Anderson Silva acerta em cheio o rosto do norte-americano Nick Díaz na luta que marcou a volta do Spider ao octógono 399 dias depois da grave lesão na perna| Foto: L.E. BASKOW/ESTADÃO CONTEÚDO

Não bateu o peso

Paranaense Lineker vence, mas é obrigado a subir de categoria

Pulando em um pé só, o paranaense John Lineker estendeu a mão para o presidente do UFC, Dana White, ontem, em Las Vegas. Sem falar inglês, a expressão facial do lutador era o próprio pedido de desculpas por não bater o peso da categoria mosca (até 57 kg) pela quarta vez em oito lutas.

Não adiantou. O atleta de Paranaguá, que machucou o pé na luta contra o americano Ian McCall, será obrigado a competir uma divisão acima, a dos galos (até 61 kg). Pelo menos continua vencendo – foi seu sexto triunfo na organização.

"Ele deveria bater [o peso] com o tamanho que tem [1,57 m]. Mas agora ele não terá mais a oportunidade de fazer isso. E ele acabou de vencer o número três do mundo de maneira impressionante. Infelizmente...", disse White, que tinha no brasileiro um possível candidato ao cinturão, hoje em poder do norte-americano Demetrious Johnson.

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Kalyl Silva tem 17 anos de idade. Seu pai trabalha em uma profissão de risco e fica pouco tempo em casa. Aproximadamente um ano atrás, o filho assistiu ao pai se machucar seriamente – e de maneira assustadora. Traumatizado, ele usa todos os recursos que tem para evitar que seu herói seja fragilizado novamente.

Esse é o cenário que Anderson Silva encontrou após completar seu retorno ao octógono do UFC, ontem, em Las Vegas. Spider derrotou o americano Nick Díaz por decisão unânime dos juízes 399 dias após fraturar a tíbia e a fíbula fazendo o que mais gosta.

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Agora, aos 39 anos, com o sentimento de missão cumprida após uma dolorida recuperação, ele pesa o que é melhor para seu futuro.

"Quando falo com meu filho, ele chora. É muito difícil para mim", conta o lutador nascido em São Paulo e criado em Curitiba. Ele mesmo foi às lágrimas no octógono, após o anúncio do resultado.

Pai de três meninos e duas meninas, Anderson ainda tem vontade de competir. O apoio da família, contudo, é cada vez mais restrito. A esposa Dayane também quer a aposentadoria. "Apenas o Gabriel não liga que eu lute porque ele diz que quer ser boxeador", fala.

O maior campeão da história do UFC começou a lutar exatamente no ano em que Kalyl nasceu, 1997. O objetivo era pagar as contas e, quem sabe, ascender socialmente. No início, chegou a competir duas vezes na mesma noite por mil reais, mas só se vencesse.

Depois de muita batalha, alcançou o objetivo. Hoje, só pisa no ringue por pelo menos R$ 5 milhões.

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O cartel do Aranha aponta 34 vitórias, entre elas 20 por nocaute, e 6 derrotas. As duas últimas, para Chris Weidman, disparadas as mais sofridas. Primeiro, a brincadeira exagerada, o nocaute e a perda do cinturão dos médios (até 84 kg). Depois, a lesão que mudou sua vida.

Se parasse hoje, deixaria o esporte realizado? "Absolutamente", responde Spider, com convicção sobre seu sentimento, mas em dúvida sobre todo o resto.

"Vou conversar com minha família porque amo meu trabalho, amo o UFC. Quando meu filho fala comigo, fico com um pouco de medo. Falo com o Ed [Soares, empresário], 'qual o próximo passo?'", completa, com um inglês em franca evolução moldado pelo curso de ator que tem frequentado em Los Angeles.

Se permanecer por mais algum tempo na ativa, opção mais provável, Anderson tem dois caminhos a seguir: fazer lutas como esta contra Díaz, focadas mais no espetáculo, ou trilhar seu caminho de volta rumo ao cinturão.

Uma superluta com o ex-campeão dos meio-médios (até 77 kg) Georges St. Pierre é uma possibilidade a partir do momento em que o canadense retornar de um período sabático. Reencontrar Weidman ou mesmo Vitor Belfort pelo título é outro trajeto que pode se abrir.

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No momento, nada disso importa. O que vale mesmo é sentir que a dedicação extrema valeu a pena.

"Acho que foi o melhor Anderson possível para essa volta. O melhor está por vir. A luta foi ótima para ele se sentir, se testar. Vai ser um lutador ainda melhor do que era", diz acreditar o técnico de muay thai e boxe Marco Morales, presente em toda a reabilitação do Aranha.

A motivação para seguir também aumenta ao ver uma arena americana colorida com bandeiras brasileiras, falando português e gritando 'Silva, Silva' de pé e enlouquecidamente.

E também ao chegar em casa e, pelo menos por alguns momentos, trocar a preocupação por outro sentimento: orgulho.

O jornalista viaja a convite da Las Vegas Convention & Visitors Authority

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