Nesta sexta-feira, a Associação Internacional de Federações de Atletismo (Iaaf) julgou insuficiente as respostas dadas pelos russos diante das acusações de um programa generalizado de doping e optou por suspender a Federação Russa e seus atletas de todas as competições internacionais. A nove meses dos Jogos do Rio, a grande dúvida é se Moscou conseguiria reverter a suspensão a tempo de ainda poder participar do evento em 2016 no Brasil.
Na segunda-feira, uma comissão da Agência Mundial Antidoping publicou um informe de 350 páginas descrevendo uma verdadeira indústria montada em Moscou para garantir medalhas, com a ajuda do doping e o envolvimento direto do governo russo.
Em 2012, em Londres, os russos ficaram em segundo lugar no atletismo, superados apenas pelos americanos, e o informe descreveu a atitude de Moscou como uma “sabotagem” contra os Jogos.
Rapidamente, o governo russo reagiu, alegando que tudo não passava de um “complô” internacional contra Moscou. Vladimir Uiba, chefe da Agência Federal Biomédica, acusou a Wada de fazer parte de uma campanha do Ocidente contra seu país. “São investigações com motivos políticos que entram na mesma categoria que as sanções contra a Rússia”, disse à agência Interfax. Desde 2014, russos e americanos tem trocado farpas no cenário internacional por conta da invasão da Ucrânia, guerra na Síria e outros desentendimentos diplomáticos.
Mas, ao longo da semana, dirigentes russos deram sinais de que admitiam as falhas existentes no sistema de controles.
A esperança dos russos era a de evitar a suspensão, alegando que as “irregularidades” foram também causadas pelas falhas nos controles da Iaaf. Vadim Zelichenok, chefe da Federação de Atletismo da Rússia, também alegou que os problemas ocorreram sob “a velha liderança” na entidade e que, desde que ele assumiu, tudo mudou.
Vladimir Putin, presidente russo, chegou a apelar para que as entidades internacionais permitam que os atletas de seu país possam competir, prometendo rever todas suas práticas e até criando uma nova agência antidoping. Um programa para lidar com a crise também foi apresentado pelos russos, na esperança de que o COI acabe aceitando o plano e que permita a participação em 2016.
O vice-presidente da Iaaf, Sergei Bubka, não defendia uma punição generalizada, alertando que isso afetaria de forma “injusta” os atletas inocentes. Mas os russos ficariam ainda assim de fora de uma dúzia de eventos internacionais, inclusive a maratona de Boston ou Londres. Três eventos internacionais na Rússia ainda seriam cancelados.
Mas Moscou garante que, até agosto de 2016, “tudo estará em ordem”. “Tenho certeza de que estaremos nos Jogos do Rio”, disse Vitaly Mutko, ministro de Esportes da Rússia e acusado pela Wada de orquestrar o doping.
Dick Pound, chefe dos investigadores, não deixou de caracterizar as práticas russas como uma “herança soviética”. Não por acaso, os comentários que se seguiram fizeram ambos os lados retomarem um discurso da Guerra Fria, quando o Ocidente e Moscou usavam os Jogos Olímpicos como campo de uma batalha ideológica.
Para o presidente da Federação de Atletismo do Reino Unido, Ed Warner, existe um risco real de que o Rio seja o primeiro evento desde 1984 a ver o boicote de uma parcela do mundo. “Aliados da Rússia podem optar por um boicote se Moscou for punido”, disse. Mas ele defende que a punição seja mantida, mesmo diante do risco. “Esse talvez seja o preço a pagar”, declarou.
Do lado norte-americano, o chefe da Agência Antidoping dos EUA, Travis Tygart, “aplaudiu” o trabalho da investigação ao “expor o esforço russo de dominar o esporte por meios ilegais”. Para ele, Moscou não pode ser “autorizada a trapacear”. “Eles não devem ser autorizados a competir no cenário internacional”, defendeu.
Quem também saiu no apoio a uma exclusão dos russos foi a Austrália. “Não há como a Rússia arrumar sua casa até o Rio”, disse o chefe da Associação de Atletismo da Austrália, Phil Jones.
Os Jogos Olímpicos do Rio podem ocorrer sem a presença da Rússia no atletismo, num duro golpe contra o COI e com repercussões políticas que podem levar o evento no ano que vem a ter o primeiro boicote desde 1984. Moscou ainda pode recorrer da decisão, numa batalha jurídica que pode ganhar contornos políticos.
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