A semana foi agitada na CBF. Dunga foi demitido e Tite escolhido para ser o substituto. O comando da seleção olímpica passou para Rogério Micale. Porém, em Itu, no interior de São Paulo, a pouco mais de 500 km da sede da confederação brasileira, Vadão desfrutava de tranquilidade. O técnico da equipe nacional feminina está em um resort, onde comanda a etapa final de preparação do time para a Olimpíada.
Desde abril de 2014 no cargo, ele admite que não sabia que a modalidade tinha tantos problemas. Apesar disso, está realizado. Jamais imaginava participar dos Jogos Olímpicos. Ele completará 60 anos no dia do encerramento da Rio-2016 e garante que futebol feminino oxigenou sua carreira. “Quando eu voltar para o masculino, vou voltar melhor”, diz. Ele conversou por telefone com a Gazeta do Povo.
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Confira abaixo a entrevista completa:
São dois anos no comando da seleção. O trabalho tem sido mais fácil ou mais difícil do que você esperava?
Eu não sabia que o futebol feminino tinha tantos problemas. O desenvolvimento da modalidade é muito complicado no Brasil. Fizemos amistosos com o Canadá [no começo do mês] e o estádio estava com 25 mil pessoas em cada jogo. Não temos isso aqui. Precisamos de um plano social, desenvolver o esporte nas escolas, nas universidades, como ocorre nos países que dominam o futebol feminino. Os clubes não investem. Embora o gasto não seja grande, não há retorno. Não se vende uma atleta hoje. É amador.
Nós temos a seleção permanente em que as jogadoras recebem salário, tem condições de trabalho. Mas há um número de atletas muito pequeno para a gente selecionar. É temeroso depois que Marta, Cristiane, Formiga pararem porque a reposição é muito lenta. Tem escolinha para futebol masculino em todo lugar. Para as meninas, é exceção. Se não houver empenho de todo mundo, fica difícil. Perdemos muito espaço nos últimos dez anos porque vários países evoluíram demais nesse sentido e a gente praticamente estacionou.
O que precisou mudar no teu trabalho do dia a dia para trabalhar com o time feminino? O tom da conversa é diferente?
Não. Elas aceitam cobrança. Se tiver que chamar atenção, falar mais alto, gritar, não tem problema nenhum. As brincadeiras, piadas, o palavreado também é parecido com o futebol masculino, praticamente igual. A diferença maior é na parte física: velocidade, força, altura, potência do chute, uma série de coisas. Em virtude disso, é preciso também adaptar a parte tática.
Você pediu conselhos para alguém sobre como trabalhar com as mulheres em campo?
Quando eu fui contratado, a CBF trouxe também o Fabrício Maia [atual coordenador da seleção], que montou um ótimo trabalho em Araraquara. O time foi campeão de tudo. Ele conhecia muito de futebol feminino. Ele me orientou, ajudou muito, foi meu grande aliado.
“Há um número de atletas muito pequeno para a gente selecionar. É temeroso depois que Marta, Cristiane, Formiga pararem porque a reposição é muito lenta. Tem escolinha para futebol masculino em todo lugar. Para as meninas, é exceção”
Você se imaginava em uma Olimpíada?
Não. Eu estava com a carreira consolidada, empregado [na Ponte Preta] quando fui convidado para a seleção. Eu jamais me imaginava em uma Olimpíada. Fiquei muito emocionado quando fui chamado. Não passava pela minha cabeça. O futebol feminino foi um oxigênio para a minha carreira, porque eu tive que estudar muita coisa que não me preocupava tanto. Comecei a jogar direto com equipes europeias, que jogam nos moldes do futebol masculino europeu, então tem que aprender a enfrentar. Eu sempre digo que, quando eu voltar para o masculino, vou voltar melhor.
Está muito ansioso?
A medalha de ouro no Pan de Toronto, no ano passado, já foi algo astronômico para mim. Imagina na Olimpíada, um evento muito maior e dentro do nosso país. A cada dia que passa, a emoção vai aumentando.
A seleção feminina está em reta final de treinamentos. O time está pronto para a Olimpíada?
Faltam detalhes. No ano passado, foi criada a seleção permanente. Trabalhamos muito e só tínhamos duas atletas jogando fora do país. Nesse ano, são 16 jogadoras no exterior. Isso atrapalhou a sequência dos treinamentos. Mas ficamos muito tempo juntos em 2015, então criamos uma base boa, temos um padrão de jogo definido. Vamos fazer um último amistoso antes dos Jogos, provavelmente em 23 de julho, contra a Austrália.
O Brasil está no grupo com Suécia, China e África do Sul. O caminho é bom até uma possível briga por medalha?
Das 12 seleções do torneio, praticamente oito tem condições de ganhar. Existem as fortíssimas, como Estados Unidos e Alemanha, mas Suécia, Canadá, Brasil, Austrália e Japão, por exemplo, podem chegar. A caminhada é difícil, mas temos chance. O time tem jogado melhor e isso nos dá confiança.
Tem saudades do futebol masculino?
Por enquanto não. Trabalhar na seleção brasileira é um privilégio. É o ponto mais alto aqui no Brasil. Não tem coisa melhor do que representar o país, viajar o mundo inteiro aprendendo, ganhando e transmitindo conhecimento. Isso não tem preço. Estou vivenciando num momento da carreira que não esperava mais.
“O futebol feminino foi um oxigênio para a minha carreira, porque eu tive que estudar muita coisa que não me preocupava tanto. Eu sempre digo que, quando eu voltar para o masculino, vou voltar melhor”
Como vê a demissão do Dunga e a mudança no comando técnico da seleção masculina?
A pressão estava muito grande. Eu vi uma boa vontade muito grande do Dunga e do Gilmar [Rinaldi, coordenador também demitido], mas na prática os resultados não ajudaram. Aqui no Brasil os resultados tem que ser evidentes e as atuações tem que ser convincentes. Infelizmente, não aconteceu.
Você teve três passagens pelo Atlético (1999-2000; 2003; 2006-07) com 164 jogos no comando do time. O que mais te marcou?
A gente foi campeão paranaense em 2000 contra o Coritiba, mas a conquista da seletiva [1999] que colocou o Atlético pela primeira vez na Libertadores foi um momento histórico para uma equipe que jogava muito bem. Adriano Gabiru, Kelly, Lucas, Kléber, Alberto, Flávio. Todos no auge. Lembro também da última passagem. A equipe estava mal, mas livramos do rebaixamento com sobras e ainda quase beliscamos a Sul-Americana. Só perdemos para o Pachuca que tinha um belíssimo time. Foram momentos importantes.
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