De acordo com a ideologia dominante, a identidade de uma pessoa é em grande parte baseada em seu status como vítima: de racismo, sexismo, capacitismo – o preconceito contra pessoas portadoras de alguma deficiência física. Mas será que encorajar as pessoas a se verem primordialmente como vítimas realmente ajuda alguém? Isso não faz com que se sintam indefesas e removam por completo a noção de que são capazes de controlar as próprias ações no mundo?
A mensagem é: “a sua vida só está nesta situação por razões estruturais, então não há chance nenhuma de mudança até que as estruturas sejam demolidas.”
As pessoas sempre falam em “causas estruturais”, mas elas nunca explicam por completo a que elas estão se referindo. E é basicamente sobre o capitalismo: é a “questão do sistema”, que essencialmente se resume a “enquanto não conseguirmos abolir ou revisar radicalmente o sistema capitalista, você simplesmente não terá nenhuma chance.”
Mensagens que fazem as pessoas se sentirem indefesas
Não faria mais sentido destacar exemplos de pessoas que conseguiram chegar ao topo apesar de enfrentarem dificuldades aparentemente insuperáveis?
Oprah Winfrey, por exemplo, que teve uma origem humilde e mesmo assim se tornou a primeira bilionária negra a conquistar sua fortuna pelo próprio trabalho? Pesquisadores classistas de esquerda, a quem eu abordo criticamente no meu livro The Rich in Public Opinion [Os ricos na opinião pública], se recusam de forma inequívoca a se envolver nesse debate.
Em seu trabalho aprofundado de pesquisas de classismo “Framing Class: Media Representations of Wealth and Poverty” [Enquadrando as Classes: Representações de Riqueza e Pobreza na Mídia] Diana Kendall critica a forma como a mídia cobre os casos de pessoas dos estratos mais baixos da sociedade que conseguiram subir da pobreza para a riqueza.
Kendall destaca a história real de Oprah Winfrey como um exemplo particularmente negativo. De acordo com Kendall, quando a mídia retrata pessoas de sucesso como Winfrey, ela tende a enfatizar demais a importância do trabalho duro e os traços certos de mentalidade ou personalidade.
Kendall critica o fato de que esse tipo de cobertura da mídia acaba perpetuando o mito do sonho americano, “dadas as grandes possibilidades contra tal resultado, a emulação desse enquadramento não apenas cria expectativas irreais por causa das realidades econômicas e sociais dos anos 2000 como também oferece uma desculpa para que aqueles que estão melhor financeiramente possam ridicularizar quem não está.”
Kendall também lamenta que as notícias às vezes criam a impressão de que os pobres são “parcialmente responsáveis por sua situação” por causa de certas ações, como usar drogas ilegais e não procurarem um emprego.
Por trás dessa crítica há um conceito de humanidade que se baseia na ideia de que as pessoas não são responsáveis nem pelos resultados positivos nem pelos resultados negativos de suas vidas. Reportagens mostrando quem saiu da pobreza para o luxo são criticadas porque algumas vezes dão a entender que o sucesso só foi atingido por causa de traços de personalidade e esforço individual.
Ao mesmo tempo, notícias sobre os pobres são criticadas porque elas perpetuam a impressão de que algumas pessoas são, pelo menos em parte, culpadas pelo seu destino. Do ponto de vista de Kendall e outros pesquisadores de classismo, o sistema capitalista e as injustiças “estruturais” são sempre as culpadas por tornar as pessoas ricas ou pobres, enquanto a reportagem sobre causas individuais é marcada como uma tentativa de culpar os pobres por seu destino.
Ray Charles não era uma vítima
Estou lendo a incrível autobiografia de Ray Charles, o Sumo Sacerdote da Alma, que teve uma enorme influência na evolução estilística do Rhythm and Blues, do Blues, do Country e do Soul. A revista Rolling Stone o classificou em segundo lugar na lista dos 100 melhores cantores de todos os tempos, depois de Aretha Franklin e à frente de Elvis Presley.
Ray Charles cresceu na pobreza e sem o pai; sua mãe morreu aos 31 anos. Ele ficou cego aos sete. Nove meses antes ele testemunhou o afogamento do próprio irmão. O racismo era algo com o qual convivia todos os dias.
Uma certa tarde ele decidiu sair para nadar na praia de Myrtle, na Carolina do Sul. De repente ouviu seus amigos na praia gritando para que voltasse para a areia – por ser cego, ele não percebeu que estava indo em direção ao alto mar.
