"Guerreiros com guerreiros fazem zig, zig, zá." A canção infantil embalou a brincadeira de roda das jogadoras da seleção brasileira feminina de futebol no último treino antes da decisão da medalha de ouro olímpica, hoje, às 10 horas (de Brasília), contra os Estados Unidos. A partida será no Estádio dos Trabalhadores, em Pequim, palco da eliminação do time masculino contra a Argentina.
Uma a uma, elas deram as mãos e dispararam a cantar. Parecia recreio em escola primária. Todas rindo, nem aí para as provocações das americanas, que gravaram um comercial prometendo vingar a goleada de 4 a 0 aplicada pelo Brasil na semifinal da Copa do Mundo do ano passado, também na China. O vídeo foi parar no Youtube e ganhou o mundo. Nas mãos do técnico Jorge Barcellos, deve virar arma motivacional para o duelo de hoje. "Estamos pensando apenas na gente, cuidando do nosso quintal. Deixa elas para lá", respondeu a atacante Cristiane, autora de cinco gols na competição.
No Brasil ninguém fala, ao menos publicamente, em bater as ianques como forma de dar um troco ao revés de quatro anos atrás, em Atenas, quando os Estados Unidos tirou do Brasil o primeiro lugar. Nem da derrota na semifinal de Sydney, em 2000. A preocupação, na verdade, é outra. As jogadoras querem saber se, caso saia o tão aguardado ouro no futebol projeto mais uma vez fracassado da equipe masculina , o país tratará a modalidade com um pouco mais de dignidade.
A goleira Bárbara, que barrou a paranaense Andréia Suntaque durante o torneio, não tem lá muita fé. Pernambucana do Recife, ela diz que já perdeu a conta do número de promessas que ouviu, sem nenhuma ter saído do papel. "É sempre assim. Chega um jogo importante e todo mundo fala em olhar com mais carinho para o futebol feminino. Só que nada acontece. Espero que desta vez apareça algo de novo. Vai aparecer. Tem de aparecer", afirmou, inconformada com o eterno pouco caso de quem atualmente melhor representa a essência técnica do país do futebol.
O abismo que separa brasileiros e brasileiras que ganham a vida com a bola nos pés é mesmo gigantesco. A realidade, contudo, parece estar mudando. Lentamente, mas mudando. O treino de quinta-feira à tarde, no complexo esportivo da Universidade de Pequim (madrugada no Brasil), por exemplo, foi acompanhado por mais de 50 profissionais de imprensa. A maioria composta por gente que desistiu de viajar a Xangai para cobrir a decisão da medalha de bronze entre o time de Dunga e a Bélgica, amanhã.
Até uma tevê sueca deslocou uma equipe apenas para seguir os passos de Marta, a melhor do mundo, e cérebro do Umea Ik, principal time feminino do país nórdico. "Mas a gente tem de pensar também nas meninas que jogam no Brasil. Em construir algo para elas. Muitas não recebem salário nenhum. Isso não pode continuar", ressaltou Cristiane, atacante do também sueco Linkopings.
Seja como for, Brasil e Estados Unidos entre as mulheres pode ser chamado de clássico. Ninguém quer perder. Muito menos as brasileiras. "Precisamos de um passinho só para chegar ao pódio e levar o país à loucura", disse Cristiane, na última frase antes de correr para a brincadeira de roda. Afinal, "guerreiros com guerreiros fazem zig, zig, zá".
Na TV
Brasil x Estados Unidos, às 10 horas, na RPC TV, Band, ESPN Brasil, SporTV e BandSports.
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