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Em 2018, um novo grupo ambientalista surgiu no Reino Unido. A organização pouco coesa se apresentou com o nome de Extinction Rebellion [Rebelião Extinção], ou "XR", e pretendeu despertar a consciência para as mudanças climáticas por meio de protestos disruptivos. Os ativistas da XR encenaram protestos teatrais e fecharam as pontes e estações de metrô londrinas. Os líderes do grupo alertaram que as mudanças climáticas poderiam "matar seis bilhões de pessoas este ano" e conclamaram os britânicos a pararem de usar combustíveis fósseis praticamente da noite para o dia.
Assim como o movimento Occupy Wall Street, que o inspirara, o XR faz pouco caso de prescrições políticas específicas. Mas seus membros geralmente desdenham de nossos estilos de vida modernos, de energia intensiva, enquanto também rejeitam a energia nuclear e outras abordagens de alta tecnologia para reduzir emissões. Muitos acreditam que, para salvar o planeta, o capitalismo deve ser derrocado.
Uma das porta-vozes mais carismáticas do grupo era Zion Lights. Filha de imigrantes indianos e mãe de dois filhos, Lights era uma ativista climática de longa carreira. (O Telegraph já a chamou de "Mãe mais verde da Grã-Bretanha.") Mas ela se viu duramente pressionada para defender as reivindicações mais extremas do XR. Querendo entender melhor as questões, Lights voltou à faculdade, onde estudou os debates acerca da energia nuclear e assuntos relacionados. "Eu comecei a me dar conta de que quase tudo em que eu acreditava estava errado", disse-me quando a entrevistei recentemente para um podcast. Quando Lights tentou discutir sua nova perspectiva com os colegas do XR, "eu descobri que havia uma resistência imensa, imensa", disse.
Recentemente, Lights teve que fazer a si própria uma pergunta dolorosa: "E se você tivesse dedicado a maior parte de sua vida a tentar salvar o planeta", escreveu ela na Quillette ano passado, "mas depois se desse conta de que, de fato, ou em potência, fez as coisas piores?" É uma questão que mais ambientalistas deveriam enfrentar hoje. Durante o último meio século, seu movimento teve conquistas que mudaram o mundo, reduzindo a poluição da água, preservando as florestas e a vida selvagem. Mas quando se trata de combater o aquecimento global, a questão que a maioria dos ambientalistas vê agora como a mais grave ameaça do planeta, é possível argumentar que a elite da política verde fez mais mal do que bem.
Essa alegação decerto soa contraintuitiva, mas as evidências mostram que algumas das políticas favoritas dos ativistas -- especialmente o foco monotemático em instalações eólicas e solares para produzir energia -- foram, na melhor das hipóteses, marginalmente eficazes. Outras políticas, tais como trocar gasolina e diesel por biocombustíveis à base de plantas, na verdade aumentam as emissões. Uma das maiores vitórias comemoradas pelo movimento foi a sua longa guerra contra a energia nuclear, a única tecnologia que demonstra a capacidade de reduzir drasticamente a pegada de carbono de uma nação. Hoje, alguns ativistas verdes estão lutando contra a próxima geração de tecnologias amigáveis ao clima, inclusive reatores nucleares avançados e sistemas para capturar o carbono dos combustíveis fósseis, ou até varrê-los para fora da atmosfera. Chamemos isso de guerra verde à energia limpa.
Extremistas como o Extinction Rebellion não são os únicos com ideias ruins quanto à melhor maneira de reduzir o carbono. No último novembro, chefes de Estado e representantes de ONGs globais, firmas financeiras e companhias energéticas se reuniram em Glasgow para a COP26, a conferência do clima da ONU. Os palestrantes soltaram o palavrório mais apaixonado. "Estamos cavando nossas próprias covas", disse o secretário geral da ONU, António Guterres. O primeiro ministro britânico Boris Johnson comparou o planeta a James Bond, "amarrado a uma bomba apocalíptica" que ameaça "destruir a vida humana como a conhecemos". A despeito do catastrofismo, os presentes seguiram direitinho a cartilha. Os governos prometeram turbinar os gastos com energia renovável e restringir o uso de petróleo e gás. Organizações financeiras concordaram com as diretrizes internacionais que punem investimentos em combustíveis fósseis e favorecem projetos de energia verde.
