Se os sistemas de transporte público estão enfrentando dificuldades nos últimos anos, qual seria a solução? Uma das discussões que envolve os operadores do segmento é a mudança no formato de remuneração das empresas. Conforme o Idec, em uma análise da forma adotada por cidades do país, o modelo predominante é o por passageiro transportado, com exceção de São Paulo, que prevê a transição para a remuneração para o custo do serviço – também conhecido por quilômetro rodado.
“Tradicionalmente, existem duas formas de remunerar o transporte público: custo mensal, também chamado de quilômetro rodado, ou tarifa paga pelos passageiros”, explica o CEO da Metrocard, Ayrton Amaral Filho. “Como não se trata de um transporte sob demanda e precisa estar disponível para a população 20 horas por dia (tenha passageiros ou não), não há como remunerar a operação diretamente pelos passageiros”, ressalta.
O histórico do transporte coletivo no Brasil mostra a necessidade de mudar a sua forma de financiamento, o que é também determinante para o seu futuro. No formato de remuneração atual, a queda de passageiros reduz o volume de recursos no sistema, o que leva ao aumento da tarifa e consequente redução do número de usuários transportados. Trata-se de um círculo vicioso.
Entre 2013 e 2019, houve diminuição de 381,1 milhões de passageiros transportados para 280,9 milhões entre os transportes coletivos do Brasil, segundo o anuário da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) de 2019 – período pré-pandemia. Esta queda apenas segue uma tendência das últimas décadas: de 1993 a 2017, a redução de usuários nos ônibus foi de 35,6%.
Solucionando um erro conceitual
Conforme Amaral, um dos motivos para essa redução está em um erro conceitual do transporte público no Brasil: cobrar a tarifa exclusivamente dos passageiros. Uma mudança no modelo significaria que o transporte estaria sendo usado como instrumento de política social. “O transporte público é um serviço do estado, social. O modelo de custo mensal ou quilômetro rodado gera benefícios para todas as partes envolvidas”, avalia Amaral.
De acordo com o CEO da Metrocard, o governo ganha previsibilidade orçamentária, pois “define o nível de serviço que quer prestar e sabe quanto vai custar anualizado”, como ocorre com saúde, segurança e educação. “Para as empresas, há segurança em contar com uma remuneração garantida. E, para os passageiros, existem dois benefícios: terá oferta melhor, com mais ônibus e mais frequência, e a redução da tarifa”, ressalta.
Para o Idec, a troca de modelo contribui para a qualidade do serviço prestado. “Este modelo, quando associado com capacidade de regulação e fiscalização, pode contribuir com a redução da lotação dos veículos, pois desvincula o quanto a empresa irá receber da quantidade de passageiros transportados”, diz a entidade. Este formato depende, porém, da intervenção do poder público, com o aporte de subsídio, a exemplo do que acontece nos países europeus.
O papel do poder público
O formato de remuneração dos empresários está diretamente relacionado aos contratos firmados. As licitações selecionam empresas que vão operar os serviços conforme os parâmetros estabelecidos pelo próprio poder público. “Quem define e fiscaliza os níveis de serviço é o governo. Se está faltando ônibus, é porque o governo não definiu um nível de serviço maior”, diz Amaral.
Além do custo, outro foco do transporte público deve ser o ganho de velocidade. “Os ônibus precisam ter velocidade operacional – sair de 15 para 30 km/h. Isso é possível não só no subterrâneo (metrô), mas na superfície, com a implantação de canaletas, vias exclusivas e prioridade semafórica, com paradas organizadas”, analisa o CEO da Metrocard.
Na avaliação dele, tempo e qualidade são aspectos mais importantes para um transporte público ser considerado em seu uso. “Se der velocidade para o sistema, começa a ficar interessante. Se eu chegar mais rápido do que de transporte individual, há um benefício para a população. Além disso, as pessoas precisam ter conforto. Em distâncias mais longas, elas devem viajar sentadas, o que não precisa ser uma prioridade nos deslocamentos mais curtos”, diz.