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Uma dissertação de mestrado em Direito segundo a qual o agronegócio condena o Brasil ao subdesenvolvimento (por culpa do capitalismo). Uma tese de doutorado em Linguística que denuncia o "golpe" que derrubou Dilma Rousseff do poder em 2016. Uma dissertação de mestrado em Arquitetura que fala em “binariedade” de gênero e no simbolismo da “saída do armário”. A elite acadêmica brasileira tem produzido teses curiosas.
Uma reportagem da Gazeta do Povo já demonstrou que Karl Marx, Michel Foucault e Paulo Freire são os autores mais citados por mestrandos e doutorandos brasileiros.
O levantamento usou a ferramenta Pinpoint, em parceria com o Google, para identificar alguns exemplos peculiares da produção acadêmica recente. Ao todo, a reportagem analisou a íntegra de 7.000 teses e dissertações: 5.000 produzidas em 2023 e 2.000 em 2022.
Agora, em uma análise ainda mais detalhada, separamos 20 dissertações de mestrado e teses de doutorado que se destacam pelo caráter inusitado. Na melhor das hipóteses.
Para ler a íntegra de cada trabalho, basta clicar no título. Aviso: alguns trechos têm linguajar chulo.
Curso: Mestrado em Educação
Instituição de Ensino: Universidade Federal Fluminense (UFF)
Autora: Danielle Ferreira Bastos
Trecho: “Contudo, os apontamentos de Freud, universais e atemporais, cuja sexualidade humana é a trama que reinventada e respeitosa ao mundo interno do sujeito, reapropria a criança que Freud já trazia como 'viada' e que a todo custo a sociedade tenta ‘desviadizar.’”
Curso: Mestrado em Direito
Instituição de Ensino: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas)
Autora: Alessandra Alvares Bueno Da Rosa
Trecho: “Pena não educa – é castigo não-pedagógico, fruto de uma herança religiosa, compondo a ralé estrutural do sistema prisional marcado pela desigualdade da sociedade periférica. O controle sobre as massas é feito por meio das prisões. A alternativa contra esse dispositivo do capitalismo contemporâneo é despolitizar o delito, descentralizar a punição. Não é o arbítrio e tampouco a luta por um caos. A origem da prisão não é jurídica, é um instrumento de controle da sociedade capitalista.”
Curso: Doutorado em Comunicação
Instituição de Ensino: Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
Autora: Sindia Cristina Martins dos Santos
Trecho: “A partir desses agenciamentos teóricos, surge a noção de estado bruxólico como um corpo-existência que se constitui diante de acontecimentos fomentadores de um determinado imaginário ligado à mulher — infanticídio, mitologemas sobre o útero como animal que caminha no interior do corpo feminino, a capacidade de lidar com o caos, o dispêndio etc.”
Curso: Mestrado em Políticas Públicas
Instituição de Ensino: Universidade Federal do Piauí (UFPI)
Autora: Luara Dias Silva
Trecho: “Na sociedade capitalista em que vivemos o acesso ao mercado de trabalho é o principal meio de subsistência das classes populares, de todos aqueles que não detém o capital, para as mulheres estar nesses espaços de trabalho foi um processo de conquista ao logo dos anos, porque o capitalismo se sustenta em bases racistas, patriarcais, classistas e LGBTfóbicas com a lógica que rege a heterocisnoma.”
Curso: Mestrado em Filosofia
Instituição de Ensino: Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Autor: Cello Latini Pfeil
Trecho: “Corpos que fogem às regras da colonialidade patriarcal branca, em relação a gênero e sexualidade, são sistematicamente excluídos dos espaços de produção de conhecimento e da possibilidade de empregabilidade. Essa é a expressão da colonialidade cisgênera e das ciscolonialidades. As ciscolonialidades seriam, então, em nossa interpretação, originárias da colonialidade cisgênera, tal como opressões patriarcais contra corpos considerados femininos seriam originárias da colonialidade de gênero.”
6. Boate Chantecler: a representação da ascensão e do declínio nos espaços de prazer do Recife (1939-1984)
Curso: Mestrado em História
Instituição de Ensino: Universidade Federal Fluminense (UFF)
Autora: Olivia Tereza Pinheiro de Siqueira
Trecho: “O maior arcabouço teórico desse trabalho está pautado nas teorias feministas, buscando abranger pelo menos três vertentes: o feminismo eurocêntrico, o feminismo decolonial e o p*tafeminismo."