Enquanto alguns países prometeram estabelecer regras ainda mais estritas para mirar em emissões futuras, a China, maior emissora de gases de efeito estufa, resistiu às demandas e se comprometeu a só começar a diminuir suas emissões em algum momento indefinido do futuro. Como notou a agência de notícias Associated Press, "as altas aspirações e o imaginário apocalíptico do começo da conferência logo se depararam com uma dose fria de realidade."
Não obstante, as emissões globais de fato parecem estar num pico. Os cenários apocalípticos que alguns ativistas anteciparam dificilmente ocorrerão. Na verdade, a maioria das nações desenvolvidas está reduzindo aos poucos suas pegadas de carbono, ainda que não com as metas agressivas prometidas. Ironicamente, tais reduções nas emissões amiúde ocorrem não por causa das políticas defendidas nas conferências climáticas, mas apesar delas.
Ted Nordhaus, fundador do Breakthrough Institute, um instituto ecomodernista, é cético quanto ao "complexo industrial-climático global" exibido na COP26. "Um movimento climático menos refém de sonhos febris de apocalipse focaria mais em equilibrar a redução de emissões de longo prazo com o crescimento, o desenvolvimento e a adaptação, aqui e agora", escreve. Os extremistas do Extinction Rebellion e grupos similares exigem "mudança sistêmica", isto é, desmantelar mercados livres, criar alternativas às instituições democráticas existentes e reduzir deliberadamente os padrões de vida por meio de um processo chamado "decrescimento". Os tecnocratas da COP26 não defendem nada tão radical, mas eles também almejam um modelo de sociedade mais centralizado e menos orientado para o crescimento. No paradigma da COP26, setores inteiros da economia — energia, transporte, manufatura, habitação — se submeteriam a transformações distorcivas.
Segundo essa visão, os mercados não são adequados para lidar com as transições necessárias. Em vez disso, as mudanças devem ser guiadas por meio de regulamentação governamental, acordos supranacionais entre indústria e ONGs, controles financeiros e outras medidas de cima para baixo. Certas tecnologias -- como carros elétricos e painéis solares -- devem ter subsídio pesado, enquanto outros -- motores de combustão interna, fogões a gás -- devem ser punidos ou até banidos. O uso de combustíveis fósseis deveria ser reduzido por quaisquer meios necessários, inclusive pressionando os preços para cima com a restrição das perfurações de poços de petróleo e das construções de oleodutos. Todas as políticas devem ser adequadas para alcançar "emissões líquidas zero" por volta de 2050.
Esta é uma meta espantosamente difícil, que tocaria cada aspecto da vida moderna. Ainda assim, os defensores do carbono líquido zero rejeitam ou negligenciam, com demasiada frequência, as próprias políticas com mais chances de ajudar o mundo a consegui-lo. Como Nordhaus escreveu recentemente na The Economist, a comunidade ativista "insiste em planejar a economia global sem muitas das tecnologias que a maioria das análises técnicas concluem serem necessárias, inclusive a energia nuclear, a captura do carbono e a remoção do carbono." Noutras palavras, as elites verdes querem destruir as vidas de bilhões, mas, de modo surpreendente, mostram pouco interesse em saber se seus programas funcionam. Em algumas partes do mundo, o lobby climático já deu um jeito de fazer valer políticas que aumentam os preços, detêm o crescimento e promovem estabilidade política -- tudo isso enquanto conseguem meras reduções marginais nas emissões.
