Seja na ilha ou no exílio, Cuba continua produzindo ótimos escritores. A revolução cubana teve seu papel ao contribuir com o aumento dos níveis de educação e erradicação do analfabetismo, mas também ao dar motivos para que seus cidadãos, sufocados pela falta de liberdade de expressão, sentissem a necessidade de contar ao mundo suas histórias e opiniões, sem serem censurados.
É o caso dos autores das obras que selecionamos para esta lista. Exilados como Reinaldo Arenas e Guillermo Cabrera Infante são nomes importantíssimos da literatura cubana pós-revolução. Já Leonardo Padura, Juan Pedro Gutiérrez e Wendy Guerra escolheram continuar no país onde nasceram e ganharam destaque internacional nos últimos anos relatando, em suas obras, suas percepções sobre a vida na ilha.
Os outros dois escritores aqui listados são pouco conhecidos no Brasil e suas obras não foram publicadas por aqui. No entanto vale a pena gastar o espanhol (ou inglês) para lê-las: os contos de Nancy Alonso são uma comédia cotidiana dos problemas na Cuba dos anos 2000 e o relato intenso de Huber Matos, que já foi aliado próximo a Fidel Castro, expõem, sob seu ponto de vista, as feridas do regime socialista e de seus líderes.
O Homem que Amava os Cachorros
Autor: Leonardo Padura
Editora: Boitempo
Qual é a história/tema do livro: Iván é um cubano que, por circunstâncias da vida, desistiu do sonho de ser escritor, mas na década de 1970 encontra um homem que passa a lhe contar detalhes da vida de Ramón Mercader, o assassino de Leon Trotski. Conforme Iván vai nos levando pelas histórias contadas pelo homem que amava os cachorros, o personagem também relata seus dramas pessoais e da sociedade cubana, que vão desde a empolgação com a revolução liderada por Fidel em 1959 até a desilusão de uma vida cheia de amarguras, pobreza e sofrimento.
Por que é importante ler: A leitura de “O Homem que Amava os Cachorros” se justifica pelo simples fato de ser o best seller do escritor cubano mais celebrado da atualidade. Se trata de um romance com personagens reais e fictícios, mas que não deixa de lado a realidade dos fatos da ilha onde o autor vive, dando a impressão que Iván poderia também, assim como Trótski e Mercader, ser um sujeito de carne e osso.
Antes que Anoiteça (Antes que anochezca/Before Night Falls)
Autor: Reinaldo Arenas
Editora: Best Seller
Qual é a história: ‘Antes que Anoiteça’ é um livro autobiográfico que Arenas começou a escrever quando ainda era fugitivo na ilha controlada por Fidel Castro, mas que só foi concluído quando já estava no exílio, em Nova Iorque. Sua história começa a ser contada quando ainda era pequeno e morava em uma área rural com sua mãe e seus parentes maternos. Ainda nessa época ele descobriu sua homossexualidade. A pobreza extrema em que vivia o motivou, mais tarde, a se juntar aos revolucionários liderados por Fidel Castro, mas percebendo a ausência da liberdade de expressão e a perseguição aos gays e a todos que discordassem dos ideais da revolução socialista, Arenas se afastou do regime e se tornou um “contrarrevolucionário”. Por seus escritos e por ser homossexual foi preso, torturado e humilhado. Sem outras opções, deixou o país em 1980 junto com milhares de pessoas consideradas “não-desejadas” em solo cubano.
Por que é importante ler: Nesta autobiografia, Arenas denuncia os horrores cometidos pela ditadura castrista, como as UMAP (Unidades Militares de Ajuda à Produção), campos de trabalho forçado para onde eram enviados dissidentes do regime e gays, e as terríveis condições com que eram tratados os homossexuais nas cadeias.
Mea Cuba
Autor: Guillermo Cabrera Infante
Editora: Companhia das Letras
Qual é a história: O livro é uma compilação dos escritos de Cabrera Infante sobre a política cubana. Opositor ferrenho do regime castrista, o autor, exilado na Inglaterra, acreditava que falar sobre os problemas de Cuba é mais uma questão ética do que política. Alguns dos seus textos abordam as dificuldades financeiras dos cidadãos cubanos, outros criticam a repressão aos intelectuais que não seguem a cartilha do Estado, a falta de liberdade de imprensa, a perseguição aos homossexuais, inclusive a Reinaldo Arenas.
Por que é importante ler: Cabrera Infante é um dos escritores mais reconhecidos de Cuba, e, apesar disso, nunca foi publicado no país onde nasceu. Mea Cuba, além das críticas ao regime ditatorial dos Castro, também aborda o efeito da revolução cubana na literatura do país.
