Um caderno quadriculado, canetas coloridas, uma câmera e a vontade de seguir auxiliando seus alunos mesmo na pandemia, assim nasceu o projeto “Caderninho de Matemática” da professora curitibana Caroline Cardoso. Focado em explicar, com exemplos, operações e conceitos da matemática estudada do 6º ao 9º ano do ensino fundamental, a docente escreve e desenha à mão as explicações e publica em seu canal do YouTube e Instagram.
Criada em uma família com diversas mulheres professoras, percebeu seu amor por exatas e a vocação para ensinar quando cursou o tecnólogo em Construção Civil na UTFPR, antigo Cefet-PR e deu aulas particulares para amigos e parentes.
Porém, foi só durante uma dificuldade que o ‘ser professora’ surgiu em sua vida de vez. “Em um momento que fiquei desempregada, vi a oportunidade - com tempo para estudar novamente - e fui cursar Licenciatura em Matemática na PUCPR. Ao terminar fiz Especialização em Educação Matemática na UFPR e também uma segunda especialização em Metodologia da Interdisciplinaridade”, conta ela.
Já no início da licenciatura, em 2005, Caroline começou a trabalhar em escolas particulares e em 2008 começou na rede pública de Ensino do Estado do Paraná como professora de Matemática do ensino fundamental e médio. Nos últimos dez anos trabalhou no Colégio Estadual Emílio de Menezes.
Em 2020 com o início da pandemia, novamente gerando alternativas durante uma dificuldade, Caroline criou o “Caderninho de Matemática” com o objetivo de compartilhar e ajudar alunos, professores e pais, divulgando a matemática básica, as ciências exatas e a educação, através do uso de simples folhas quadriculadas.
Nesta entrevista exclusiva para a Gazeta do Povo, a docente fala sobre a trajetória desse projeto que hoje conta com mais de 58 mil seguidores.
Como surgiu o ‘Caderninho de Matemática’?
A ideia surgiu com um caderno em que escrevi à mão as explicações sobre as últimas aulas que eu havia dado para as minhas turmas. No final de março de 2020, enquanto ficamos em casa aguardando as aulas retornarem, pensei em agir logo para que meus alunos pudessem continuar a estudar, sem esquecer o que já havíamos trabalhado na escola.
Precisei formar grupos no WhatsApp pois a plataforma de ensino ainda não estava disponível para todos. Porém, os vídeos precisavam ser curtos para conseguir enviar. Então, veio a ideia de lançar em um canal para enviar os links e não sobrecarregar nenhum celular. Fiz um canal no meu e-mail pessoal mesmo.
Mas, percebi que ali eu estava ajudando muitos alunos, professores - que usavam nas suas aulas remotas - , e pais que estudavam com seus filhos. Então, com tanta replicação dos vídeos entre os alunos de outras turmas e outras escolas, vi a necessidade de criar um canal no YouTube com nome e e-mail próprios.
Como fazia para gravar os vídeos?
Eles foram feitos por mim, gravando minha mão escrevendo com um tripé de câmera fotográfica. Mas, com o tempo, criei uma mesa de vidro onde apoio minha câmera.
Eu usei como recurso o que muitas vezes disponibilizamos nas aulas de Matemática: caderno quadriculado, lápis e canetas. Eram esses materiais que eu tinha em casa naquele momento. Nos meus vídeos você não me verá, verá apenas meu caderno quadriculado e minha mão escrevendo aulas curtas, bem planejadas, com exemplos resolvidos por mim.
Talvez por eu não aparecer, tenha facilitado para que muitos vídeos tenham sido compartilhados em locais que sabemos que a escola simplesmente não estava presente em um longo período da pandemia.
E assim, meu canal despretensioso virou um projeto de estudos e, lá no YouTube, até o momento, você pode encontrar mais de cinquenta vídeos.
Além do canal no YouTube, a senhora tem uma página no Instagram, quando começou por lá?