7. As aberturas políticas a partir das fraturas: Caminhos para desempedrarmos nossos corações numa América Latina atravessada pela modernidade e pelo neoliberalismo
Curso: Mestrado em Relações Internacionais
Instituição de Ensino: Pontifícia Universidade Católica (PUC Rio)
Autor:João Pedro Barbosa Marins
Trecho: “Nesse sentido, resgatar o pensamento de outras culturas que habitam a América Latina pode nos ajudar a seguir nesta direção. Um exemplo dessas contribuições é a partir de um entendimento da cultura Tsetal, que busca um desempedrar desses corações que foram tão endurecidos pelo individualismo da racionalidade neoliberal ou pela predatória relação com a natureza e com todos os seres que a modernidade encarna, juntamente com seu projeto de legitimar só um tipo de sociedade, aquela considerada moderna.”
Curso: Doutorado em Letras
Instituição de Ensino: Universidade Federal do Pará (UFPA)
Autora: Julie Christie Damasceno Leal
Trecho: “Se para o cristianismo o corpo humano é algo imperfeito, pecaminoso, falho e perecível, o corpo feminino por sua vez é visto como algo ainda mais depreciável. Cada religião estabelece para seus seguidores um conjunto de normas que devem ser seguidos sem qualquer questionamento: os dogmas.”
Curso: Mestrado em Linguística Aplicada
Instituição de Ensino: Universidade Estadual do Ceará (UECE)
Autor: Francisco Djefrey Simplicio Pereira
Trecho: “O trabalho é oportuno, visto que a narrativa democrática fascista-liberal, nos termos de Boaventura (2010), do MBL tem conseguido “reunir partidos de espectros políticos diversos”, cooptando parte da esquerda e centro-esquerda brasileiras (PEREIRA, 2021, p.1), na tentativa de morte e ressurreição antecipada de um representante político para a disputa da presidência de 2022.”
Curso: Doutorado em Psicologia
Instituição de Ensino: Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Autor: Antonio Leonardo Figueiredo Calou
Trecho: “A c*ceta é um termo criado para fazer referência a um sexo que se aproxima da b*ceta (vagina), mas que não é ela, talvez uma forma maquiada dela. Por um lado, é uma tentativa edipianizante e falocêntrica, pois uma vez que aproxima o c* de objetos sexuais que tem sentidos determinados e fixos de se exercer e funcionar, ela o faz requerendo um lugar social, um lugar de poder para ela, que de certa forma já dita o que nela pode entrar e para quem ela servirá. A c*ceta desinveste o c* de seu aspecto democrático e libertário, impedindo seus fluxos experimentativos e desviantes, lhes dirigindo a produção de um outro objeto com um conjunto de normas e estruturas.”
Curso: Doutorado em Linguística e Literatura
Instituição de Ensino: Universidade Federal de Alagoas (UFAL)
Autora: Simone Natividade Santos
Trecho: “O golpe de Estado deu abertura para que instituísse o governo provisório de Michel Temer desencadeando em reformas de cunho educacional, trabalhista e previdenciário que eliminaram direitos importantes que foram alcançados após a redemocratização do país com a Constituição Federal de 1988. O seu programa: 'Uma ponte para o futuro', na verdade, mostrava o seu intento regressivo, em que direitos foram esfacelados principalmente para a classe dominada.”
Curso: Doutorado em Comunicação
Instituição de Ensino: Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Autor: Mario Augusto Oliveira Monteiro Rolim
Trecho: “Do lado do regime hardcore, o sexo e a sedução apareciam em performances que costuma(va)m trazer as mulheres como objetos a serem dominados ou ostentados, algo que também acontecia no regime de baile, mas com um comprometimento maior com uma postura vertical e rígida do corpo, mais recusa à “dança” e à exposição do c*, e(talvez) mais misoginia.”
Curso: Mestrado em Linguística Aplicada
Instituição de Ensino: Universidade Estadual do Ceará (UECE)
Autora: Ana Malba Araujo de Queiroz
Trecho: “Como objetos para o deleite masculino, fomos impedidas de compreender o nosso corpo, de vivenciar nosso potencial orgástico, como anuncia a minha poema: 'Sua boca fica melhor chupando/ E eu fico melhor gozando!'”
