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As bases eugenistas da aparente contradição entre ‘gênio’ artístico e estupidez política

Wagner Moura, diretor e ator, foi alvo de críticas pelo filme Marighella.  | JOHN MACDOUGALL/
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Wagner Moura, diretor e ator, foi alvo de críticas pelo filme Marighella.  (Foto: JOHN MACDOUGALL/ AFP)

Ao comentar as bobagens recentes proferidas pelo ator, diretor e hagiógrafo de terrorista Wagner Moura, meu colega de Gazeta do Povo Pedro Menezes expõe o que ele chama de “longa tradição de artistas geniais e antas políticas”. O fato de Pedro Menezes incluir Wagner Moura no rol de artistas geniais é algo que talvez valha um debate. Mas não agora. Agora convém explicar a origem monstruosa dessa “tradição”. 

Provavelmente sem saber, porque a ignorância desses “gênios” das artes é antes de mais nada instintiva, Wagner Moura, ao proferir suas bobagens políticas e defender a cartilha de esquerda, nada faz além de comungar com o pai da “eugenia estética”, John Ruskin. Eugenia? Sim, você leu certo: eugenia. Ruskin é o pai estético e moral (ou melhor, imoral) de todos os gênios politicamente estúpidos que os movimentos artísticos dos séculos XIX, XX e, infelizmente, XXI foram capazes de gerar. 

Ruskin foi uma espécie de “agitador cultural” da Era Vitoriana. E, como era de se esperar desse tipo de gente, ele odiava tudo o que vinha do povo, de pessoas que ele via como esteticamente inferiores. Reacionário no sentido mais estrito da palavra, Ruskin defendia a alta cultura como uma forma de conduzir a Humanidade a um patamar de perfeição. Ou melhor, do que ele e os demais membros da sua casta de escolhidos consideravam a perfeição. Para tanto, era preciso eliminar não só as expressões artísticas menores como também o público que sustentava o que Ruskin via como uma vulgaridade indigna do ser humano.

Ruskin associou-se ao poeta inglês Thomas Carlyle, canalha da mesma estirpe, para juntos estabelecerem as bases informais do movimento eugenista que culminaria nos regimes ultratotalitários do século XX, responsáveis pela morte de milhões de pessoas com base na premissa de que o Estado era capaz de planejar todos os aspectos da vida do indivíduo – inclusive a apreciação estética. 

Não à toa, a dupla Ruskin & Carlyle era inimiga do liberalismo, que eles viam como uma forma de aumentar o intercâmbio entre os povos, promover a “diluição do caldo racial europeu” e, por consequência, arruinar a sensibilidade artística das gerações futuras. Para evitar essa “desgraça”, os eugenistas defendiam políticas hoje em dia associadas tanto à esquerda quando à direita brucutu, como nacionalismo, economia planificada, intervenção branda ou explícita nas manifestações artísticas consideradas inferiores e, claro, autoritarismo estético. 

A influência das ideias ruskinianas não pode ser desprezada. Essas ideias estão presentes no discurso e na obra de praticamente todos os artistas do século XX que em algum momento flertaram com a política, de T.S. Eliot a, sei lá, Roger Waters e, no Brasil, do naturalismo (explicitamente eugenista) à chamada Máfia do Dendê (que há ao menos quarenta anos domina o cenário cultural brasileiro), passando até por Drummond, pela poesia concreta e pela arquitetura de Oscar Niemeyer, sem falar na elite teatral brasileira, da qual Wagner Moura faz parte. 

Quando um artista, seja ele um ator medíocre e militante reacionário como Wagner Moura ou um compositor talentoso e militante reacionário como Chico Buarque, concretiza uma obra a fim de defender uma causa ou lutar contra o que ele considera mediocridade, não desconfie, e sim tenha certeza: você está diante de um ruskiano, enrustido ou não. Uma pessoa que, no fundo (às vezes nem tão no fundo assim), se considera estética e moralmente superior ao seu público. Um ser predestinado a educar os inferiores e guiar a Humanidade rumo ao Paraíso onde a economia é planificada e a casta dos artistas mantém suas regalias por meio do Estado, que deles precisa para legitimar culturalmente seu poder e alcance.

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