No ano passado, o lockdown realizado pelas autoridades trouxe cenas de cinema para muitas cidades: em seus centros, onde milhões de pessoas caminhavam normalmente e os carros estavam por todos os lados, não havia (quase) ninguém. O reflexo não se deu só na economia, mas também no meio ambiente: seis cidades – Wuhan, Hong Kong, Kyoto, Milão, Seul e Xangai que decretaram estado de emergência no início de 2020 – tiveram 40% de redução na poluição do ar, segundo estudo da Universidade de Toronto.
Em muitos locais, paisagens que não eram mais observadas devido à poluição conseguiram ser vistas novamente. E esses benefícios também foram sentidos no Brasil: a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo apontou redução de 50% no monóxido de carbono e óxidos de nitrogênio durante a quarentena mais restrita implantada no ano passado. Por óbvio, o isolamento social não é a solução deste problema, mas mostra o impacto do uso de veículos individuais nas cidades.
“A atitude de um cidadão pode não parecer nada, mas devemos levar em consideração a coletividade como um todo”, afirma o professor e pesquisador do programa de mestrado e doutorado em Gestão Urbana da PUC-PR Carlos Hardt. O professor cita uma pesquisa realizada para compreender o volume de partículas de borracha que deixaram de correr pela atmosfera de Curitiba: por dia, é como se 4,57 caminhões caçamba cheios de borracha fossem jogados por dia no ar – cerca de 1.667 por ano.
De acordo com o professor, pensar em uma mobilidade sustentável é benéfico sob inúmeros pontos de vista: ambiental (com a redução da poluição e das chamadas ilhas de calor), social (com a queda de acidentes), saúde (diminuição de internações pelos traumas decorrentes do trânsito e problemas respiratórios) e comportamentais (menos estresse e uma forma diferente de observar a cidade).
“Não sou apenas eu, como cidadão, que vou precisar de menos médicos. Quando isso acontece, o município, o estado e o poder federal gastam menos, e eu vivo melhor. Ao mesmo tempo em que reduzo a poluição causada pelos veículos, com queima de combustível e desgaste de pneus, há a economia e menos pressão para os serviços públicos, além de bem-estar pessoal”, diz o professor.
Os impactos da poluição do ar
De acordo com o World Resources Institute (WRI), a poluição do ar nas cidades tem, ao menos, cinco impactos distintos para a sociedade:
Saúde – Estima-se que entre 5 a 9 milhões de pessoas tenham seus quadros de saúde agravados todos os anos, contribuindo para mortes prematuras. É também uma das causas de doenças respiratórias e alergias.
Produção de alimentos – Enquanto a agricultura tenta se tornar mais eficiente, a qualidade do ar pode reduzir o rendimento de culturas entre 6 e 12%.
Florestas – As emissões de nitrogênio e enxofre afetam as florestas e a saúde da vegetação.
Volume de água – A poluição modifica os padrões de precipitação de chuva e enfraquece as monções (ventos sazonais que podem contribuir para estações chuvosas ou secas).
Clima – Ao reduzir a poluição, é possível diminuir em 0,6 graus o aquecimento estimado da atmosfera até 2050, desacelerar em dois terços o aquecimento do ártico e diminuir as ilhas de calor urbanas. “Em Curitiba, do centro da cidade até o centro politécnico, já chegou a se medir 5 graus de diferença devido às ilhas de calor”, conta Hardt.
Dicas para uma mobilidade sustentável
Valorize a mobilidade ativa – Em 2020, o mercado de bicicletas teve aumento de 50% na comparação com 2019, de acordo com levantamento da Associação Brasileira do Setor de Bicicletas. Parte da explicação está na pandemia, que fez com que muitas pessoas valorizassem a mobilidade sustentável e ativa. “Se deslocar a pé ou de bicicleta transforma a visão sobre a cidade”, diz Hardt.
Evite os grandes deslocamentos – Procure suprir as suas necessidades em serviços e comércios próximos de sua residência – de preferência, se possível, pela mobilidade sustentável. Ao evitar os grandes deslocamentos, diminui-se a necessidade de combustível, o desgaste de borracha e há incentivo ao comércio local.
Deixe o carro em casa – A pandemia coloca um estigma sobre o transporte coletivo devido às aglomerações, mas, em termos de sustentabilidade, a escolha por este modal em detrimento do veículo individual é fundamental. Se possível, crie grupos de caronas, caso opte por usar o seu veículo. “O transporte coletivo é a única saída. Não tenho dúvida em afirmar que o transporte coletivo integrado é a saída de mobilidade para as grandes metrópoles”, diz.
Observe o seu comportamento como condutor – Se você prefere usar o carro, procure ter um comportamento mais cauteloso, o que reflete em menos desgaste de borracha, menos consumo de combustível e menos energia pessoal desperdiçada.
Permita-se ter um novo olhar sobre a cidade – Quando andamos de carro, conhecemos a cidade por um único ponto de vista. Ao caminhar e usar a bicicleta, ganha-se uma nova perspectiva sobre a cidade e cria-se uma nova relação com ela. “As ruas podem voltar a ser pontos de encontro, pois se tornaram apenas um espaço de circulação”, diz Hardt.
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