Uma mulher de 21 anos teria sido impedida de amamentar o seu bebê em um terminal de ônibus em Santo André, na Grande São Paulo. Thais Magalhães contou ao G1 que foi abordada por três seguranças quando foi tentar amamentar seu filho de um mês, na manhã do dia 10 de julho.
De acordo com a mulher, os seguranças disseram que ela não poderia amamentar o bebê ali porque seria um “atentado violento ao pudor” e que chamariam a polícia. Thais disse que estava esperando o ônibus havia uma hora quando decidiu amamentar o bebê. “Foi a primeira vez que tentei amamentar em público. Me senti minúscula e coagida, como se eu estivesse expondo o meu filho, como se amamentar fosse algo errado”, disse ela em entrevista ao G1.
A Suzantur, concessionária responsável pelo terminal, afirmou em nota à imprensa que "todos os colaboradores do terminal foram convocados a fim de tentar elucidar o fato, assim como motoristas, cobradores e fiscais de linha que estavam no local na data em questão, indagados a respeito do assunto, relataram que nada ocorreu, não presenciaram nenhuma ação semelhante ao fato narrado".
Leia também: Ativistas antivacinas podem trazer doenças erradicadas de volta ao Brasil
O caso ganhou bastante repercussão e um protesto foi feito no mesmo terminal de ônibus em Santo André, na quinta-feira (12). O “mamaço” reuniu mães do ABC paulista que ficaram indignadas com a situação de Thais.
Esse não é um caso isolado. Os relatos de mães que foram reprimidas ou constrangidas ao amamentar em público são bastante comuns. Mas não deveria ser assim, já que amamentar é um ato natural e necessário ao bebê.
Nossas convicções: A valorização da mulher
"O direito de amamentar é um direito tanto da mãe quanto – principalmente – da criança", afirmou a enfermeira Celestina Bonzanini Grazziotin, consultora internacional em aleitamento materno. Ela explica que a amamentação é um processo natural, mas que, culturalmente, a amamentação em público é vista como um ato libidinoso no Brasil.
A enfermeira questionou os valores contraditórios dos brasileiros, “uma mulher pode expor as mamas e o bumbum em outdoors no Brasil inteiro, enquanto uma mulher que estava fazendo um ato natural é proibida”.
Direitos garantidos
Segundo Eliana Tavares Paes Lopes, coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher (Nudem) da Defensoria Pública do Estado do Paraná, a discriminação sofrida pelas mães não vem apenas dos homens. “Às vezes, outras mulheres que não tiveram filhos olham com nojo e reprovação. Isso mostra como está enraizada na sociedade a objetificação do corpo da mulher, o olhar sexual sobre o corpo da mulher, deixando de lado o direito da criança”, opinou.
No Paraná, a Lei 18.536, de 2015, diz que todo estabelecimento deve permitir o aleitamento materno no seu interior. A Lei Municipal 14.797, de 2016, também garante às mães o direito de amamentar em estabelecimentos públicos ou privados de Curitiba, e prevê multa de R$ 500 em caso de descumprimento.
Para Eliana, não seria necessário ter normas escritas para isso, pois o direito à proteção da mulher já está garantido pela Constituição Federal e por recomendações de órgãos internacionais. Ela lembra que o artigo 227 da Constituição Federal fala sobre a proteção à saúde e a alimentação da criança, e que o Estatuto da Criança e do Adolescente reproduz esse mandado de proteção. Além disso, documentos e tratados internacionais da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização dos Estados Americanos (OEA) também trazem essas recomendações e organismos internacionais como a OMS vêm se esforçando ao longo dos anos para mostrar a importância da amamentação.
“Os projetos de lei, em âmbito federal, estadual ou municipal, vêm dizer o óbvio justamente por essa necessidade de proteção, porque as mulheres são historicamente alvo de discriminação”, afirmou Eliana.
Celestina ressaltou que não se deve mandar a mulher amamentar em lugares insalubres, como banheiros. "A criança está no direito de se alimentar, e ela vai se alimentar na mama, quando a mãe assim o desejar. Claro, a mãe não vai se expor a ponto de mostrar as mamas em aberto – nenhuma mulher que está amamentando faz isso. O ato de amamentar geralmente é bem discreto. Muitas até se cobrem para evitar transtornos, mas acho que nem deveriam, porque amamentar é expor a mama para o seu bebê, e a outra está coberta pela roupa", disse.
A mobilização da sociedade pode ajudar a educar a população sobre essa questão. Eliana considera importantes as manifestações como a que ocorreu em Santo André. “A sociedade civil se organizar para promover os seus próprios direitos nesses atos é muito válido e ajuda na divulgação desses direitos”, disse.
Leia também: Ela doou medula óssea a uma criança. Ela sobreviveu e foi dama-de-honra de seu casamento
A importância da amamentação
O leite materno é o melhor alimento que a criança pode receber no começo da vida. Além de nutrir, a amamentação fortalece o vínculo entre mãe e bebê. “Ela está aconchegando o bebê no seu corpo. O olho no olho, o abraço e o calor do seu corpo promovem para a criança e para a mãe um vínculo muito importante de relacionamento”, disse Celestina.
A Organização Mundial da Saúde diz que o aleitamento materno é a melhor maneira de oferecer os nutrientes que os bebês precisam, e recomenda o leite materno como único alimento até os seis meses de idade, e com alimentos complementares até os dois anos ou mais. A OMS incentiva as pessoas a apoiar as mães para que elas possam amamentar em qualquer hora e qualquer local, e diz que a sociedade tem o papel de tornar as comunidades mais acolhedoras com a amamentação.