O problema começa com a oposição incondicional do movimento aos combustíveis fósseis. Por exemplo, a maioria dos ambientalistas se opõe visceralmente ao fracking e aos gasodutos. O governo Biden reduziu a extração de petróleo americana dias depois de tomar posse (uma razão para os preços dos EUA terem triplicado desde quando Biden se tornou presidente). Mas, na verdade, como o gás natural emite quase 50% menos dióxido de carbono do que o carvão, ele é uma de nossas melhores ferramentas para baixar as emissões no curto prazo, enquanto também beneficiamos a economia. Alex Trembath, vice-diretor do Breakthrough Institute, escreve: "O boom do fracking nos EUA de 2008 em diante segurou a inflação, criou centenas de milhares de empregos durante a pior recessão em cem anos e, ainda por cima, reduziu as emissões de carbono ao substituir a energia de queima de carvão, muito mais suja."
Eco-pragmatistas como Trembath veem o gás natural como um "combustível ponte" que pode facilitar a transição para fontes energéticas de baixo carbono. (Em breve, a tecnologia de captura e estocagem de carbono -- CCS, na sigla em inglês -- poderá viabilizar o aproveitamento da energia no gás enquanto se solta muito menos carbono na atmosfera.) Mas a maioria dos ativistas ambientalistas alega que devemos superar o gás natural o mais rápido possível, substituindo-o por energia eólica e solar. Energia eólica e solar podem ajudar a reduzir emissões de carbono, desde que sejam parte num misto de fontes energéticas. Ainda assim, os campeões da energia renovável tendem a ocultar as imensas dificuldades de tentar ligar a rede elétrica primariamente com fontes energéticas tão intermitentes.
É claro que o povo entende que as instalações eólicas e solares só produzem energia quando o vento sopra e o sol brilha. Mas às vezes até os especialistas subestimam o desafio complexo que essa intermitência apresenta aos operadores da rede elétrica. Como a maioria das instalações eólicas e solares fica ociosa durante a maior parte do tempo, os produtores de energia renovável têm que construir, em massa, aparato extra para produzir energia. Energia renovável também requer uma rede de linhas de transmissão inteiramente nova para transferir energia de, digamos, áreas ensolaradas para áreas nubladas.
Apoiadores de fontes renováveis prometem que descobertas iminentes na tecnologia das baterias farão da intermitência um problema menor. Na realidade, enquanto as baterias podem ajudar os operadores de rede a gerenciar pequenos picos na demanda, elas continuam caras demais para servir de reservas de longo termo. Todos esses desafios significam que, enquanto a rede elétrica "toda renovável" exigida pelos ativistas não é tecnicamente possível, ela custaria muito mais -- e levaria muito mais tempo para ser construída -- do que abordagens mais equilibradas.
Apesar desses obstáculos, a maioria dos ativistas verdes vê a energia solar e eólica como algo próximo de uma panaceia climática. Então poder-se-ia admitir que os grupos ambientalistas estão fazendo um lobby pesado para conseguir que esses projetos sejam aprovados e construídos. Ainda assim, os ambientalistas amiúde levam a um caminho oposto à construção de projetos de energia renovável -- sobretudo quando estão prestes a serem construídos em seus quintais. Nos EUA, grupos ambientalistas estão lutando contra instalações solares no Massachusetts, Califórnia, Nevada, Flórida e em muitos outros estados. Parques eólicos enfrentam ainda mais oposição: desde 2015, mais de trezentas comunidades dos EUA rejeitaram ou restringiram projetos eólicos, segundo uma base de dados mantida por Robert Bryce, que escreve sobre energia.
Não é de admirar que muitos ambientalistas estejam em conflito: as fontes energéticas de carbono zero exigidas por eles podem causar um tremendo estrago na vida selvagem e nos espaços abertos que eles amam. Por exemplo: o icônico parque eólico da Califórnia, Altamont Pass, mata milhares de aves por ano, incluindo uma estimativa de 75 a 110 águias-reais. As usinas solares ameaçam as tartarugas do deserto em risco de extinção, bem como outros animais selvagens. Por causa de sua baixa densidade energética, usinas solares e parques eólicos exigem enormes porções de terra, em comparação a outras fontes de energia. A usina nuclear recém-fechada de Indian Point, em Nova York, ocupa apenas 1 km². Substituir sua energia só com a solar e a eólica demandaria mais de 130.000 hectares de turbinas. É uma porção de terra cultivável e habitável grande demais a ser gasta com energia.
