Além de mais segurança e fluidez nos deslocamentos, a inclusão de tecnologias de pagamento digital traz mais conveniência e facilidade para os passageiros, ajustando o transporte público à realidade do país
De 2021 para 2022, o total de pagamentos com cartão de crédito via aproximação saltou 187%, de acordo com a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs). O crescimento no valor foi de R$ 198,9 bilhões de transações para R$ 572,4 bilhões.
Na prática, é como se os brasileiros tivessem realizado 30 milhões de pagamentos por aproximação por dia em 2022. O Brasil também deve ser um dos principais responsáveis pela expansão do uso de QR Code nos pagamentos.
Isso é uma consequência do Pix, que se tornou o meio de pagamento mais comum no país, com 20,3 bilhões de transações registradas em 2022. Estimativa da Juniper Research aponta que os usuários que realizam pagamentos via QR Code devem alcançar 2,2 bilhões em 2025 em todo o globo.
O transporte coletivo, por óbvio, não fica fora deste movimento rumo às tecnologias de pagamento digital. “Na prática, a transformação digital é um grande movimento de autoatendimento”, explica o diretor de Produto da Transdata, empresa de tecnologia especializada em gestão para transporte público, Rafael Teles.
“Todo este processo foi acontecendo no sentido de dar ao próprio usuário aquilo que ele precisa. Antes, era uma máquina, um site, um aplicativo e agora a transferência eletrônica de fundos em tempo real. Um passo é a continuidade natural do anterior”, ressalta.
A necessidade de oferecer mais conveniência ao passageiro
Um dos principais propósitos é oferecer conforto e conveniência ao passageiro, já que o transporte público não dá liberdade de itinerário e da escala de horários.
Em um país de dimensões continentais como o Brasil, o desafio das empresas que operam o transporte coletivo é entender o comportamento do usuário e garantir que todos sejam beneficiados pelo pagamento digital.
Para que não haja um conflito de cultura e de gerações, as empresas precisam considerar o pagamento digital de forma ampla. De um lado, haverá aqueles que optam pelo smartphone e aplicativo ou cartão via aproximação, sobretudo as gerações mais jovens. Por outro lado, há um grupo de pessoas que opta pelo cartão-transporte por inúmeros fatores, inclusive a segurança e a preferência por não usar o celular.
“Existem vários ‘países’ dentro do Brasil, com comportamentos diferentes em cada local. Há cidades que, em poucas semanas, atingem 10% do pagamento com cartão de crédito. Em outras, porém, não chega a 3%”, revela Teles.
O diretor de produto da Transdata cita que, em Londres, após a liberação do pagamento via aproximação de cartão de crédito, muitos passageiros ainda optavam pelo uso do cartão-transporte. A razão? “Facilitava o controle de gastos com o transporte público, além de ter a possibilidade de recuperar o recurso no caso de perda”, diz.
Sob a perspectiva das empresas, a retirada do pagamento em dinheiro elimina os custos de segurança e de transporte de valores. No entanto, acrescenta despesas e camadas operacionais em razão da necessidade de relacionamento com adquirentes de crédito, gateways de pagamento e compra de novos dispositivos.
A empresa de transporte também se beneficia com o aumento da previsibilidade de recebimentos. “Companhias e passageiros que usam o vale-transporte, por exemplo, permitem estimar uma demanda mínima para aquele mês, sem contar, é claro, o aumento da segurança e da velocidade do embarque, pois facilita todos os processos dentro do ônibus”, cita.
Mais investimentos
O investimento em estrutura para garantir o pagamento digital via aproximação e QR Code significa uma mudança de interface para os operadores do transporte coletivo, incluindo a retirada de etapas analógicas do processo decorrentes da evolução da tecnologia.
“Antes, o pagamento era realizado em dinheiro ou vale-transporte, o que, aos poucos, está sendo substituído pelo smartphone ou cartão”, esclarece Teles.
A aplicação de recursos nesta área está em linha com as perspectivas da Associação Nacional dos Transportes Públicos (ANTP). Em um documento divulgado em 2022, a empresa trata da qualidade do serviço incluindo melhorias de bilhetagem, que sejam “capazes de operar com rapidez e segurança diferentes meios de pagamento”.
Nem sempre, porém, estes recursos estão previstos nas licitações de transporte. Estes contratos costumam ser pouco flexíveis, impedindo ou dificultando a adoção de novas tecnologias e, em boa parte dos casos, não contemplam o investimento necessário para sua adoção, mesmo que tragam vantagens e melhorias para todos os envolvidos.
E o dinheiro físico?
Para muitos, ao vetar o uso do dinheiro físico, o transporte coletivo estaria excluindo algumas pessoas e interferindo em sua lógica de Direito Social. Teles compara o ônibus e o cinema para mostrar que não há restrição ao uso do dinheiro.
“Se você vai ao cinema, é necessário ir à bilheteria e comprar o ingresso antes. A mesma lógica se aplica ao transporte coletivo. É preciso pagar de forma antecipada apenas”, resume.