Ao lançar um edital para contratar uma consultoria em ciência do esporte, em 2013, a Confederação Brasileira de Ciclismo (CBC) definiu antecipadamente quem ganharia a concorrência. Fez o mesmo, naquele mesmo ano, ao abrir edital para contratar consultoria jurídica. Os nomes dos futuros vencedores já constavam nas minutas de contrato elaboradas previamente, conforma revela um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU). Acórdão publicado no Diário Oficial da União desta sexta-feira dá 15 dias para a CBC se explicar.
Estas informações foram reveladas por auditoria realizada em 2015 pela Secretaria de Controle Externo no Estado do Paraná (Secex-PR), a pedido do TCU. Foi constatado que as contratações da Práxis Consultoria e Informação Desportiva e da Sport Training Consultoria e Eventos “não seguiram os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”. A auditoria serviu de base para o relatório do TCU.
Os indícios de montagem de licitação teriam por objetivo a contratação de empresa apenas para simular a prestação de serviços que já eram realizados pela diretoria de alto rendimento da CBC. Com isso, fica evidenciada a existência de execução fraudulenta dos recursos envolvidos
“Os nomes das duas empresas convidadas já estavam escritos nas minutas de contrato previamente elaboradas aos respectivos editais”, aponta a auditoria. Em seu voto, o relator do processo, o ministro Vital do Rêgo, do TCU, aponta que a Sport Training assinou a minuta de contrato de consultoria em ciência do esporte por R$ 168 mil, em 18 de janeiro de 2013, três dias antes das outras concorrentes apresentarem suas propostas. A própria vencedora do edital só fez sua proposta em 18 de fevereiro daquele ano.
A Sport Training é representada nos relatórios de prestação de serviço por Antônio Carlos Gomes, superintendente de alto rendimento da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt). Já o coordenador do trabalho é Francisco Cusco y Florencio, que à época da contratação já era diretor de alto rendimento na CBC.
A auditoria aponta que o relatório anual de atividades da Sport Training inicia com a informação de que o departamento de alto rendimento da CBC teria sido criado por sugestão da Sport Training. O departamento, porém, existia desde 2012, pelo menos, já a cargo de Cusco.
“Assim, os indícios de montagem de licitação teriam por objetivo a contratação de empresa apenas para simular a prestação de serviços que já eram realizados pela diretoria de alto rendimento da CBC. Com isso, fica evidenciada a existência de execução fraudulenta dos recursos envolvidos”, aponta a auditoria.
Seria o mesmo caso da contratação da Práxis, que comprovou os serviços realizados apresentando ao TCU troca de e-mails nas quais o presidente da empresa assina na qualidade de “assessor jurídico da CBC”. A Lei Agnelo/Piva veta a utilização dos seus recursos para pagamento de pessoal.
Acolhendo o voto de Rêgo, os ministros do TCU rejeitaram aplicar multa à CBC, por enquanto, esperando a oitiva da entidade, que tem 15 dias para se explicar. Para a Secex-PR, a “responsabilidade pelo débito, correspondente ao valor integral do contrato desnecessariamente firmado, recai solidariamente sobre o presidente da CBC, José Luiz Vasconcellos, e sobre o presidente da Comissão Permanente de Licitação da entidade, Lúcio Orlando Coser, e a empresa contratada”.
Concorrentes sumiram
Uma das concorrentes era a Promo Total, da professora de educação física da prefeitura do Rio Andrea D’Aiuto dos Santos Martins, como professora de educação física do ensino fundamental da prefeitura daquela cidade (peça 111). A empresa tem como atividade econômica “artes cênicas, espetáculos e atividades complementares não especificadas anteriormente”.
A outra, Psisport Consultoria Esportiva, tem como atividade econômica principal “atividades de psicologia e psicanálise” e, como atividades secundárias, acupuntura, nutrição e fisioterapia. “Não há o que se enquadre nos objetivos da contratação, voltada para o treinamento técnico da modalidade de ciclismo, para fins de preparação de atletas para competições nacionais e internacionais”, aponta o relatório.
Também chamou a atenção o fato, constante na ata da licitação, de que os concorrentes “entregaram a documentação e se ausentaram”. Os auditores acharam curioso que eles não tenham demonstrado interesse em conhecer o resultado da licitação de que participaram.