O maior obstáculo que o movimento verde lançou contra a redução de emissões é a duradoura oposição à energia nuclear. Os principais grupos ambientalistas, incluindo o Sierra Club, o Natural Resources Defense Council e a League of Conservation Voters, combatem a energia nuclear desde a década de 1970. "Quando você está no movimento ambientalista, você é automaticamente anti-certas-coisas", disse-me Zion Lights. "E a energia nuclear é o maior bicho papão de todos."
Mesmo após décadas de pesquisa sobre energia alternativa, a energia nuclear continua sendo a única que se mostrou capaz de produzir eletricidade a um só tempo confiável, sem emissões e capaz de ser escalonada para atender uma demanda crescente. Mas décadas de ativismo antinuclear erodiram o apoio público. Após os acidentes de Three Mile Island e Chernobil, os EUA e outros países impuseram pesos regulatórios que vão muito além das necessidades de segurança. Na maioria dos países ocidentais, a construção de usinas nucleares foi parada.
Mas e se a pesquisa nuclear e a construção de usinas tivessem continuado a avançar no ritmo dos anos 70? Um pesquisador australiano concluiu: "Se as taxas do começo tivessem continuidade, a energia nuclear poderia estar em torno de 10% do seu custo atual." Essa energia barata e limpa teria tornado o uso do carvão -- e, em muitos casos, até o do gás natural -- desnecessário para a geração de energia. Ainda por cima, essa revolução nuclear hipotética teria eliminado um carbono equivalente a cerca de cinco ano de emissões globais e impedido nove milhões de mortes causadas pela poluição do ar. A maioria dos ativistas verdes de hoje veria tais números como um milagre. Ainda assim, foram os ambientalistas que lideraram a campanha para deter o desenvolvimento da mais limpa e mais verde entre todas as fontes de energia.
Quando Lights estudou os debates acerca de energia e clima, chegou às mesmas conclusões que outros ambientalistas sem preconceitos: que o medo de acidentes e lixo nucleares são exagerados demais; que as vantagens da energia renovável foram infladas; e que as políticas que limitam a oferta de energia impõem aos pobres custos pesados. Em 2021, Lights decidiu romper com seus aliados verdes radicais, lançando o Emergency Reactor, um grupo que defende a energia nuclear e toma uma postura mais positiva quanto à energia em geral. "Países ricos precisam de energia confiável sem carbono, e os países mais pobres precisam de energia limpa para se desenvolverem", escreve ela no site do grupo.
Lights não está sozinha. Como escrevi nestas páginas, um número crescente de ambientalistas pragmáticos agora abraçam a energia nuclear. (Cf. "The Nuclear Option", Winter 2019.) Gurus da tecnologia, Bill Gates incluso, estão investindo em startups nucleares de nova geração. Alguns grupos ambientalistas reduziram sua oposição à tecnologia. E alguns líderes políticos, como Macron e Biden, abraçaram a energia nuclear. Como parte de seu plano de infraestrutura de um trilhão de dólares, o governo Biden está executando um programa de seis bilhões para ajudar a salvar as usinas nucleares americanas em risco. A nova Lei de Redução da Inflação também inclui mais apoio à energia nuclear, ainda que esses benefícios sejam pequenos em comparação às centenas de bilhões alocados na solar e eólica. Depois de anos desestimulando investimentos em energia nuclear, a União Europeia recentemente atuou no sentido de incluí-la em sua "Taxonomia Verde" de tecnologias consideradas compatíveis com as metas de carbono zero. Recentemente, a pressão sobre a energia global causada pela guerra na Ucrânia deu um novo fôlego aos apoiadores das usinas nucleares.
Os defensores de tais usinas ainda enfrentam uma longa guerra. Embora a oposição esteja em declínio, o Capital Research Center estima que instituições filantrópicas "gastaram no mínimo 1,1 bilhão de dólares em durante 2018" em campanhas contra a energia nuclear. E o apoio oficial amiúde vem com limitações junto. Essa inclusão da União Europeia na sua Taxonomia Verde, por exemplo, inclui limites temporais e outras restrições calculadas para espantar investidores.
