Gustavo e a provável saída de Anderson e Marcelinho.
"Ano que vem é o ano de dar uma geral", disse o técnico, que pretende manter a base e prevê a manutenção do nível técnico. Já a hegemonia... "Deste grupo, o Dante, Rodrigão, Murilo, André Heller, André Nascimento, Bruno, Samuel... todos devem ficar. O Brasil vai continuar competitivo, entre os melhores. Mas querer que a nova geração repita o que esta conseguiu será colocar muita pressão".
Mas há perguntas em que Bernardinho não consegue mais manter a calma. Ontem, por exemplo, por dois momentos demonstrou sua impaciência. Primeiro ao ter de comentar uma declaração de Fernanda Venturini, sua esposa, no blog dela. Durante a Olimpíada, a ex-levantadora afirmou que Ricardinho fazia falta. "Nunca li blog na minha vida, não tenho tempo para isso. Vocês deviam perguntar isso para ela", disse.
Depois, sem que ninguém pedisse, recitou um poema que utilizou para motivar os atletas na véspera do jogo: "If", do indiano Rudyard Kipling. Logo depois, foi perguntado se faria algo diferente na preparação se pudesse voltar no tempo. "O se. Sempre o se", respondeu contrariado. Ele só não deve ter percebido que "if", em inglês, significa "se" em português.
Mesmo com a relação naturalmente desgastada, a separação da "Família Bernardinho" mexe com o treinador. Quando toca no assunto, seus olhos se enchem de lágrimas. Ele enaltece a prata lembrando que todos, há oito anos, aceitariam as mesmas condições se fosse para erguer todos os troféus que foram conquistados.
"Se dissesse para qualquer um que teríamos de ralar para cacete por oito anos e ganharíamos uma medalha de ouro olímpica, uma de prata, dois Mundiais, duas Copas do Mundo e seis Ligas Mundiais, todos aceitariam e estariam comigo. Por isso, a saída deles é muito dolorosa para mim. Passamos muito tempo juntos", revelou, sem esconder a emoção.
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