Comemorar o aniversário de Curitiba significa, principalmente, celebrar as pessoas que contribuíram para construir a identidade da cidade. Se o dia 29 de março marca a fundação da Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais numa época em que o Brasil ainda era colônia de Portugal, 329 anos depois o cenário pode até ter mudado, mas uma característica permanece: os pequenos grupos urbanos continuam se reunindo a partir de afinidades e características comuns. Curitiba deixou de ser um povoado para se tornar uma metrópole com quase 2 milhões de habitantes e que reúne inúmeras tribos: esportistas, gamers, restauranters, hiperconectados, entre inúmeras outras possibilidades e terminologias.
A diferença de mais três séculos atrás é que, hoje, essas tribos urbanas não se formam mais em função apenas da identidade étnica e cultural. Apesar de muitos desses traços ainda estarem presentes em uma cidade multiétnica, os grupamentos passaram a se formar principalmente a partir de hábitos, costumes, hobbies e até mesmo de conhecimento técnico. No dia 29 de março, como forma de presentear a cidade, seus moradores, fãs e admiradores – sim, porque Curitiba é praticamente uma personalidade –, a Gazeta do Povo e a Tribuna do Paraná identificaram algumas dessas tribos que formam a capital paranaense para presentear o leitor.
A ALDEIA
Em 1693, quando a cidade foi fundada, seu perfil foi marcado principalmente pela vinda de imigrantes das mais variadas procedências. Além dos índios, mamelucos, portugueses e espanhóis que já estavam na região antes da formação do povoado, a partir do século 19 chegaram outros povos de origem europeia, asiáticos e africanos que contribuíram para formar a estrutura populacional, econômica, social e cultural da capital paranaense.
Os alemães que se instalaram no Boqueirão, os “polacos” da Barreirinha – mas que na verdade se espalharam por outras regiões formando em Curitiba a maior colônia polonesa no Brasil – , os italianos de Santa Felicidade. Além desses, chegaram sírios, ucranianos, libaneses, japoneses e tantas outras nacionalidades que foram se instalando, dando cores, tons e impondo seus hábitos e costumes à cidade. Aos poucos, a Terra das Araucárias foi ganhando os contornos que tem hoje e conquistando o peculiar sotaque de “leite quente”.
AS TRIBOS ATUAIS
Ao contrário das “aldeias” de antigamente, as atuais tribos urbanas que povoam Curitiba no século 21 não são definidas por questões étnicas, culturais ou raciais. Claro que essas aglomerações ainda permanecem e mantêm vivas suas tradições. Porém, são formações que dão mais sentido ao conceito atual da palavra “tribo”: de um grupo de pessoas que apresentam características e interesses comuns.
O sociólogo Cezar Bueno de Lima, professor do curso de Mestrado em Direitos Humanos e Políticas Públicas da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), explica que, em decorrência das mais recentes ondas migratórias, a capital paranaense assumiu um perfil mais cosmopolita, em virtude da industrialização e do enriquecimento cultural da cidade.
Foram dois grandes fluxos migratórios recentes, o primeiro até a década de 1990, formado principalmente por pessoas que vinham de áreas rurais em busca de oportunidades de trabalho em Curitiba. Depois disso, ocorreu uma nova onda, marcada principalmente pela industrialização em toda a Região Metropolitana. Curitiba foi impactada em vários aspectos, graças à inovação cultural e tecnológica que acompanhou aquele novo momento. Segundo o professor, a cidade ficou “mais plural” com a chegada dos novos habitantes e o envelhecimento da “geração europeia”.
A família de Suzane Nagahama, 31 anos, faz parte dessa nova leva de moradores que veio para Curitiba por questões profissionais e acabou adotando a cidade como sua. Suzane nasceu em Manaus (AM) e só conhecia o Sul do Brasil pela televisão. Seu marido, o servidor público federal Jun Nagahama, 49, nasceu em Tomé Açú (PA) e foi transferido para Curitiba em 2013. O filho do casal, Lucas, 6 anos, já é um curitibano a mais nas estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“No começo, me senti um pouco insegura devido à fama do curitibano, de ser frio e fechado. Mas, quando cheguei aqui, percebi que tem muita gente de fora”, observa Suzane. A constatação da amazonense já foi comprovada estatisticamente pelo IBGE: cerca de metade dos habitantes não nasceu em Curitiba.
Além de considerar a cidade uma terra de oportunidades, Suzane é apaixonada pelos parques, pela organização e pela qualidade de vida que a cidade oferece. Esses foram fatores decisivos para a escolha da cidade. Tanto que a família abriu mão do carro particular justamente por considerar que o transporte público é eficiente e atende às necessidades deles. “Aqui os ônibus têm horários bem definidos e funcionam bem. Isso evita o congestionamento nas ruas, como ocorre em Manaus, onde as pessoas não abrem mão desse conforto porque o transporte público é deficiente”, analisa.
O fotógrafo Nenad Radovanovic, 54 anos, está em Curitiba desde 1994, dois anos depois de chegar ao Brasil, vindo de Belgrado, a capital da Sérvia, em decorrência da Guerra da Bósnia – e que envolveu países do leste europeu como a Croácia, a Eslovênia, a Sérvia e a Rússia e resultou na morte de mais de 100 mil pessoas na região dos Balcãs.
Antes de chegar a Curitiba, Nenad, que veio com a esposa grávida e um filho pequeno, passou por Boa Vista (RR) e Brasília (DF). Descobriu a capital paranaense pela imprensa e afirma que hoje está perfeitamente adaptado à rotina da cidade. Nem mesmo da frieza do curitibano ele reclama: “Para mim, está perfeito assim”, brinca.
No dia 29 de março, confira o especial de aniversário da cidade com as Tribos de Curitiba.