Então, apesar dos indícios de progresso, a indústria nuclear continua na mira: por um lado, suas usinas enfrentam a pressão de ativistas e políticos; por outro, está financeiramente espremida pela energia renovável, que recebe, em comparação, subsídios massivos. De maneira nada surpreendente, as instalações nucleares americanas estão fechando a uma taxa de cerca de uma por ano, sendo que várias usinas devem ser fechadas nos próximos cinco anos. E os grupos, inclusive a Union of Concerned Scientists (UCS), começaram a fazer lobby contra a aprovação regulatória para a próxima geração de projetos, incluindo pequenos reatores modulares e outros conceitos. Apesar da ampla evidência de que esses reatores avançados serão drasticamente mais seguros do que as usinas atuais (que já são bastante seguras), a UCS se opõe a eles -- em parte porque seu tamanho diminuto e seu baixo risco "poderiam facilitar a instalação de novos reatores em comunidades BIPOC ['pessoas de cor, negras e indígenas', na sigla em inglês]." Recentemente, a Comissão Regulatória Nuclear dos EUA agradou esses críticos ao rejeitar um pedido da Oklo Power -- uma das startups nucleares mais promissoras -- para construir uma versão de testes do microrreator revolucionário da companhia.
O que faz da energia nuclear tamanho deus-nos-acuda para os ambientalistas? O economista climático Gernot Wagner nota que o movimento ambiental moderno "surgiu no contexto da ameaça global da guerra nuclear." Escreve: "Peguem essa base antiguerra, acrescentem uma boa dose de anticorporativismo, um punhado de anticapitalismo e uma ou duas pitadas de 'pequeno é bonito', e muito da atitude dos ambientalistas para com a energia nuclear se torna um fato consumado." Como diz Wagner, a hostilidade verde quanto a energia nuclear se harmoniza com visões progressistas mais amplas. Alguns ativistas afirmam claramente que seu inimigo real não é o carbono, senão a economia de mercado. Em seu livro de 2014, Como mudar tudo: Um guia para jovens que querem proteger o planeta, a escritora canadense Naomi Klein chama a mudança climática de "melhor argumento que jamais existiu para mudar [...] as regras do capitalismo."
Até os ambientalistas moderados volta e meia expressam sentimentos similares, embora menos explícitos. Estes incluem a suspeita de que a tecnologia é, de algum modo, oposta à natureza, um medo de que os mercados são fatalmente corrompidos pela ganância, e um vago desejo por um estilo de vida mais natural. Essa cosmovisão algo rousseauniana leva a certas preferências políticas: sítios orgânicos são melhores do que o "agronegócio"; soluções coletivistas são melhores do que mercados sedentos por dinheiro; biocombustíveis são preferíveis a petróleo e gás, e assim por diante. Nessa mentalidade, as energias eólica e solar (a despeito de exigirem muito material e tecnologia exóticos) parecem intuitivamente opostas à temível e tecnológica energia nuclear. O que poderia ser mais natural do que colher energia do vento e do sol? Nem todos os defensores do clima adotam esse tipo de pensamento algo embotado, claro. Mas um número alarmante de legisladores, ONGs e até chefes de Estado continua a favorecer sentimentos utópicos em detrimento da economia e da engenharia reais.
A fracassada 'Virada Energética' da Alemanha
A Europa oferece um exemplo vívido desse fenômeno. Em 2000, a Alemanha anunciou sua ambição de se tornar a líder mundial no desenvolvimento de energia renovável enquanto reduzia os combustíveis fósseis e a energia nuclear. Como foi notado, escreve o cientista ambiental Vaclav Smil, essa política da Energiewende [Virada Energética, em alemão] "está enraizada na tradição naturalística e romântica da Alemanha." Ela reflete a influência socialista do Partido Verde, bem como a antipatia do público da Alemanha contra todas as coisas nucleares. Duas décadas depois, a Alemanha gastou bem mais que 500 bilhões de euros em infraestrutura solar e eólica, biocombustíveis e outras iniciativas. Ainda assim, a Energiewende é um fracasso ambiental, econômico e geopolítico.
