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A Internet precisa de novas regras. Vamos começar por essas quatro áreas

Zuckerberg: "Acredito que precisamos de uma nova regulamentação em quatro áreas: conteúdo danoso, integridade eleitoral, privacidade e portabilidade de dados" (Imagem: Pixabay)
Zuckerberg: "Acredito que precisamos de uma nova regulamentação em quatro áreas: conteúdo danoso, integridade eleitoral, privacidade e portabilidade de dados" (Imagem: Pixabay) (Foto: )

A tecnologia é uma parte importante de nossas vidas, e empresas como o Facebook têm responsabilidades enormes. Todos os dias, tomamos decisões quanto a que discurso é prejudicial, o que constitui propaganda política e como evitar ataques cibernéticos sofisticados. Isso tudo é importante para manter a comunidade segura. Mas, se pudéssemos começar do zero, não pediríamos às empresas que fizessem essas avaliações sozinhas.

Acredito que precisamos de um papel mais ativo por parte dos governos e das agências reguladoras. Ao atualizarmos as regras da Internet, podemos preservar o que há de melhor nela – a liberdade que as pessoas têm de se expressarem e a liberdade que os empreendedores têm de criarem coisas novas – e ao mesmo tempo proteger a sociedade de danos maiores.

Pelo que aprendi, acredito que precisamos de uma nova regulamentação em quatro áreas: conteúdo danoso, integridade eleitoral, privacidade e portabilidade de dados.

Primeiro, o conteúdo danoso. O Facebook permite que todos usem a própria voz e isso gera benefícios reais – do compartilhamento de experiências ao surgimento de movimentos. Como parte disso, temos a responsabilidade por manter as pessoas seguras em nossos serviços. Isso significa julgar o que pode ser considerado propaganda terrorista, discurso de ódio, e mais. Revisamos continuamente nossas diretrizes juntamente com especialistas, mas por causa do nosso tamanho sempre cometemos erros e tomamos decisões com as quais as pessoas discordam.

Os legisladores costumam me dizer que temos poder demais sobre a liberdade de expressão e, sinceramente, concordo. Hoje acredito que não deveríamos ter tomado tantas decisões importantes quanto à liberdade de expressão sozinhos. Por isso estamos criando um grupo independente para que as pessoas possam apelar de nossas decisões. Também estamos trabalhando juntamente com governos, incluindo autoridades francesas, para garantir a eficiência do nosso sistema de análise de conteúdo.

As empresas de Internet devem ser responsáveis por ditar padrões quanto a conteúdos danosos. É impossível remover todo o conteúdo prejudicial da Internet, mas, como as pessoas usam dezenas de serviços de compartilhamento diferentes – todos com suas próprias diretrizes e processos – precisamos de uma abordagem mais padronizada.

Uma ideia é a instalação de grupos independentes para estabelecer padrões para a distribuição de conteúdos danosos e para avaliar as empresas em relação a esses padrões. A regulamentação poderia estabelecer as bases para o que é proibido e exigir que as empresas criem sistemas para manter conteúdos danosos ao mínimo.

O Facebook já divulga relatórios de transparência quanto à eficiência da remoção de conteúdos danosos. Acredito que todo grande serviço virtual deva fazer isso trimestralmente, simplesmente porque se trata de algo tão importante quanto o relatório financeiro. Depois que compreendemos a extensão dos conteúdos danosos, podemos ver que empresas estão melhorando e de que modo deveríamos estabelecer as premissas.

Em segundo lugar, uma legislação é importante para proteger as eleições. O Facebook já fez alterações importantes quanto à publicidade política: em vários países, anunciantes precisam comprovar sua identidade antes de comprar anúncios políticos. Criamos um arquivo aberto que mostra quem paga pelos anúncios, quais anúncios foram publicados por tais pessoas e qual o público-alvo deles. Mas nem sempre é fácil decidir se um anúncio é mesmo político. Nossos sistemas seriam mais eficientes se uma regulamentação criasse padrões comuns de verificação dos atores políticos.

