Foi uma vitória conquistada por uma margem estreita, mas bastante significativa. O candidato democrata Doug Jones conquistou a vaga ao senado pelo Alabama com 49,9% dos votos, contra 48,4% do republicano Roy Moore.
A diminuta margem entre o vitorioso Jones e o derrotado Moore não reflete o tamanho da vitória democrata. Jones começou a campanha quase 20 pontos atrás do adversário, mas foi ganhando força com os votos do eleitorado negro e dos republicanos moderados.
A eleição de Jones não representa apenas um baque local. Trump deu apoio irrestrito a Moore, mesmo depois de o republicano ser bombardeado com acusações de assédio sexual – ele sempre negou – e até enviou seu estrategista Steve Bannon para ajudar na campanha. Com a derrota, Trump perde prestígio e vê seu domínio no Senado ameaçado: atualmente, os republicanos têm 52 cadeiras, contra 46 dos democratas e 2 dos independentes. Agora, a maioria de Trump fica por uma cabeça: 51 a 49.
O analista político republicano Marc Thiessen estava enfurecido. “A vitória de Jones também colocou os democratas a uma distância mínima de recuperar o controle do Senado em 2018. Se isso acontecer, a presidência de Trump acabou”, escreveu no Washington Post.
Mas será que apenas as acusações fizeram Roy Moore perder uma eleição praticamente ganha? O que mais deu errado? Confira os motivos abaixo:
1 - Eleitorado negro
Talvez a maior dúvida no dia das eleições especiais era se os eleitores negros se mobilizariam o suficiente para votar em Jones. Bem, os eleitores negros apareceram na mesma proporção que fizeram por Obama em 2008 e 2012. As pesquisas mostram que 28 por cento do eleitorado voltou, o que é um pouco maior que a população negra do estado (27 por cento) e especialmente bom considerando que Obama não estava na votação. Melhor ainda: 96 por cento dos afro-americanos apoiaram Jones, semelhante ao apoio ao presidente Obama, de 95 por cento entre este grupo, em 2012.
A grande questão é saber se os eleitores brancos e conservadores ficaram em casa desmotivados pelas alegações contra Moore, ou se os esforços para mobilizar os eleitores negros foram tão bem-sucedidos. Mesmo que seja um pouco dos dois, os eleitores negros deram uma chance a Jones.
2 - Mulheres
As eleições de 2016 apresentaram a maior diferença de gênero em uma corrida presidencial na história moderna, com uma vantagem de 11 pontos para Trump entre o eleitorado masculino e 13 pontos para Hillary Clinton entre o feminino. Bem, a diferença de gênero no Alabama foi ainda maior: entre os homens, a vantagem de Moore foi de 17 pontos (57 a 40) e, entre as mulheres, a vantagem de Jones foi de 15 pontos (57 a 42). Isso deve reforçar a ideia de que homens e mulheres processam acusações de assédio sexual de maneira diferente.
3 - Jovens
Os republicanos estão perdendo eleitores com menos de 45 anos de idade (por uma margem de 20 pontos) e mal ganhando de 45 a 64 anos de idade. Isso não é sustentável, especialmente quando os millennials abrem caminho para o eleitorado e enxergam o Partido Republicano como xenófobo e anticientífico.
4 - Moderados
Os republicanos perderam entre os moderados por uma margem de 25% a 74%. Aparentemente, Trump e Moore afastaram todos, menos o núcleo hard-core do Partido Republicano.
5 - O movimento #MeToo
É possível que os resultados no Alabama não digam muito sobre como os eleitores tratariam alegações semelhantes em qualquer outro estado. O fato de que Moore ainda teve uma chance de ganhar — e bem grande, aliás — e que tantos republicanos do Alabama claramente acreditaram nele quando disse que suas acusadoras estavam mentindo, mostrou a desvantagem (para as mulheres) de tornar essas coisas públicas.
Mas a vitória de Jones vale muito para o movimento #MeToo. Um ano após as acusações de assédio sexual não derrubarem Trump, o movimento conseguiu derrubar um republicano em um estado tradicionalmente vermelho. Moore certamente teve outros problemas, mas isso serve para encorajar outras mulheres que possam estar considerando compartilhar suas próprias histórias. No mínimo, mostra que elas podem ter um impacto real e palpável.
6 - Steve Bannon
Mais uma vez ressurge o nome do controverso conselheiro de Trump, Steve Bannon. E diferentemente da campanha presidencial, quando foi vitorioso, agora Bannon foi o artífice da ideia de fazer Trump apoiar Moore até o fim. Foi ele também que induziu Moore a repetir a todo momento “fake news” como forma de defender das graves acusações de assédio. Como resultado, grandes veículos de imprensa declararam seu apoio a Jones.
Na quarta-feira, o deputado Pete King, um republicano de Nova York, disse que o resultado das eleições ressalta o fracasso da estratégia de Bannon. "Depois do desastre do Alabama, o Partido Republicano deve fazer a coisa certa e mandar Steve Bannon passear", tuítou. "Seu repertório está velho, ineficaz e moralmente vazio. Se quisermos tornar a América Grande novamente para todos os americanos, Bannon deve ir! E deve ir AGORA !!"
O republicano Carlos Curbelo, da Flórida, provocou Bannon por apoiar o "desagradável Roy Moore".
"Parabéns à ala de Bannon por dar um assento aos democratas em um dos estados mais vermelhos", escreveu Curbelo no Twitter. "Você não tem futuro na política do nosso país".
Segundo o site Politico, Bannon, agora chairman do Breitbart News, ficou sozinho entre os membros do círculo interno do Trump, forçando-o a apoiar Moore. Os dois conversaram na manhã desta terça-feira (12) e Bannon ofereceu garantias da Trump de que Moore prevaleceria. Garantias vazias, como agora se vê.
7 - Polarização
Mesmo sem as alegações de falta de comportamento sexual, Moore era uma figura polarizada. Ele foi duas vezes expulso do Supremo Tribunal do Alabama por se recusar a seguir as ordens judiciais federais, em 2006 foi contra permitir que o deputado Keith Ellison, de Minnesota, cumprisse o mandato porque é muçulmano. Disse acreditar que o ex-presidente Barack Obama não nasceu nos EUA e recentemente afirmou em uma manifestação que os EUA eram ótimos antes da Guerra Civil "apesar de termos tido escravidão" porque, segundo ele, as famílias eram unidas e o país tinha uma direção.
Alguns senadores republicanos deixaram claro de maneira pública sua oposição a Moore. O senador Jeff Flake tuítou uma foto de um cheque de US$ 100 que enviou para Jones. Surpreendentemente, o republicano Richard Shelby, senador senior do Alabama, disse que não votou em Moore e, em vez disso, escreveu na cédula o nome de um "republicano distinto".