Tânia Spindler entrou pelo túnel que leva à pista olímpica do Ninho de Pássaro com mil coisas na cabeça. Era a 37ª colocada, a melhor colocação da marcha atlética feminina do Brasil, mas isso nem importava tanto. Lembrava que há dois anos havia decidido parar, mas não conseguiu pela pressão da família, dos amigos.
Totalmente encharcada, as lágrimas do rosto se confundiram com a forte chuva que caiu em Pequim na manhã de ontem. O público vibrava como o fez para todas as competidoras que terminaram a prova. Muitas apareceram no telão do estádio vomitando, cambaleando, e as palmas e gritos foram o reconhecimento pelo esforço, vontade e perseverança.
Era mais ou menos isso que havia ocupado os pensamentos de Tãnia em quase todo o percurso de 20 quilômetros da prova, que começou e terminou no palco da abertura da Olimpíada da China.
Mas foi nos pouco mais de 100 metros da pista olímpica que ela decidiu não deixar tudo terminar naquele momento. Na hora que ultrapassou a linha de chegada, imediatamente Tânia iniciou o projeto mais ousado de sua vida: ganhar uma medalha olímpica.
"O que senti aqui foi inexplicável. Quero sentir isso mais vezes", afirmou a atleta paranaense, que, embora nascida em Palotina, conheceu a marcha atlética em Goioerê.
Com 31 anos, Tânia lembrou que a segunda colocada da prova de ontem, a norueguesa Tyzze Platzer, tem 36. Então, na equação da brasileira, ela pode, tranqüilamente, participar de mais duas Olimpíadas.
"Não vejo a hora de começar a treinar", disse, empolgada. "Agora vou me preparar para o Mundial de Berlim, no ano que vem. Quero chegar lá correndo a prova em 1h31. Com esse tempo, vou brigar por medalha."
Se ela conseguiu, após o Pan do ano passado, melhorar o tempo em quase 15 segundos, reduzir sua melhor marca 1h33min23 em dois minutos não é impossível. Ontem, com chuva, fez 1:36.46.
"Nem eu acreditava que conseguiria chegar aqui", disse.
Mas o treinamento vai ter de esperar um pouco. No começo do mês, após voltar para São José dos Pinhais, onde reside, Tânia irá realizar uma cirurgia no abdome. Só deve voltar a treinar no fim do ano.
Depois, volta à luta por patrocínio. Sem o dinheiro, Tânia sabe que tudo o que planejou na corrida não passará de pensamentos isolados fadados ao esquecimento. "Espero que essa participação me dê respaldo. Pois não vim para Olimpíada só ganhar parabéns. Preciso de estrutura. Fazer intercâmbio, usar suplementação. Pois só com arroz e feijão não funciona", afirma.
No ano passado, Tânia gastou R$ 13 mil do bolso para competir na Europa. A experiência lha valeu a melhora no tempo e também um rombo na conta bancária: "Estou pagando até hoje".
Atualmente, a atleta conta com o patrocínio da Fundacem, de Araucária. E com permutas. "Enquanto na Europa se ganha para ser atleta, no Brasil se vive de permuta. Não paga a padaria, o colégio das crianças, a academia..."
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