Curso: Mestrado em Ciências Econômicas
Instituição de Ensino: Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
Autor: Willian Thompson Silva Gomes
Trecho: “Vimos que com os recursos computacionais atuais e outras tecnologias não existentes durante a Guerra-Fria é possível pensar numa alternativa econômica, contrária ao capitalismo, necessária para resolver os problemas que a humanidade vai ter que encarar durante este século e o próximo. Para esta pesquisa foram utilizados livros e artigos acadêmicos relevantes ao trabalho, utilizando essencialmente o arcabouço de conhecimento econômico marxista.”
Curso: Mestrado em Direito
Instituição de Ensino: Unversidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Autor: Thiago Cesar Carvalho dos Santos
Trecho: “O objetivo deste trabalho é compreender os processos para a feitura de um corpo queer, ou apontar os caminhos possíveis para ativação dessa queeridade. Nesse sentido, foi importante compreender os modos de produção dos corpos-sujeitos operados pelo funcionamento da máquina bipolar capitalista, para então pensar e experimentar estratégias, não só de resistência, mas de destituição desse regime.”
Curso: Mestrado em Direito
Instituição de Ensino: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Autor: Antonio Lopes de Almeida
Trecho: “Minha escrita e meus escritos — sei que é injusto dizer que são meus, porque vivo roubando-lhes do dia a dia das pessoas acadêmicas e não acadêmicas — partem mais de coisas heterodoxas e periféricas que observo nas faculdades de Direito, nas conversas de mesa de bar e na vigilância das redes sociais do que das bibliotecas, das trocas de e-mails com pesquisadoras ou dos eventos acadêmicos. Por essa via, não acredito que esteja sendo incoerente com o que escrevi, mas mantenho a consciência de que venho de baixo e pretendo permanecer embaixo com os tipos marginais e sem relevância à primeira vista. Nessa linha, a fofoca é o melhor caminho ou méthodos para experenciar e narrar a marginalidade.”
Curso: Mestrado em Direito
Instituição de Ensino: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Autora: Yasmin Silveira Martins
Trecho: “É imprescindível a compreensão de que o agronegócio fomenta o subdesenvolvimento do Brasil, ao contrário do desenvolvimento que o setor e seus ideólogos/patrocinadores garantem. Destaca-se que isso ocorre justamente para viabilizar a acumulação de capitais por parte dos gigantes proprietários do setor agropecuário. E o que permite tal acumulação é, necessariamente, o próprio desenvolvimento do modo de produção capitalista, que em sua dinâmica evolutiva forjou o desenvolvimento de determinados países às expensas do desenvolvimento de outros.”
Curso: Mestrado em Direito
Instituição de Ensino: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas)
Autora: Ana Maria Meinberg de Moraes
Trecho:“O discurso religioso segue presente no Brasil (e no mundo) e demonstra força na esfera política e legislativa. O extremismo religioso pode agravar, ainda mais, a situação da mulher como ser detentor de direitos e liberdades individuais, ao utilizar o discurso da mulher como fonte de pecado, agravado pelo discurso de assassinato de um ser humano (feto), que é sagrado.”
Curso: Mestrado em Direito
Instituição de Ensino: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas)
Autora: Livia Scopel Ribeiro Dini
Trecho: “A monogamia é tão somente a estrutura de um tipo de família, a matrimonial, introduzida no ordenamento pelo colonizador como instrumento de manutenção de seus próprios valores. Ao lado da família matrimonial, existem tantas outras que também são públicas, ostensivas e formada por laços de afetividade, sendo, portanto, merecedoras da tutela estatal.”
Autor: Daniela de Oliveira Faria
Curso: Mestrado em Arquitetura e Urbanismo
Instituição de Ensino: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Trecho: “Mobilizo o armário-objeto para desconstruir o armário-simbólico e as dicotomias que o cercam, mostrando que essa analogia, que é fundante para o pensamento sobre a sexualidade, é limitada, colonial e binariamente opressora. O armário não passa de um delimitador contraditório e paradoxal entre dentro e fora, entre segredo e revelação, entre homossexual e heterossexual, e entre o que está aparente ou escondido.”