O planejamento tributário estratégico é essencial no momento de transição para minimizar riscos e explorar oportunidades de crescimento.
O planejamento tributário estratégico é essencial no momento de transição para minimizar riscos e explorar oportunidades de crescimento.| Foto: Shutterstock

Com a recente aprovação da Reforma Tributária, o cenário tributário brasileiro está passando por transformações profundas, embora ainda existam etapas a serem cumpridas no Congresso Nacional. Neste cenário, empresas, independentemente de porte e setor, enfrentam o desafio de se adaptar a um novo modelo de tributação que substituirá tributos federais e estaduais por uma estrutura simplificada e descentralizada. 

Por isso, o planejamento tributário estratégico é essencial nesse momento de transição para minimizar riscos e explorar oportunidades de crescimento. 

“Grandes mudanças como a reforma tributária podem trazer novos custos e impactos negativos, mas podem ser ótimos momentos para identificação de oportunidades”, destaca o advogado Pedro Lunardelli, sócio do escritório Advocacia Lunardelli. “É neste ponto que um bom estudo pode auxiliar a antecipação de um movimento que se transformará em diferencial no setor”, completa. 

Planejamento tributário: o que já pode ser feito para a transição

Ainda que haja pendências na aprovação final da reforma, as mudanças já começam a tomar forma, com a previsão de implementação das novas regras em 2026. Esse prazo, relativamente curto, exige que as empresas iniciem o planejamento de transição o quanto antes. 

“Embora ainda existam questões pendentes, o início da transição ocorrerá em 2026, portanto, é necessário atenção ao que já foi aprovado, uma vez que a estrutura dos tributos já está na Emenda Constitucional. Esta estrutura aprovada já possibilita identificar o impacto na maioria das atividades”, explica o advogado Alexander Silverio Cainzos, sócio do escritório Advocacia Lunardelli. 

A estrutura prevista pela Emenda Constitucional 132/2023 reconfigura tributos atuais, como o PIS, Cofins, ICMS e IPI, consolidando-os em novos impostos de valor agregado (IVA) — a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). 

Essa simplificação trará mais transparência ao sistema, mas implicará um aumento significativo no custo tributário para alguns setores, especialmente aqueles com grande intensidade de mão de obra, como serviços e construção civil. 

“Haverá necessidade de adaptação à nova realidade. A concentração do tributo no consumo e o fim dos incentivos fiscais do ICMS deverão redesenhar a cadeia de distribuição de produtos e serviços”, explica Lunardelli.

Transição tributária: principais desafios e oportunidades

Com a introdução de um comitê gestor centralizado em Brasília para gerenciar a arrecadação dos tributos, a transição tributária implica em adaptações tanto nos cálculos tributários quanto nas obrigações acessórias. 

Isso pode exigir uma reestruturação nos departamentos fiscais e contábeis das empresas, já que, durante o período de transição, os dois sistemas — o atual e o novo — coexistirão. Esse ambiente híbrido demandará uma carga de trabalho extra para empresas e seus setores administrativos, aumentando a complexidade operacional.

Para Cainzos, o maior desafio da transição será essa convivência simultânea entre dois sistemas distintos, que forçará uma adaptação dos processos contábeis e sistemas de tecnologia da informação. 

“As empresas precisam estar preparadas para cumprir com as novas obrigações acessórias e adaptar seus sistemas de ERP para essa realidade dual, o que trará custos adicionais e a necessidade de requalificação de equipes”, ressalta. 

Ao mesmo tempo, as empresas devem identificar possíveis oportunidades de planejamento tributário que poderão ser exploradas no novo cenário fiscal, como a reavaliação de estruturas societárias que impactem a tributação sobre receitas e operações.

Reforma tributária e o impacto sobre o fluxo de caixa das empresas

Com a nova sistemática tributária, espera-se que os tributos incidam de forma mais descentralizada ao longo das cadeias produtivas, gerando maior impacto nas empresas situadas nas etapas iniciais da cadeia industrial. 

Diferente da estrutura atual, na qual a indústria arca com boa parte do ônus tributário, no novo modelo, a carga fiscal será redistribuída entre produtores e prestadores de serviço, e o regime de não cumulatividade será ampliado.

Para as empresas, isso representa a necessidade de repensar o fluxo de caixa e o planejamento financeiro, já que os tributos poderão ser recolhidos antecipadamente, com menos créditos a serem abatidos. 

Cainzos alerta que as companhias precisarão renegociar prazos com fornecedores e investidores, especialmente em setores que enfrentem aumento na carga tributária, como o de serviços. 

“Portanto,  será necessário rever o fluxo financeiro e renegociar prazos com fornecedores até que o mercado encontre um novo ponto de equilíbrio, especialmente para os prestadores de serviços, que serão os maiores penalizados pelo aumento na carga tributária”, destaca o advogado. 

Tecnologia e adaptação operacional para o novo sistema

A implementação da reforma exigirá investimentos em sistemas de gestão e tecnologia para manter a conformidade com as novas regras e obrigações fiscais. Assim, os sistemas de ERP precisarão ser ajustados para suportar o cálculo dos novos tributos e a integração com o sistema central de arrecadação em Brasília. 

Esse desafio tecnológico também abrange os fornecedores de soluções fiscais, que precisarão desenvolver atualizações rápidas para que seus clientes estejam prontos para operar no novo sistema.

Além disso, setores como o agronegócio e a construção civil, intensivos em mão de obra e atualmente favorecidos por incentivos fiscais, terão que reavaliar suas operações para lidar com a extinção dos incentivos fiscais do ICMS. 

“O acompanhamento das normas em tramitação e a assessoria de profissionais especializados na área fiscal são fundamentais. A participação do especialista tributário nos estudos de impacto e na adaptação para o período de transição das empresas é fundamental para evitar riscos ou mesmo para buscar o amparo no poder judiciário em face de eventuais ilegalidades verificadas”, defende Lunardelli.

Reforma tributária: como cada setor será impactado

Os setores econômicos terão reações distintas à reforma, dado que a nova carga tributária pode variar bastante conforme o perfil da empresa e o segmento de atuação. Setores de serviço, por exemplo, que atualmente têm carga tributária reduzida, poderão ver um aumento significativo — em alguns casos, dobrando de 16% para cerca de 35% do faturamento, caso a alíquota padrão seja aplicada.

Para empresas optantes pelo Simples Nacional, a reforma oferece a opção de adesão à nova sistemática, incluindo CBS e IBS. Embora isso permita o repasse de créditos fiscais aos clientes, a carga tributária tende a aumentar, e a decisão exigirá uma análise cuidadosa. 

A Zona Franca de Manaus e outros setores com forte representação no Congresso Nacional também conseguiram regimes diferenciados, incluindo a manutenção de algumas regras tributárias atuais, mas a maioria das empresas terá que se adaptar às mudanças.

A Reforma Tributária marca um momento de transformação para o sistema fiscal brasileiro e exige das empresas um planejamento tributário cuidadoso e bem fundamentado para enfrentar a transição. 

As mudanças trarão desafios operacionais, tecnológicos e financeiros, mas também criam um contexto em que empresas que se adaptem rapidamente podem encontrar novas oportunidades.

Para Cainzos, a chave para uma transição bem-sucedida reside no preparo e na adaptação proativa: “Nossa recomendação é que as empresas voltem para a prancheta e revejam seus negócios, especialmente a sua cadeia de fornecimento e localização do mercado consumidor. Será necessário verificar o impacto da Reforma na formação dos preços dos produtos e serviços fornecidos e recebidos”, defende o advogado.