Nunca fui primeira-dama
Autora: Wendy Guerra
Editora: Benvirá
Qual é a história: Nadia Guerra, narradora desta história, foi abandonada pela mãe, Albis Torres, quando tinha 10 anos. Obcecada por reencontrá-la, descobre a mãe em Moscou sofrendo de uma doença que a deixou desmemoriada. Nadia retorna para Cuba com Albis e acha em seus pertences manuscritos de um romance sobre a heroína da revolução cubana e secretária de Fidel Castro, Celia Sanchez, o qual nunca conseguiu publicar. A partir daí o livro nos conta, misturando realidade e ficção, a vida dessas três personagens femininas esquecidas na história.
Por que é importante ler: O livro conta a história de Celia Sanchez e sua contraditória relação com Fidel Castro (seriam eles amantes?). Wendy Guerra se coloca no papel de sua personagem para dar vida ao romance antes censurado. Como pano de fundo, o tom político de crítica à ditadura cubana nos eventos cotidianos. O livro foi traduzido em oito idiomas, mas não chegou a ser publicado em Cuba por causa da censura — aliás, nenhum de seus romances foi. A autora é um dos destaques da literatura cubana atual. O seu livro mais recente, “Domingo de Revolución”, que ainda não foi lançado no Brasil, é ainda mais crítico em relação ao regime castrista e aborda a temática da censura na ilha.
Fabián e o Caos
Autor: Pedro Juan Gutierrez
Editora: Alfaguara/Objetiva
Qual é a história: O romance conta a história de dois jovens na Cuba de 1960 e 1970 que se conheceram ainda na escola. Juan Pedro é um jovem másculo, sedutor, libertino. Fabián é o oposto: tímido, fraco, assustado e homossexual. Apesar disso, uma semelhança entre eles faz com que se reencontrem anos depois: seus comportamentos não eram tolerados na nova sociedade revolucionária, e eles acabam tendo que trabalhar em uma fábrica de enlatados em condições precárias onde trabalham os cidadãos menos exemplares.
Por que é importante ler: Juan Pedro Gutiérrez é um aclamado escritor cubano. Sua linguagem peculiar e visceral fez com que seu primeiro romance publicado “Trilogia Suja de Havana” ganhasse reconhecimento internacional. Fabián e o Caos, lançado no Brasil no ano passado, é uma autobiografia romanceada. A história do personagem que dá nome ao livro é baseada na vida de seu amigo Fabio Hernandez, a quem dedica a obra. É um desabafo e um testemunho dos horrores da ditadura castrista nos anos 1960 no que diz respeito à perseguição aos homossexuais.
Cómo Llego la Noche
(Como a Noite Chegou, tradução livre)
Autor: Huber Matos
Editora: Tusquets Editor
Qual é a história: Não são poucas as histórias de pessoas que lutaram junto aos revolucionários pela derrubada do ditador Fulgencio Batista do poder em Cuba e que, por discordarem dos rumos comunistas que estava seguindo a revolução, se viram perseguidos pelo regime castrista. Foi o que aconteceu com Huber Matos, um dos comandantes que entraram em Havana ao lado de Fidel em 1959, e é o que ele relata nesta autobiografia: da luta contra Batista ao êxito da revolução, da perda de confiança em Fidel aos 20 anos que passou na prisão por ser considerado um traidor da revolução.
Por que é importante ler: Este é um relato de um comandante que chegou ao alto escalão da guerrilha revolucionária e era próximo de Fidel Castro, mas que dez meses após a tomada de Havana acabou sendo preso pelo regime. Matos é muito crítico em relação ao líder cubano, que, segundo ele, agia a todo momento como um oportunista. Ele também conta as torturas que sofreu enquanto estava preso. Não se sabe se tudo o que está no livro é verdade, mas é um ponto de vista de um personagem real da história de Cuba que vale a pena conhecer. A obra é de 2004 e não há tradução para Português.
Cerrado por Reparación
(Fechado para Reforma, tradução livre)
Autora: Nancy Alonso
Editora: Ediciones UNION, 2002
Qual é a história: O livro reúne 11 histórias divertidas sobre como os cubanos lidam com os problemas do dia a dia, que vão desde a burocracia extrema ao racionamento de água e à restrição na alimentação.
Por que é importante ler: As situações pelas quais passam as personagens das histórias são angustiantes, frustrantes. O leitor poderia se sentir do mesmo jeito nao fosse a leveza e o humor com que a autora aborda diferentes temas espinhosos para quem mora na ilha. Em cada página é possível ter um panorama de como era viver em Cuba há nao muito tempo, já que a primeira edição do livro foi publicada em 2002, e até mesmo reconhecer alguma semelhança com os problemas que enfrentamos no Brasil. Infelizmente a obra não foi traduzida para o português, mas é possível encontrar edições em espanhol ou inglês.