No Instagram, eu dei início no Caderninho de Matemática em julho de 2020. Começou com uma “reciclagem” das folhas que eu escrevi nos vídeos gravados. Fiquei com ‘dó’ de todo aquele material que fui acumulando e comecei a fazer fotografias para postar nesta rede social.
Assim, começaram vários seguidores, pedidos de postagem, ajuda a alunos e outros professores. Além disso, vieram muitos elogios, ideias, amigos e amigas virtuais, mensagens. Eu comecei a perceber que a ideia de compartilhar materiais também podia ser feita ali naquela rede social, continuando com o objetivo maior do Caderninho de Matemática: levar matemática básica para ajudar quem precisa.
Aos poucos fui remodelando minhas postagens, continuando com a matemática básica mas, mudei principalmente para leitura mais rápida, aprendendo com o público desta rede social.
Com essa troca com o público, tiveram outras adaptações que a senhora fez?
Em 2021, em fevereiro, conheci meus alunos, entre eles, um autista que me motivou a mais uma ideia de mudança: folhas mais coloridas e chamativas, pois ele adorava desenhos e aprendia com facilidade a matemática. Posso até dizer que a partir deste ano, o Caderninho de Matemática ficou novo.
Inclusive, eu imprimia as folhas para ele e a mãe buscava na escola, para auxiliá-lo como material de apoio. A partir daí comecei sempre a escrever as folhas que postava com elementos gráficos e também usar bastante o lápis de cor.
O projeto ganhou muita força e passou a ser utilizado em diversos locais do Brasil. Como foi isso?
Pois é! O Caderninho de Matemática já foi usado em várias regiões do Brasil, de diversas formas. Além de digitalmente, nas ‘meets’ que aconteciam durante o ensino remoto da pandemia, ele também foi usado como material impresso (livreto, folha, cartaz, fanzine), em escolas de grandes redes particulares - por exemplo, a rede Objetivo -, escolas públicas de muitos estados e municípios, escolas do campo, grandes fazendas, tribo indígena.
Tudo isso eu sei porque, sempre que posso, converso com os seguidores no direct. São muitos relatos que me movem a continuar com o objetivo inicial de compartilhar com quem precisa.
Além de professores, vários pais e avós já me relataram como usaram com seus filhos, das dificuldades de estudarem juntos e não terem a didática para ensinar, sempre aproveito para parabenizar e incentivar por esta atitude.
Além de ajudar pessoas e ver essa gratidão, teve alguma oportunidade que o projeto trouxe ?
A partir do Instagram, fui convidada a fazer parte de um grupo de 15 professoras de Matemática espalhadas pelo Brasil, no qual incentivamos a participação de jovens e mulheres a participarem nas Ciências Exatas, postamos no Instagram temas mensais interessantes, defendendo que a Matemática é leve, instigante, curiosa. Damos palestras, mentorias on-line e consultorias em escolas.
Durante a pandemia, os meus materiais foram parar em muitas “Aulas Paraná” através de prints, assim como, depois de dois anos, eu fui também trabalhar como técnica na SEED, onde estou atuando no programa de formação continuada em serviço Formadores em Ação, um programa que consiste em grupos de estudo liderados por professores da rede estadual (professores formadores) e destinados a docentes da mesma disciplina ou área do conhecimento (professores cursistas).
E tudo isso aconteceu porque meu material continuou sendo altamente compartilhado e replicado por muitas salas de aula e, assim, fui conhecida.
E quais os próximos planos para o Caderninho de Matemática?
Sonho em ter o Caderninho de Matemática publicado como livro e, nestes próximos anos, usarei ele como objeto de estudo do Programa de Desenvolvimento Educacional, projeto de formação continuada oferecido pela Secretaria da Educação do Paraná, no qual fui aprovada no processo seletivo interno da rede.
Então, que tenhamos mais alguns anos cheios de folhinhas publicadas e muito aprendizado!