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gastos do governo

A farra dos cartões corporativos ainda existe, mas diminuiu com Bolsonaro

O cartão corporativo foi criado em 2001 no governo Fernando Henrique Cardoso. A ideia era facilitar a transparência de gastos, além de cobrir pequenas despesas urgentes relacionadas ao cargo. De lá para cá, no entanto, o mecanismo se tornou uma caixa preta, com sigilo acobertando enormes gastos com desvio de função. 

A partir do segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva as despesas com cartões corporativos aumentaram demasiadamente. Dos R$ 33,3 milhões gastos em 2006, o valor mais que dobrou e saltou para R$ 76,2 milhões no ano seguinte. O montante chamou atenção dos órgãos de controle, levando à criação, no início de 2008, de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Cartões Corporativos. 

Foram descobertas diversas evidências de despesas com desvio de finalidade. A então Ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, foi a que mais gastou em 2007: R$ 171,5 mil. Entre as despesas, constavam compras em free-shop e o aluguel de um veículo durante um feriado. Por causa da repercussão, ela acabou pedindo demissão. O Ministro dos Esportes a época, Orlando Silva, comprou tapioca com o cartão. 

Um segurança pessoal de uma das filhas do presidente, Lurian Cordeiro Lula da Silva, gastou quase R$ 55 mil em lojas de autopeças, materiais de construção e de ferragens, supermercados, livrarias, combustível e em uma casa de venda de munição. Um funcionário do Ministério das Comunicações usou o benefício para reformar a mesa de sinuca. A farra com os cartões ia desde comprar presente em camelô, até pagar diária no Copacabana Palace.  

Apesar de apontar diversas irregularidades, a CPMI aprovou um relatório que não pediu o indiciamento de ninguém, acabando em pizza

Assim, a escalada de despesas com os cartões foi mantida. No último ano do governo Lula, os 9.761 servidores federais que tinham direito aos cartões gastaram mais de R$ 80 milhões. 

Durante o mandato de Dilma Rousseff, a despesa com cartões corporativos variou entre R$ 56 milhões a R$ 64 milhões. Já sob Michel Temer, com a redução de ministérios, diminuiu-se também a quantidade de servidores habilitados para o uso dos cartões — 5.910 —, e o gasto caiu para R$ 43 milhões. De 2004 a 2017, segundo o Portal da Transparência, os gastos com os cartões somaram R$ 748.615.060.74média de R$ 53,4 milhões por ano

Governo aperta o cerco

Durante a transição de governo, o Ministro da Casa Civil Onyx Lorenzoni afirmou que abriria mão de seu cartão e tentaria convencer colegas do mesmo. “A decisão é pessoal. Mas vou estimular todo mundo a adotar a mesma medida”, declarou ao final de janeiro. Era um endosso à ideia de contenção de despesas do governo. 

A quantidade de servidores habilitados a usarem o benefício diminuiu para 1.846 — um quinto dos funcionários registrados no governo Lula. Em 2 meses de governo Bolsonaro, a despesa total dos cartões diminuiu em 28%. Não obstante, a despesa referente à presidência aumentou significativamente, sem justificativas, em 16%, alcançando o patamar de R$ 1,1 milhão. 

Na visão do advogado e mestre em Corrupção e Governança pela Universidade de Sussex, Carlos Henrique Barbosa, ainda é cedo para elogiar a redução de despesa neste início de governo. “Houve pouca mudança legislativa em relação ao que era antes da CPMI dos Cartões Corporativos. O que realmente mudou de lá para cá, e que estamos observando na contenção de despesas, é uma mudança de mentalidade, além da existência da Lei da Transparência. A partir do momento que se passa a exigir transparência, as coisas começam a mudar.” 

O advogado salienta ainda que a melhor atuação da Controladoria Geral da União contra improbidade administrativa, um processo iniciado desde 2015, também influencia em resultados melhores verificados no governo Temer e tende a ser percebido no governo Bolsonaro. 

Mesmo assim, foram verificadas despesas questionáveis, como os R$ 14.467,20 despendidos em churrascarias neste ano por integrantes beneficiários do Ministério da Defesa. 

Falta de transparência 

Boa parte das despesas com os cartões é mantida em sigilo, sob a justificativa de “garantir a segurança da sociedade e do Estado”. Dessa forma, quase metade das despesas do governo Lula permanece em sigilo. Já em relação às despesas da presidência de Bolsonaro, apenas R$ 15,5 mil dos mais de R$ 1 milhão gastos nos cartões da presidência Bolsonaro não estão sob sigilo. 

Para Barbosa, impressiona o fato de que os próprios servidores habilitados a utilizarem o benefício possuam o poder de decretar sigilo sobre seus próprios gastos, algo que não possuem sobre outros documentos. “Tamanha discricionariedade é preocupante. Por se tratar de uma exceção, não faz sentido que a maior parte desse tipo de despesa seja sigilosa. Precisamos ter mais transparência na fundamentação, diferente do que ocorre hoje”. 

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