Por volta de 2019, nota Smil, a parcela da energia total produzida por combustíveis fósseis caiu de 84% para 78%. Apesar desse colossal compromisso com energia renovável, a Alemanha não conseguiu reduzir as emissões mais rápido do que os EUA. O país ainda minera e importa montanhas de carvão sujo. Mesmo antes da crise da Ucrânia, os consumidores alemães estavam pagando a eletricidade mais cara da Europa. E o desabastecimento na produção de energia doméstica tornaram a Alemanha desesperadamente dependente do carvão -- e do gás natural da Rússia de Putin.
Cara a cara com uma cascata de efeitos indesejáveis, vocês poderiam imaginar que os líderes da Alemanha fossem reavaliar. Mas não. Em janeiro de 2022 -- enquanto a ansiedade com a energia escalava e Putin reunia suas tropas --, a Alemanha fechou três de suas seis últimas usinas nucleares. Estava planejado o encerramento das demais até o fim do ano. Nesse ponto, a Alemanha teria eliminado, num só ano, 12% de sua capacidade total de geração de energia -- toda segura, confiável e sem carbono. A ação foi "aplaudida por ambientalistas", escreveu o New York Times.
Depois de a Rússia invadir a Ucrânia, o governo alemão continuou rejeitando os pedidos para manter as usinas em funcionamento. Mas depois de Putin começar a reduzir o abastecimento de gás, os líderes do país enfim se deram conta de que eles estavam enfrentando "uma onda de pobreza". Em julho, o chanceler alemão Olaf Scholz anunciou que seu governo "daria uma olhada" na possibilidade de manter as usinas em operação.
Califórnia: energia cara e apagões
Nos EUA, a Califórnia seguiu rota similar. Em 2018, o Governador Jerry Brown tornou lei uma ordem para criar "uma rede elétrica totalmente livre de carbono" até 2045. O plano não vai bem. Substituir a eletricidade confiável de combustíveis fósseis e usinas nucleares pela instável energia eólica e solar tornou a rede elétrica do estado notoriamente inconfiável. Para evitar apagões, a Califórnia teve que deixar as usinas energéticas a gás excederem os limites normais de emissões, importar de outros estados a energia gerada com carvão e até permitir o uso de geradores a diesel. De maneira nada surpreendente, os consumidores californianos agora pagam 80% mais pela eletricidade do que a maioria dos americanos. Mas as emissões de carbono do estado caíram só cerca de 5% desde 2000, mais ou menos o mesmo que a média nacional.
Não obstante, por anos os líderes californianos permaneceram comprometidos com a ideia de aposentar Diablo Canyon, a última usina nuclear do estado. Felizmente o governador Gavin Newsom teve uma conversão a caminho de Damasco. Numa drástica reviravolta, Newsom recentemente propôs que o estado oferecesse à proprietária da usina, a Pacific Gas & Electric, um empréstimo perdoável de 1,4 bilhão de dólares para manter a usina em operação até 2035. Os defensores do livre mercado podem se irritar com o uso do dinheiro do pagador de impostos para promover um negócio desse jeito. Mas, dados os milhões que a Califórnia já torrou com projetos eólicos e solares, 1,4 bi para manter em funcionamento a maior e mais confiável fonte de energia do estado deverá ser uma pechincha.
Nova York: emissões de carbono aumentaram
Esse pragmatismo é encorajador. Ainda assim, os líderes políticos e os grupos ambientalistas continuam enviesados demais contra políticas que podem baixar o preço da energia ou ajudar a economia. No Vale do Rio Hudson, em Nova York, a organização filantrópica Riverkeeper tem um histórico impressionante de proteção ao habitat do Rio Hudson. Mas ela também encabeçou a campanha para fechar Indian Point, a usina nuclear que gerava 25% da energia da cidade de Nova York e região.
Defensores do fechamento da usina prometeram que a energia renovável substituiria com facilidade a energia perdida. Em acréscimo aos novos projetos eólicos e solares, indicaram uma linha de transmissão subterrânea que transportaria a energia hidrelétrica renovável do Quebec para a região metropolitana. O então governador Andrew Cuomo prometeu que o encerramento não resultaria em "nenhuma nova emissão de carbono".
