
O aumento de ameaças externas, como pressões financeiras, sociais, ambientais e até as decorrentes da globalização, e a sofisticação cada vez maior dos ataques a empresas diante de um mundo automatizado têm tornado essencial a prevenção a crimes econômicos no ambiente de negócios.
A Pesquisa Global sobre Fraudes e Crimes Econômicos 2022, da PwC, que ouviu 1.296 executivos em 53 países e regiões, mostra que o Brasil apresenta um cenário mais sensível. Enquanto globalmente 46% das empresas sofreram com corrupção, fraudes ou crimes econômicos em dois anos - percentual estável em relação a outros períodos -, no Brasil, o índice saltou de 46% (2020) para 62% (2022).
Dentre os que relataram terem sofrido com esses delitos mundialmente, mais de um terço revelou o envolvimento de agentes internos e 26% disseram que o crime envolveu conluio entre agentes externos e de dentro das empresas.
Outro dado apresentado pelo levantamento revela a importância de investimentos em prevenção: dois terços das empresas vítimas de crimes econômicos no mundo descobriram o incidente mais grave de fraude com a ajuda de controles corporativos, um resultado sete pontos percentuais acima do registrado em 2020.
Como aponta a advogada especialista no tema Victória Esmanhotto, do Escritório Beno Brandão Advogados Associados, cumprir medidas preventivas não serve apenas para enquadrar a organização à lei, mas para evitar eventuais crimes praticados contra a empresa por seus colaboradores e gerar uma gestão eficiente diante de problemas que podem comprometer a reputação e a sustentabilidade do negócio.
“A importância de um programa bem estruturado é ampla. Além dos problemas legais, existem outros riscos, como delitos que possam ser praticados dentro dela, por seus funcionários, ou até mesmo tendo a empresa como vítima. Também no sentido de manter a imagem pública da companhia, o relacionamento com instituições financeiras, e a proteção de dados, um tema atual e relevante”, afirma.
Dicas de compliance para empresas
Como elenca a advogada, um programa de compliance adequado depende da análise das características da empresa, mas há algumas medidas simples, mas eficazes para evitar problemas criminais e que podem ser adotadas em diferentes perfis de negócios, desde pequenas organizações até grandes empresas.
1. Programa de Integridade: um programa robusto de compliance inclui códigos de conduta, monitoramento de riscos, e um sistema de denúncias seguro e anônimo. Isso ajuda a identificar problemas antes que eles se tornem mais graves. A empresa também pode buscar certificações de conformidade e reforçar a cultura de integridade por meio de campanhas internas e externas. A eficácia do programa ainda depende da maneira com que eventuais denúncias são tratadas. “Empresas que tratam de forma firme e padronizada essas questões atribuem maior seriedade e força ao programa, o que é determinante para sua eficácia”, aponta Victória.
2. Políticas internas de compliance: estabelecer políticas internas claras é fundamental. Desde o uso de ferramentas de controle até o bloqueio de acesso a documentos, a empresa deve assegurar que dados sensíveis estejam protegidos. Isso inclui, como elenca Victória, o cadastro atualizado de clientes e fornecedores utilizando o processo Know Your Customer (KYC), o monitoramento de transações financeiras suspeitas, e uma política clara de combate aos crimes empresariais.
3. Treinamento de colaboradores: o treinamento contínuo é essencial para conscientizar os colaboradores e diretores sobre ética e políticas internas. “O compliance é uma cultura preventiva que todos devem adotar”, reforça a advogada. Essas práticas regulares, incluindo palestras e cursos para os colaboradores sobre práticas éticas e conformidade, e treinamento específico para identificar sinais de corrupção, como transações atípicas ou suspeitas, ajudam a estabelecer uma mentalidade de ética e transparência.
Gestão de riscos legais
Victória detalha que as empresas enfrentam diversos desafios legais, mas que o enquadramento das regras depende do porte e perfil de cada organização, por isso um programa de compliance adequado presume uma análise detalhada do cenário.
“Não existe um modelo geral a ser aplicado e implementado por todos. Ou seja, cada um deve ser criado individualmente, olhando para a empresa e observando os critérios específicos que serão aplicados a ela”, ressalta a profissional.
Ela cita como exemplo a Lei de Lavagem de Dinheiro, que traz um rol de negócios específicos com maior obrigação de fiscalização e prevenção desse delito. São as que atuam com recursos de terceiros, compra e venda de moeda e/ou jóias, pedras e metais preciosos, ou ainda na administração de títulos ou valores imobiliários.
Caso descumpra alguma das regras, a empresa pode sofrer penalidades que vão desde advertência, passando por multa, até a suspensão das atividades.
“Além dos riscos citados, existem diversos outros problemas que podem ocorrer com a inobservância de padrões de conformidade pela empresa. É justamente nesse sentido que é necessária a implementação de um programa de compliance, chave para a prevenção jurídica e proteção empresarial”, destaca Victória.
Monitoramento e prevenção contínuos
A eficácia das medidas preventivas não depende só da implantação de um programa de compliance. A atualização constante é citada pela advogada como ponto essencial que diferencia um programa feito “para cumprir tabela” de outro realmente efetivo, capaz de cumprir com seu papel.
“Não basta seguir todas as etapas de criação de um programa personalizado, mas sem que ele seja mantido sempre em dia, seja com a legislação, seja com a própria atividade e política interna da empresa”, avalia a especialista.
Ela cita outros erros comuns cometidos por organizações, como falta de treinamento adequado para líderes e colaboradores, políticas internas mal definidas ou de difícil aplicação e falhas em monitorar fornecedores e parceiros.
Victória detalha que, nesse monitoramento, as empresas precisam ficar atentas aos sinais de alerta, como aumento de denúncias internas, transações incomuns ou falhas. “Corrigir erros imediatamente evita danos maiores”, ressalta.