A complexidade do sistema tributário brasileiro aliada às frequentes mudanças na legislação geram insegurança entre os contribuintes, que muitas vezes nem se dão conta de que cometem erros no preenchimento ou no pagamento de impostos e acabam notificados pelo fisco. 

Uma questão tributária pode gerar muita dor de cabeça, em especial aos negócios, que correm maior risco de ter a estrutura comprometida por uma cobrança, já que em geral os impostos já comprometem cerca de 30% das despesas de empresas. 

Porém, mesmo quando o desespero aperta, é preciso conhecer para proteger os direitos dos contribuintes na contestação dessas dívidas, buscando soluções dentro dos limites legais.

Como aponta o advogado tributarista Cláudio Henrique Resende Batista, sócio da DMGSA - Domingues Sociedade de Advogados, mesmo quando já há um problema fiscal constituído, as divergências de interpretação da legislação entre o órgão administrativo e a Justiça podem beneficiar o contribuinte.

“Mesmo diante de um auto de infração constituído, é possível encontrar o entendimento da autoridade fiscal, o entendimento do contribuinte e o entendimento dos tribunais administrativos e judiciais. Logo, a adequada argumentação jurídica, o uso da interdisciplinaridade entre o direito e a contabilidade e, especialmente, o correto uso da situação fática e específica do contribuinte, pode proporcionar a completa baixa de um auto de infração já constituído”, comenta o especialista. 

Prevenção

Batista lembra que, no último dia 24 de junho, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) voltou a aprovar súmulas após três anos, editando, de uma vez, 14 entendimentos. Ou seja, é preciso estar atento às movimentações não só dos órgãos judiciais, mas em especial dos administrativos para acompanhar as regras vigentes em termos de impostos.

Por isso, o trabalho do contencioso tributário se inicia já na prevenção, com uma boa organização documental e um planejamento fiscal. 

Empresas que contam com uma consultoria especializada podem ajustar suas operações para se adequar à legislação e interpretações e, em muitos casos, evitar futuras contestações do fisco. O plano também deve contemplar um guia de medidas a serem tomadas a partir de uma cobrança.

“O benefício do planejamento é realmente colocar o dinheiro no bolso. Porque, se você simplesmente paga o fisco, pode demorar muitos anos para reaver os seus recursos indevidamente pagos. E esse dinheiro no caixa também pode gerar rendimentos”, explica Batista.

O especialista ressalta que muitas vezes um pequeno erro pode levar a uma cobrança, o que não representa má-fé do contribuinte. Ele cita como comum, por exemplo, discordâncias no preenchimento de obrigações acessórias.

Disputas fiscais

Como avalia Batista, a chave para um contencioso tributário bem-sucedido está em uma assessoria tributária bem estruturada, capaz de analisar o cenário financeiro, contábil e jurídico da empresa e de propor as melhores estratégias de defesa.

“O contribuinte sempre tem o direito de provar o que a gente chama de verdade material, ao contencioso cabe muito isso, mostrar a verdadeira essência daquela operação contestada”, aponta Batista.

Essa interpretação não depende só da legislação, mas engloba até o momento político que o país vive. O advogado cita que, a depender da administração, os olhos do governo estão mais ou menos voltados à aplicação de penas decorrentes de problemas fiscais.

Também pode haver diferenças no tratamento das multas a depender do viés do governo, com mais ou menos ofertas de negociações e descontos, por exemplo. “É também um trabalho de risco, porque o empresário pode fazer uma aposta num tipo de operação ou de tributo, e pode dar errado. Por isso é interessante fazer uma análise de risco-retorno, quase que como um investimento”, avalia Batista.

Ou seja, a assessoria jurídica não só auxilia na defesa dos direitos do contribuinte, mas também orienta quanto à possibilidade de parcelamentos, negociações e até mesmo revisões de multas e juros.

Outro papel da consultoria tributária é afastar o risco de cometimento de fraude, o que pode levar não só a empresa para uma grande dificuldade, como também gerar problemas criminais aos envolvidos, normalmente pela caracterização de crime contra a ordem tributária ou crime financeiro. “Esse tipo de operação deve ser desencorajada ao máximo, já que nenhum risco vale a liberdade”, aponta.

Passo a passo

Para se defender de uma dívida fiscal, existem várias estratégias legais que podem ser adotadas, a depender da natureza da cobrança e das circunstâncias do devedor.

A primeira é a negociação ou parcelamento da dívida, facilitando sua quitação pela empresa se não houver margem de contestação do que está sendo cobrado. Eventuais créditos fiscais e a adequada apresentação do rating (capacidade de pagamento) da empresa também podem ajudar a amortizar ou pagar a obrigação.

Já a defesa inicia pelo âmbito administrativo, antes da dívida ser cobrada judicialmente. Nesse contexto, é possível ainda impugnar o auto de infração ou lançamento, ou pedir sua revisão, caso constatados erros no cálculo do tributo, e recorrer administrativamente até as últimas instâncias. 

Se, ao final da fase administrativa, remanescer alguma dívida tributária e o contribuinte entender que essa dívida é total ou parcialmente indevida, é possível pedir a anulação do débito no judiciário, por meio de uma ação anulatória, mandado de segurança ou embargos à execução. O modelo de ação depende justamente dos moldes da aplicação da cobrança pelo fisco.

Nereu Domingues, sócio fundador do DMGSA e que integrou o CARF, tribunal administrativo da receita federal, destaca que “é muito importante o regular aproveitamento de todas as oportunidades do processo administrativo fiscal, desde a abertura do procedimento de fiscalização até o julgamento da última instância no tribunal administrativo e, se necessário, no judiciário. Não raras vezes evitamos o lançamento de autos de infração com o adequado respeito e presteza no atendimento à autoridade fiscal, especialmente, pela comprovação da especificidade fática da empresa”.