Mas quando Indian Point fechou de vez, em abril de 2021, todas as instalações eólicas e solares do estado de Nova Iorque somadas produziam menos de um terço da energia daquela usina. Assim, tal como outras regiões onde as usinas nucleares fecharam, os operadores da rede elétrica se voltaram para o gás natural para preencher a lacuna. Por todo o estado, as emissões de CO2 relacionadas à rede elétrica aumentaram cerca de 15%. Os analistas alertaram para a possibilidade de apagões. Os preços da energia subiram, também, num salto de 50% para os moradores da cidade de Nova York.
Então a Riverkeeper executou uma manobra desavergonhada: com Indian Point fechada, a organização começou a fazer lobby na Comissão de Serviço Público de Nova Iorque contra a linha de transmissão do Canadá que ela apoiara. O grupo anunciou que tivera "a coragem para dar uma segunda olhada severa nesse projeto". Muitos defensores de energia limpa ficaram indignados. Jesse Jenkins, um respeitado analista de energia em Princeton, usou o Twitter para dizer que achou "incrivelmente frustrante ver grupos ambientalistas que diziam ver as mudanças climáticas como uma 'crise' fazerem oposição regular e ativa às soluções."
Contradição no coração do movimento climático
A reviravolta do Riverkeeper revela uma contradição perturbadora no coração do movimento climático. Tecnocratas verdes dizem que devemos "eletrificar tudo", mudando carros e caminhões, aquecimento doméstico, processos industriais, e mais coisas, para a energia elétrica em vez de combustíveis fósseis. Num mundo de eletricidade farta e barata, esse processo pode ser exequível e até desejável. Mas enquanto os ativistas apoiam a energia renovável na teoria, eles na prática se opõem à infraestrutura necessária -- não só para produzir a energia, como para entregá-la aos consumidores.
Por exemplo, uma rede elétrica majoritariamente renovável precisaria de centenas de milhares de milhas de linhas de transmissão de alta voltagem. Mas os grupos ambientalistas abriram processos contra uma linha projetada para levar energia eólica de Novo México para o Arizona e um corredor de transmissão semelhante ligando Iowa a Wisconsin. Após uma campanha do Sierra Club contra o projeto, os eleitores do Maine há pouco rejeitaram uma linha de transmissão desenhada para entregar a energia hidrelétrica do Canadá para a Nova Inglaterra.
Como parte do acordo para apoiar a suposta Lei de Redução da Inflação de Biden, o senador da Virgínia Ocidental Joe Manchin exigiu que o Congresso concordasse em reformar as atuais regras que governam os projetos de infraestrutura. Enquanto os estados ainda podem estabelecer as próprias restrições, a medida de Manchin poderia destravar as leis federais que dificultam a construção de infraestrutura. A Lei Nacional de Política Ambiental, por exemplo tipicamente acrescenta anos para a aprovação de processos para linhas de transmissão, oleodutos e outros projetos.
É importante revisar impactos ambientais potenciais, mas o processo não deveria tomar meia década ou mais. Os detalhes continuam confusos, mas o acordo de Manchin poderia ajudar os projetos de energia a serem construídos mais rapidamente e a custo mais baixo. Claro que é demais esperar uma retirada do obstrucionismo ambientalista.
A economia verde que os ativistas visam também traria uma rede massiva de ferrovias de alta velocidade para ajudar a substituir as viagens aéreas. Só que os ativistas locais estão lutando contra cada quilômetro do sistema de ferrovias de alta velocidade planejado pela Califórnia. Os custos estimados do projeto subiram para 100 bilhões de dólares, sem nenhuma expectativa razoável de que seja completado um dia.
