Médicas e profissionais da saúde se reuniram na noite da última segunda-feira (24), na sede da Gazeta do Povo, em Curitiba, para a segunda edição do “Elas por Elas – Cuidando de quem cuida”. Voltado especialmente para médicas e outras profissionais da área da saúde, o evento foi idealizado pela oncologista Maria Cristina Figueroa Magalhães, com apoio do Instituto Intes.
A iniciativa integra uma das frentes do projeto “Nós por Elas”, cujo objetivo é promover informação, acolhimento e protagonismo feminino no enfrentamento dos tumores femininos. Para tanto é necessário cuidar de todos os elos - deste a escuta das pacientes, passando pelo cuidado daqueles que cuidam até a promoção de ações efetivas para atuar nos gargalos da jornada de enfrentamento ao câncer. Afinal, somos todos responsáveis por melhorias na jornada do câncer, por elas.
Maria Cristina contou que o evento nasceu de uma dor pessoal e recorrente na rotina clínica. “É muito comum receber pacientes oncológicos fragilizados ao se depararem com a falta de preparo da sociedade e, até mesmo de profissionais de saúde não oncologistas, ao atender uma pessoa com o histórico de câncer”, afirmou.
A oncologista relatou que esse encontro com médicas e profissionais de saúde é o início de todo o projeto – que teve uma edição anterior em março de 2023 –, que agora se consolida como um espaço de escuta, sensibilização e transformação.
O encontro também abriu espaço para discussões sobre saúde sexual, autoestima, saúde cardiovascular na mulher, direito à saúde, formas de prevenção às neoplasias e o atendimento multidisciplinar às pacientes com câncer. Também foi debatido como é fundamental que os médicos sejam promotores de saúde e exemplos de estilo de vida saudável para os pacientes.
Para a médica ginecologista e sexóloga Anna Carolina Petry, o cuidado com a sexualidade é essencial para o bem-estar da mulher moderna, uma forma inclusive de evitar outras doenças. “Hoje, a mulher é protagonista do seu próprio cuidado. Ela trabalha, sustenta a família, conhece seus desejos e necessidades e, justamente por isso, precisa de mais acolhimento”, destacou.
Entre as participantes, a médica endocrinologista Josiane Detsch trouxe uma perspectiva tocante ao compartilhar sua vivência como profissional e, também, como paciente que enfrentou um câncer de mama. “Esse evento é incrível porque promove uma troca real. Mostra a nossa vulnerabilidade e a vida como ela é: de mulheres que acumulam funções, acreditam que vão dar conta de tudo e, de repente, se veem doentes. Mas o adoecimento, muitas vezes, também pode ser uma oportunidade de transformação”, afirmou. Josiane destacou a importância de olhar para a saúde de forma integral, abordando desde o equilíbrio hormonal até aspectos emocionais e espirituais que, segundo ela, são fundamentais para o bem-estar da mulher.
A advogada Tatiane Viese, especialista em direito da saúde, chamou a atenção para os desafios jurídicos que afetam o acesso a tratamentos e medicamentos. Desconhecimento, desinformação com relação aos direitos dos pacientes e atualizações constantes na lei costumam tumultuar o acesso ao tratamento. “Cada paciente é uma história e exige uma estratégia diferente. É importante acreditar que é possível”, enfatizou.
Já a cardiologista Sarah Fagundes Grobe abordou os riscos cardiovasculares específicos das mulheres, muitas vezes ignorados. Baseada em dados da Sociedade Brasileira de Cardiologia, a médica alertou que, atualmente, a cada 12 minutos, duas brasileiras morrem em decorrência de doença cardiovascular, número maior do que as vítimas de câncer de mama e útero.
O problema, segundo a cardiologista, está no fato de muitos profissionais ignorarem os fatores de risco específicos entre a população feminina – caso de menopausa prematura, doenças autoimunes, distúrbios hipertensivos na gravidez, entre outros – ou ainda nos fatores de risco sub-reconhecidos – baixa educação em saúde, depressão e ansiedade, etc. “A fase do climatério é um momento-chave. É quando o risco de hipertensão, obesidade e infarto aumenta significativamente. Precisamos olhar para isso com seriedade e pensar na saúde da mulher de forma integrada, individualizada e preventiva”, pontuou.
O encontro reforçou dados preocupantes sobre a saúde mental das médicas. A psiquiatra Helen Tadini salientou que questões como a sobrecarga emocional, a jornada tripla de trabalho e a pressão constante são fatores que contribuem para o adoecimento silencioso de quem está na linha de frente do cuidado.
De acordo com a idealizadora do Elas por Elas, o objetivo agora é expandir o movimento para outros estados e, futuramente, alcançar também outros países da América Latina. “Queremos criar um ecossistema de apoio para que essas mulheres sejam cuidadas com o mesmo carinho e atenção que dedicam aos outros todos os dias”, conclui Maria Cristina.
Dr.ᵃ Maria Cristina encerrou o encontro com a seguinte mensagem: “Cuidar de quem cuida é reconhecer que profissionais da saúde também carregam dores, dúvidas e exaustões. Valorizar esse cuidado é garantir que esses profissionais tenham espaço para se fortalecer emocionalmente, manter a empatia e seguir oferecendo um cuidado verdadeiramente humano. Quando olhamos com atenção para quem está na linha de frente, construímos um sistema de saúde mais equilibrado, sensível e sustentável.”