O que mais me impressionou em Ray Charles foi sua filosofia de vida. Em sua autobiografia ele escreveu quão importante era para ele, como um jovem, “entender como as coisas funcionavam: se eu entrasse em algum problema, era culpa minha. Ou se eu fizesse alguma coisa que valesse a pena, eu poderia levar os créditos. A responsabilidade veio muito cedo para mim.”
Durante a maior parte de sua vida, ele foi um viciado em heroína. Ele poderia ter culpado os outros, visto a si mesmo como uma vítima. Em vez disso, ele disse: “ninguém fez isso comigo. Eu fiz por conta própria. Não foi a sociedade que fez isso comigo, não foi um traficante, não foi por ser cego, por ser pobre ou por ser negro. Eu fiz por conta própria.”
Mesmo quando ele caiu em um golpe e perdeu muito dinheiro, Charles não ficou furioso ou amargo, como ele mesmo explica. “Isso me ensinou a manter o nariz colado nos livros.” E quando ele foi considerado culpado pela posse ilegal de drogas, Charles admitiu: “fui acusado. E eu não poderia me declarar nada além de culpado. (...) Foi resultado do que eu mesmo fiz.”
Stephen Hawking viu em sua deficiência uma vantagem
O físico Stephen Hawking sofria de uma condição médica extremamente rara, a esclerose lateral amiotrófica (ELA), uma doença que faz com que as células nervosas do cérebro e da medula espinhal sofram uma atrofia seguida de cicatrização ou endurecimento. Seus médicos lhe disseram que era uma doença incurável, e que provavelmente acabaria com a sua vida em questão de anos. Ele não ficou apenas confinado a uma cadeira de rodas, ele também perdeu a capacidade de falar. Hawking teve que aprender a usar um programa de computador e um sintetizador de voz para se comunicar verbalmente.
Mesmo assim, ele se tornou um dos cientistas mais famosos do mundo, fez viagens, se encontrou com papas e presidentes e escreveu uma sucessão incrível de best sellers. A chave para seu sucesso era a atitude positiva em relação à própria vida. Ele estava determinado a ver a positividade em sua deficiência.
Em sua autobiografia ele escreveu que essa atitude o libertou de ter que dar palestras ou ministrar aulas, e que por isso ele não precisava tomar parte em tediosas e desnecessariamente longas reuniões de comitês universitários. Em vez disso, teve tempo para se dedicar à pesquisa em tempo integral. Na opinião de Hawking, as pessoas com deficiência deveriam “se concentrar em coisas que as suas deficiências não a impedem de fazer, e não ficar ressentidas com aquelas que elas não podem. No meu caso, eu tenho sido capaz de fazer a maioria das coisas que eu queria.”
As barreiras que construímos
“Os homens não são prisioneiros do destino, mas prisioneiros das próprias mentes,” observou Franklin D. Roosevelt, o 32º presidente dos Estados Unidos. Roosevelt sofreu de poliomielite e tinha paralisia da cintura para baixo, o que significa que ele mal podia caminhar sozinho.
Isso, porém, não muda o fato de que o que ele diz é verdade: as barreiras que nos impedem de alcançar grandes objetivos em nossas vidas são aquelas que nós mesmo erguemos – estão todas em nossas mentes. Se conseguirmos derrubar essas barreiras, poderemos alcançar coisas com as quais nem sequer sonhamos hoje. Melhorar a sua vida não é uma questão de esperar pela mudança das circunstâncias externas, é um processo que tem que começar na sua cabeça.
A partir de estudos de psicologia sabemos que pessoas malsucedidas veem a si mesmas como vítimas de fatores externos e acreditam que suas vidas são determinadas por fatores alheios ao próprio controle.
Pessoas de sucesso, por outro lado, tendem a focar mais nas coisas que elas mesmas podem influenciar e mudar. Elas veem a si mesmas como criadoras do próprio destino.
A primeira atitude é uma mentalidade de vitimismo que leva à passividade e ao desânimo; a segunda atitude leva à atividade e motiva as pessoas a fazerem um esforço por conta própria. Você decide: qual das duas atitudes você acha que lhe dará as melhores chances de ter sucesso na vida.
Dr. Rainer Zitelmann é historiador e sociólogo. Ele também é um autor de renome mundial, empresário de sucesso e investidor imobiliário.
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