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A merecida queda política de Boris Johnson se deu, como de praxe, pelos motivos errados. Seus muitos pecadilhos e erros, e sua incapacidade de assumir a responsabilidade por eles de uma forma inequívoca, honrosa e no tempo certo sem dúvida sugerem defeitos de caráter, mas defeitos de caráter são esperados em nossos políticos e nos que ambicionam o poder. Eles nos mantêm entretidos.
O problema agora é encontrar alguém melhor do que Johnson, não no sentido de alguém mais preparado ou que não seja um arroz de festa que proibiu festas alheias, e sim alguém melhor no sentido das políticas econômicas, isto é, alguém que acredita que os princípios econômicos tirarão o país do caos que Johnson deixou para trás: a estagnação, a inflação alta, os altos impostos, um Estado incompetente e mais intervencionista do que nunca e extremamente endividado, graças à emissão de moeda e ao inchaço de um governo corrupto e corruptor.
Johnson teve azar, claro, nas dificuldades que precisou enfrentar e que não foram por ele causadas. Que líder britânico teria querido lidar com a animosidade da União Europeia – uma animosidade totalmente previsível, mas para a qual os políticos britânicos, que em sua maioria queriam continuar fazendo parte da União, não estava preparada? Além disso, Johnson teve de lidar com a pandemia de Covid-19 e a Guerra na Ucrânia, com todas as suas consequências.
Mas políticos têm de ser julgados pela forma como lidam com a realidade, e não pela forma como eles teriam lidado com essa realidade se as coisas fossem diferentes ou melhores. Sendo justo com Johnson, ele teve alguns pontos altos. Ele apoiou o desenvolvimento de uma vacina contra a Covid, e para isso precisou demonstrar coragem, já que o preço político do fracasso teria sido altíssimo. Ele contornou a burocracia para dar início a um programa de vacinação rápido e bem-sucedido. Ele foi o primeiro a tirar as restrições sanitárias, indo contra muitos cientistas que teriam nos mantido trancafiados até que ninguém mais no país soltasse um mero espirro.
Ele foi, de longe, o mais perspicaz dos líderes europeus ocidentais quanto à guerra na Ucrânia, se bem que talvez ele não tivesse essa perspicácia toda se o Reino Unido fosse mais energeticamente dependente da Rússia. Ainda assim, independentemente dos motivos, ele apoiou a Ucrânia mais do que qualquer outro líder de importância comparável, e isso conta a seu favor.
Infelizmente no longo prazo nada disso tem importância quando comparado à sua libertinagem econômica, pela qual ainda pagaremos a conta. O governo de Johnson gastou bilhões ajudando pessoas que não precisavam de ajuda – em parte, claro, porque há várias gerações nossa burocracia desistiu de distinguir os necessitados dos não-necessitados, às vezes até negando que tal distinção deva ser feita. Um vizinho meu, por exemplo, recebeu 50 mil libras, apesar de não precisar.
Depois de passar boa parte da carreira política rindo dos absurdos do extremismo ambientalista, Johnson mudou radicalmente de posição (por influência da esposa, dizem) e prejudicou a economia com suas políticas de emissão zero de carbono, interrompendo a exploração de combustíveis fósseis no pior momento da história para se fazer isso. A medida era ridícula desde o princípio, uma rendição covarde a uma utopia adolescente. E, graças a Johnson, muitos pobres morrerão de frio no próximo inverno, o que talvez não acontecesse se ele tivesse coragem para enfrentar esse absurdo evidente no começo do seu mandato. Além disso, os britânicos supostamente passarão a dirigir carros elétricos, embora não haja eletricidade para abastecê-los.
Apesar de ter prometido uma economia com menos impostos e regulamentações, um dos benefícios do Brexit, Johnson aumentou os impostos ao maior nível de tributação em décadas, tudo para pagar por programas sociais, sobretudo os voltados para os mais velhos, e não fez nada para deter a burocracia adicional causada pelo Brexit. De certa forma, todos os políticos deveriam ser caras-de-pau, mas Johnson levou isso a um patamar de excelência.
Pensando bem, Johnson não merecia ter sido primeiro ministro. O problema do Reino Unido é que, no cenário atual, parece não haver ninguém digno do cargo.
Theodore Dalrymple é colaborador do City Journal, membro do Manhattan Institute e autor de vários livros.