O ensino remoto foi uma das novidades que chegaram com a pandemia de Covid-19. As aulas virtuais foram a alternativa para garantir a continuidade do ano letivo e para manter o vínculo entre alunos e instituições de ensino em 2020. Ao mesmo tempo que essa conexão trouxe proximidade entre professores e alunos, em muitos momentos se tornou um verdadeiro pesadelo para toda a comunidade acadêmica. Colégios que ainda não estavam preparados tecnicamente, famílias que não tinham aparatos tecnológicos suficientes, estudantes que não sabiam usar as novas plataformas. Para 2021, a perspectiva dos especialistas é a adoção do ensino híbrido, um dos grandes legados da pandemia na área da educação.
Em meio ao cenário de caos inicial, destacaram-se as escolas que demonstraram maior velocidade e capacidade de adaptação ao ensino remoto.
Um levantamento realizado em maio de 2020 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), mostrou que as aulas de cerca de 50 milhões de crianças e jovens no Brasil foram afetadas. Somente no ensino superior mais de 6,3 milhões de estudantes ficaram sem aulas no primeiro momento.
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Entre os professores, pais e os estudantes, o principal questionamento é saber como a crise causada pelo Covid-19 deve interferir na configuração da educação em 2021 e como as escolas estão se adequando para esse novo cenário. Para Arthur Camargos, especialista em pedagogia digital e inovações tecnológicas, o ensino remoto no Brasil foi feito no improviso, apesar de já existir uma legislação que previa o uso da tecnologia. Ele cita a Lei 9.394/1996, que já dizia que o ensino a distância poderia ser utilizado na complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais.
Em Curitiba, em boa parte do ano o ensino aconteceu de forma remota. Porém esse processo acabou promovendo a transformação digital na educação infantil e nos ensinos fundamental e médio. Além disso, tudo indica que isso adiantou uma tendência conhecida como “ensino híbrido” – ou blended learning –, no qual o processo de aprendizagem está contemplado em vários tipos de aulas, online, gravadas e presenciais.
Blended learning
A metodologia ativa é um conceito chave para entender o ensino híbrido, segundo Camargos. Ela exige um perfil de aluno que usa as ferramentas tecnológicas e outros recursos ao seu redor, mas também aprende fora da sala de aula. O especialista explica que, desta forma, o momento presencial é usado para a prática, com construção colaborativa, atividades e debates, por exemplo.
Camargos afirma que o ensino híbrido não prevê, necessariamente, a retirada do convívio presencial, mas sim a inclusão dos alunos em uma cultura ciberdigital. “Precisamos ensinar para os alunos que a internet é uma ferramenta preciosa de pesquisa e de ensino, que vai além das redes sociais e dos jogos online”, aponta.
Novas metodologias
O educador observa que ainda é necessário a comunidade acadêmica repensar as metodologias de ensino. Ele lembra que a tecnologia tem um caráter apassivador, principalmente com os conteúdos gravados (EAD) que não permitem a interação imediata. “Precisamos formar alunos construtores do conhecimento, aprender é uma ação”, enfatiza.
Para que aconteça o verdadeiro ensino híbrido, Camargos ressalta que o professor precisa entender que o centro da educação deve ser o estudante: “é necessário ter plena consciência de que a tecnologia não é autônoma e o professor não é substituído por ela, mas a usa como parte da sua metodologia”.
Waleska Pacheco, professora do Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba) e pesquisadora sobre design e educação infantil, diz que o perfil do aluno brasileiro deve mudar com a chegada antecipada do e-learning. Segundo ela, para o ensino remoto ter sucesso, o processo não pode ser vertical, como costumava ser no Brasil. Neste novo cenário, o estudante precisa ser protagonista do seu conhecimento, com a realização de pesquisas antecipadas, dedicar atenção às aulas sem a necessidade da cobrança do professor, além da realização e entrega das atividades dentro do prazo. “Alguns alunos têm dificuldade com essa metodologia. Isso acontece porque não foram educados para trazer dúvidas e sim receber o conteúdo de forma mastigada”, analisa.
Rotina
Além de professora, Waleska também é mãe de duas meninas, Letícia, 8 anos, e Beatriz 4 anos. Ela relata a dificuldade de dividir a atenção entre os afazeres de casa, do trabalho home office em horário regular e de ajudar as filhas. “Preciso acompanhar a minha caçula, que já aprendeu o caminho de conexão da aula, apesar de não saber ler. É necessário estar junto para acompanhar a realização das atividades. Já a mais velha aprendeu a mexer e é responsável por assistir sozinha. Mas, mesmo assim, toda semana é preciso conferir o que ela está fazendo”, observa.
O advogado André Vale e sua esposa, Larissa, também têm dois filhos em idade escolar: André Júnior, 10 anos, e Maria Luiza, 8 anos. Por lá, as aulas virtuais estão sendo encaradas com naturalidade. “Eles sentam sozinhos, em frente ao computador, e costumam entrar antes na sala de aula para conversar com os amigos”, observa o pai. Larissa relata que, no início, o processo era mais complicado. As crianças precisavam de suporte para fazer a conexão e assistir às aulas. A mãe afirma que, agora, eles parecem estar até mais concentrados e focados do que no formato presencial.
Convívio
Se por um lado as aulas online estão conseguindo suprir parcialmente o conteúdo educativo, a questão da sociabilidade foi bastante prejudicada com o novo modelo. A arquiteta Jerusa Horst, mãe da Giovana, 12 anos, e da Beatriz, 9 anos, conta que para as meninas a grande dificuldade foi estar longe dos professores e dos colegas.
Jerusa diz que um ponto positivo que ficará do ensino remoto é a busca ativa do conteúdo pelos estudantes. A arquiteta diz estar impressionada com a evolução das filhas com a tecnologia. Além de digitar com rapidez, Giovana e Beatriz aprenderam a usar programas de edição e montagem de apresentações.
Waleska Pacheco destaca que, apesar das evoluções no ensino remoto, o que é ofertado hoje é o mesmo cenário presencial, só que online. O ensino híbrido, segundo ela, precisa ser acompanhado da interdisciplinaridade e, para o sucesso dessa metodologia, é fundamental a capacitação em competências digitais para os gestores, docentes e alunos. “Antes, falávamos que o ensino híbrido ainda levaria dez anos para chegar ao Brasil. Talvez por isso tivemos pouquíssima evolução na área. Mas, com a pandemia, em seis meses tivemos que nos adequar a essa realidade”, completa.
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