O cooperado que nada produzir nada receberá no rateio periódico das sobras| Foto: Shutterstock
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Tem-se observado, com frequência, a importância de pessoas se reunirem para trabalhar em comum, aglutinando suas forças e, com isso, obtendo melhores resultados econômicos do que os que teriam se exercessem isoladamente suas atividades.

Um grupo assim formado percebe, com o tempo, a necessidade de consolidar sua união, geralmente mediante a criação de uma associação, de uma plataforma digital ou mesmo por meio de um contrato atípico que os permita estabelecer regras de convivência estável em benefício de todos e de cada um, sem perder o direito de exercer pessoal e individualmente a atividade a que se propõe. 

A figura adequada para isso é a cooperativa, pois ela foi instituída para proporcionar a reunião de pessoas que atuam no mesmo e em qualquer ramo da indústria, do comércio ou de serviços, não vedado por lei. 

Na cooperativa, diversamente do que se passa em uma sociedade, o cooperado ocupa uma dupla posição: de sócio e, ao mesmo tempo, de cliente, pois, além de obter resultados do seu trabalho, conta com a cooperativa como veículo para a colocação de seus produtos ou a prestação de seus serviços no mercado sem intermediários e, igualmente, para obter conhecimentos técnicos com programas educacionais para si próprio e para seus familiares, além de participar, sempre que possível, de ações sociais em prol da comunidade local.

Na cooperativa, o tratamento de todos os cooperados deve ser totalmente igualitário, pouco importando o quanto cada qual tenha utilizado a cooperativa em seu benefício ou contribuído para a formação do capital dela, tanto que as deliberações são tomadas em votação per capita (por cabeça) – ou seja, cada cooperado tem direito a um só voto nas reuniões assembleares. 

Não há membro algum que exerça o controle da entidade e as eleições, em períodos nunca superiores a quatro anos, possibilitam que qualquer cooperado ocupe os cargos diretivos, inclusive mediante substituição periódica.

Tal como a associação, a cooperativa pode ser constituída sem capital social, sem onerar, portanto, seus participantes. Na maioria das vezes, é recomendável haver alguma contribuição para que ela possa ter estrutura material facilitadora das atividades cooperadas. 

Ainda assim, há uma vantagem peculiar e bem maior em relação às sociedades e associações, pois, diferentemente do que se passa nelas, o cooperado, ao se desligar da cooperativa – e basta não querer mais dela participar –, recebe de volta o dinheiro que lhe aportou a título de capital. Nada perde e nem se sujeita a um processo de apuração de seus haveres. 

É que o valor destinado ao capital social da cooperativa é tratado como uma espécie de empréstimo, que rende juros ao cooperado enquanto nela permanecer e lhe é devolvido quando a deixar, ainda que em caso de falecimento. 

As disposições que regulam a cooperativa não permitem que ela receba lucros, pois os seus resultados, tirando as despesas e os percentuais dos fundos obrigatórios destinados a cobrir outros custos e os programas culturais, não são lucros da entidade, mas sobras que pertencem aos cooperados, mais precisamente a cada um dos cooperados na proporção e na exata medida das operações realizadas com a cooperativa ou com o auxílio dela. 

Assim, como destaquei ao escrever sobre o tema, o cooperado que nada produzir nada receberá no rateio periódico das sobras (Singularidades da Cooperativa Singular. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2024, n. 4, p. 23). 

Vale advertir o leitor, no entanto, de uma possível dificuldade para a criação e a utilização do modelo cooperativo em situações como as aqui descritas. Trata-se da exigência legal de se contar com um número mínimo de 20 (vinte) pessoas interessadas, imposta para evitar a banalização de seu uso. 

O Código Civil havia previsto um critério genérico, de modo a possibilitar sua constituição e funcionamento com tantos membros quantos necessários para preencher os cargos de sua estrutura (Diretoria ou Conselho de Administração e Conselho Fiscal). 

Essa regra, porém, sendo genérica, não revogou a específica, referente à cooperativa singular, isto é, à cooperativa de base, como é o caso, prevista na lei especial que a regula (Lei 5.764/1971, art. 6, inc. I) e reproduzido no Manual de Registro de Cooperativa (Anexo VI da Instrução Normativa DREI 81/2020, Capítulo II, Seção I, n. 3), que orienta sua inscrição perante a Junta Comercial.

Por Alfredo de Assis Gonçalves Neto – OAB/PR no 3.948
Assis Gonçalves, Nied e Follador Advogados
Prof. Titular Faculdade de Direito da UFPR