As baterias dos veículos elétricos e os componentes para as instalações solares e eólicas precisarão de milhões de toneladas de minerais: lítio, cobalto, metais raros e mais. O Maine tem uma das maiores reservas de lítio do mundo, mas uma lei de 2017 torna a mineração praticamente impossível. Os ativistas estão lutando contra outras possíveis minas em Nevada, Carolina do Norte e outros estados. No deserto Black Rock, de Nevada, os habitués do festival Burning Man abriram um processo contra um projeto de energia geotermal. O Greenpeace e outros grupos se opõem à pesquisa de tecnologias que podem capturar e armazenar o carbono nos combustíveis fósseis, ou até tirar o CO2 da atmosfera. Os críticos temem que as tecnologias CCS "prolonguem a demanda por combustíveis fósseis", segundo o Inside Climate News.
A lista continua. Volta e meia os visionários do clima propõem transformações totais de nosso estilo de vida em nome da redução de emissões. Mas depois fracassam em construir -- ou sequer propor -- a infraestrutura necessária para tornar o sonho realidade.
Ambientalistas radicais como os membros do Extinction Rebellion podem dizer que isso é uma boa coisa: nossa sociedade é rica demais, faminta demais por energia; temos de aprender uma lição de austeridade. Mesmo supostos moderados às vezes ecoam essa mensagem. Os conservadores nunca se esqueceram do secretário de energia de Obama, Steven Chu, que em 2008 disse que "temos que descobrir como aumentar os preços da gasolina até os níveis da Europa". Mesmo quando tenta tranquilizar os americanos quanto aos preços estratosféricos da gasolina, o presidente Biden descreve, otimista, a alta dos preços como parte de uma "transição incrível" para abandonar os combustíveis fósseis.
"Só quando a maré baixa você descobre quem nadava nu"
"Só quando a maré baixa você descobre quem nadava nu", já disse Warren Buffet. A invasão da Ucrânia pela Rússia cortou o suprimento de energia da Europa e expôs os riscos de confiar demais na energia solar e eólica. Alguns especialistas alertam para apagões, falta de gás e caos econômico.
Agora as lideranças europeias estão batendo cabeça para colocar as mãos em qualquer tipo de combustível fóssil que conseguirem. A Alemanha está reabrindo minas de carvão e pediu à União Europeia que retirasse os planos de limitar os investimentos em projetos de combustíveis fósseis no estrangeiro. A Alemanha também está procurando dois terminais de gás liquefeito para permitir a importação dos EUA, e, como notado acima, deve manter em operação seus últimos reatores nucleares. A Bélgica também está explorando um plano para manter abertos dois reatores que estavam marcados para aposentadoria precoce.
Outros países têm abordagens mais amplas. A França de Macron tinha anunciado um programa para construir 14 reatores nucleares. A Holanda planeja construir duas novas estações nucleares. Vários outros países estão explorando parcerias com companhias americanas para construir pequenos reatores modulares. No Japão, o Primeiro Ministro Fumio Kishida quer acelerar a reabertura de usinas nucleares que o país parara após o desastre de Fukushima em 2011. O pragmatismo energético está no ar.
As crises econômicas e geopolíticas podem ser uma oportunidade para os ativistas climáticos reduzirem o catastrofismo e focarem em políticas que reduzam mesmo o carbono -- sem destruir nosso padrão de vida. Por décadas, os ambientalistas radicais e até normais falaram a linguagem da privação. Zion Lights e seus aliados eco-pragmatistas preferem argumentar em defesa da abundância. Não precisamos punir o público para salvar o planeta, diz ela. A chave é simplesmente "construir muita energia limpa".
Em contraste com os protestos raivosos e anárquicos do Extinction Rebellion, seu grupo Emergency Reactor recentemente fez uma série de manifestações pequenas e alegres por Londres. Sua finalidade: educar o público quanto à energia nuclear. "As pessoas são ágeis em se engajar, em se evolver, e nos agradeceram por focarmos e soluções em vez dos aspectos negativos da mudança", disse. Quando uma ex radical verde se torna uma pragmatista ambiental otimista, é um sinal de progresso.
James B. Meigs é membro sênior do Manhattan Institute, editor colaborador do City Journal, co-apresentador do podcast How Do We Fix It? e ex-editor da revista Popular Mechanics.
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