Em uma escola de ensino médio, na cidade de Salt Lake City, nos Estados Unidos, a estudante Keziah Daum se preparava para o seu baile de formatura. Assim como muitas outras adolescentes, ela queria encontrar um vestido que se destacasse entre os demais, "algo que seria mais original e ousado e teria algum tipo de significado", disse ela em entrevista ao Washington Post.
Daum decidiu procurar uma loja vintage no centro de Salt Lake City, onde se deparou com um qipao vermelho, vestido tradicional chinês de alta qualidade. "Achei que era absolutamente lindo", disse Daum, que não é chinesa. O vestido, segundo ela, "realmente me deu uma sensação de apreço e admiração por outras culturas e por sua beleza".
Em um domingo após o baile, no mês passado, ela postou uma foto em que usava seu qipao ao lado de suas amigas, mas ela não tinha ideia de que isso provocaria uma onda de críticas.
"Minha cultura não é sua ... vestido de formatura", um homem chamado Jeremy Lam tuitou dias depois, compartilhando as fotos que ela postou. "Tenho orgulho da minha cultura, inclusive as barreiras extremas que pessoas marginalizadas dentro dessa cultura tiveram que superar", escreveu Lam. "Simplesmente estar sujeito ao consumismo americano e atender a um público branco remete à ideologia colonial".
Este tuíte, que foi compartilhado quase 42 mil vezes, estimulou uma onda de críticas ao vestido de formatura de Daum, com muitas pessoas no Twitter acusando-a de apropriação cultural. "Isso não está certo", escreveu outro usuário do Twitter. "Eu não usaria um traje coreano, japonês ou qualquer outro vestido tradicional, e eu sou asiático. Também não usaria roupas irlandesas tradicionais ou suecas ou gregas. Há muita história por trás dessas roupas".
"você simplesmente não usa se não for chinês ... não é algo para brincar de se vestir", escreveu outro internauta sobre este caso que foi um dos mais recentes exemplos do longo debate sobre a linha tênue entre apreciar e se apropriar da cultura.
Críticos de Daum a agrediram por uma foto em particular na qual ela e seus amigos mantêm as mãos juntas em poses de oração. Daum disse que eles fizeram a pose de uma personalidade popular do YouTube, o h3h3Productions, e que ela não tinha ideia de que a imagem seria interpretada como culturalmente ofensiva. A jovem respondeu à enxurrada de críticas dizendo que sua intenção ao usar vestido "não era de forma alguma discriminatória ou racista".
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Controvérsias semelhantes sobre a apropriação cultural surgiram na moda, na literatura, em Hollywood e em campanhas publicitárias. Um desses momentos foi quando as irmãs Kardashian foram acusadas de se apropriarem da cultura negra com camisas que mostravam o rosto delas sobre a imagem do Notorious B.I.G. Outro exemplo é o da escritora americana Lionel Shriver, autora do livro “Precisamos Falar Sobre Kevin”, que usou um provocativo sombrero mexicano em um debate em uma universidade americana e foi recebida com ira por ativistas das redes sociais. Alguns desses casos são claramente apropriação cultural, enquanto outros são mais difíceis de entender.
Apoio
A indignação do Twitter também provocou uma onda de apoio a Daum. Muitos, incluindo dezenas de pessoas que se identificaram como americanos asiáticos, defenderam a escolha da roupa, dizendo que não a consideravam ofensiva.
"Tenho ascendência chinesa e sou um colecionadora de qipaos, e acho ridículo que outras pessoas estejam te julgando!", escreveu uma mulher no Twitter. Outros condenaram os ataques à estudante do ensino médio que mal completou 18 anos. "Então esse cara achou uma garota aleatória na internet e convenceu mais de 100 mil pessoas a intimidá-la por causa de um vestido de baile de formatura", tuitou Ethan Klein, o homem por trás do popular canal do YouTube h3h3Productions.
"Tivemos que afastá-la, porque a situação foi esmagadora", disse a mãe de Daum, Melissa Dawes, ao Post. "São adultos atacando basicamente uma criança. Não era isso que ela queria”.
Nos dias em que as fotos se tornaram virais, Daum disse que fez questão de pesquisar o significado do vestuário na história e na cultura chinesas. Ela também diz que aprendeu sobre a velocidade e alcance das mensagens nas redes sociais e sobre a importância de poder ver seus próprios posts sob uma ótica diferente.
"Isso tudo me fez ser mais cuidadosa no que digo em posts e ver como isso pode ser interpretado de forma diferente pelas pessoas", disse ela. Mas, ao mesmo tempo, disse ela, "há pessoas que vão encontrar algo para ofendê-las, não importa o que seja".
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