As leis de publicidade política virtual se atêm sobretudo a candidatos e eleições, e não em assuntos controversos, nos quais percebemos mais tentativas de interferência. Algumas leis só se aplicam durante o período eleitoral, ainda que as campanhas sejam contínuas. E ainda há questões importantes sobre como as campanhas usam dados e escolhem seu público-alvo. Acreditamos que a legislação deva ser atualizada a fim de refletir a realidade das ameaças e estabelecer padrões para todo o setor.

Em terceiro lugar, a privacidade de fato e a proteção dos dados precisam de uma estrutura mundialmente coordenada. As pessoas ao redor do mundo têm pedido por uma ampla regulamentação de privacidade como o Regulamento Geral de Proteção de Dados da União Europeia, e eu concordo. Acredito que seria bom para a Internet se mais países adotassem regulamentações como o RGPD como estrutura comum.

Uma nova regulamentação de privacidade nos Estados Unidos e ao redor do mundo deveria se basear nas proteções garantidas pelo RGPD. Ela deveria proteger seu direito a escolher quais informações suas são usadas e ao mesmo tempo permitir que as empresas usassem essas informações para questões de segurança e para oferecer serviços. Ela não deveria exigir que os dados sejam localmente armazenados, o que os tornaria mais vulneráveis ao acesso indesejado. E ela deveria estabelecer uma forma de tornar empresas como o Facebook responsáveis, impondo sanções para quando cometemos erros.

Também acredito que uma estrutura mundial comum – e não uma regulamentação que varia enormemente de país para país e de estado para estado – garantirá que a Internet não seja fragmentada, que empreendedores possam criar produtos para todos e que todos tenham a mesma proteção.

À medida que legisladores adotarem novas regulamentações de privacidade, espero que eles possam ajudar a responder a algumas das perguntas que o RGPD deixou em aberto. Precisamos de regras claras para as situações nas quais a informação pode ser usada no interesse do público e como a regulamentação deve ser aplicada a novas tecnologias como a inteligência artificial.

Por fim, a regulamentação deveria garantir o princípio da portabilidade de dados. Se você compartilha dados com um serviço, deveria poder transferi-los para outro. Isso dá às pessoas mais opções e permite que desenvolvedores criem soluções inovadoras e concorram entre si.

Isso é importante para a Internet – e para que se crie serviço que as pessoas querem. É por isso que criamos nossa plataforma de desenvolvimento. A portabilidade real de dados deveria ser algo semelhante à forma como as pessoas já usam nossa plataforma para se inscreverem num aplicativo, e não como os meios existentes pelos quais você pode baixar um arquivo com suas informações. Mas isso requer regras claras quanto a quem é responsável por proteger a informação no trânsito entre os dois serviços.

Também são necessários padrões comuns, e é por isso que defendemos um formato de transferência de dados padronizado e o Data Transfer Project, de código livre.

Acredito que o Facebook tenha a responsabilidade por ajudar a resolver tais problemas e quero discuti-los com legisladores ao redor do mundo. Criamos sistemas avançados para encontrar conteúdos prejudiciais, impedir a interferência em eleições e tornar os anúncios mais transparentes. Mas as pessoas não deveriam ter de confiar em empresas específicas tratando destes problemas sozinhas. Deveríamos ter um debate mais amplo quanto ao que queremos enquanto sociedade e como as regulamentações podem ajudar. Essas quatro áreas são importantes, mas, claro, há muito mais o que discutir.

As regras que governam a Internet permitiram que toda uma geração de empreendedores criasse serviços que mudaram o mundo e geraram muito valor na vida das pessoas. Já está na hora de essas regras definirem responsabilidades claras para que as pessoas, as empresas e os governos sigam adiante.

*Zuckerberg é fundador e executivo-chefe do Facebook.

Tradução de Paulo Polzonoff Jr

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