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As democracias ocidentais precisam contra-atacar a máquina de propaganda chinesa

Zhao Lijian: postura agressiva estimulada e recompensada pelo Partido Comunista. (Foto: Reprodução/ Twitter)

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A palavra “diplomata” sugere imagens de homens e mulheres sofisticados, cientes do sentido das palavras e de suas ações. Eles são discretos e se esforçam para não chamar a atenção. Eles tentam aparar arestas entre as nações, não criá-las.

Mas a China produziu uma nova safra de “diplomatas-lobos”, combativos e virulentos, que não têm medo de impor as narrativas de Pequim, mesmo que isso lhes custe relações. Eles ameaçam jornalistas e organizações de direitos humanos, exploram a liberdade de expressão ocidental para desinformar e perseguir as democracias, entre elas os Estados Unidos. Eles viraram manchetes ao se comportarem de uma forma que rompe com as normais diplomáticas. As democracias ainda terão de descobrir como reagir.

No começo de janeiro, enquanto Pequim estava silenciando dissidentes e menosprezando os riscos de um surto de coronavírus, o Ministério do Exterior da Suécia repreendeu o embaixador da China, Gui Congyou, por causa de seu comportamento antidiplomático. No ano anterior, Gui tinha enviado mais de 50 cartas e e-mails para a imprensa sueca, criticando-a por falarem sobre os dissidentes chineses e sobre as violações de direitos humanos em Pequim. Numa entrevista para uma televisão sueca, Gui descreveu a cobertura da imprensa sueca como “ataques frequentes ao Partido Comunista e ao governo chinês”. Ele comparou a imprensa sueca a um boxeador peso leve tentando vencer um rival peso pesado. Ele também ameaçou negar vistos de entrada para jornalistas suecos que cobriam temas ligados aos direitos humanos na China. A ministra das Relações Exterior da Suécia, Ann Linde, chamou as palavras de Gui de “uma ameaça inaceitável”, mas não exigiu que a China substituísse o embaixador.

Enquanto isso, a embaixada da China em Praga enviou uma carta ao presidente da República Tcheca dizendo que Pequim iria punir as empresas tchecas na China se um deputado tcheco visitasse Taiwan, uma vez que Pequim considera Taiwan uma de suas províncias. O deputado morreu antes de realizar a viagem, mas o primeiro ministro tcheco, Andrej Babis, considerou a carta da embaixada da China “inaceitável” e exigiu que Pequim substituísse o embaixador. A China ignorou a exigência.

O mais agressivo dos “diplomatas-lobos” chineses é Zhao Lijian, que ficou famoso no verão passado, trabalhando numa missão da China no Paquistão. Depois que 22 embaixadores nas Nações Unidas, de países como Estados Unidos e Reino Unido, assinaram uma carta aberta exigindo que Pequim parasse de prender arbitrariamente milhões de membros da etnia Uyghur, Zhao se expressou pelo Twitter, chamando-os de “hipócritas deslavados” e citando a invasão do Iraque em 2003.

Zhao, então, acusou os Estados Unidos de racismo, tuitando: “Em Washington DC, nunca vá para a região sudoeste, porque é uma região para negros e latinos. Há uma placa ‘negros sim, brancos não’, que significa que, sempre que uma família negra entra, uma branca sai, e o preço dos imóveis despencará”. Ele deletou o tuíte depois que Susan Rice, a ex-conselheira de segurança nacional, chamou Zhao de “um desgraçado racista. E incrivelmente ignorante também. Em tempos normais, você seria considerado persona non grata por isso”.

Zhao voltou para a China, mas, em vez de ser repreendido, foi promovido a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores. Em meio à pandemia que teve origem na China, Zhao é o melhor nome para a função de tirar a responsabilidade de Pequim pela omissão nas primeiras semanas do surto de coronavírus. Foi Zhao que, no Twitter, sugeriu a teoria da conspiração segundo a qual o coronavírus foi criado pelo exército dos Estados Unidos e plantado na China. É inconcebível que uma autoridade do alto escalão como Zhao possa fazer uma afirmação dessas sem a aprovação do Partido Comunista.

A promoção de Zhao levou seus colegas diplomatas a criarem contas no Twitter. Eles têm amealhado muitos seguidores, o que os transformou em armas eficientes na propaganda de guerra de Pequim durante a pandemia. Os tuítes deles são cheios de instruções governamentais, defendem as medidas de Pequim e mostram a China como uma heroína humanitária, além de promoverem a teoria da conspiração que Zhao inventou quanto às origens norte-americanas do vírus.

A ironia é que o Twitter, juntamente com outras redes sociais ocidentais, é bloqueado na China, então os chineses comuns não têm acesso a ele. Na verdade, vários jornalistas-cidadãos chineses que tentaram publicar vídeos de Wuhan, o epicentro da epidemia, nas redes sociais ocidentais desapareceram, supostamente presos pelo governo. Ao mesmo tempo em que restringe a liberdade de expressão de seu povo, Pequim encoraja seus diplomatas-lobos a disseminarem propaganda e desinformação, semeando confusão e divisão no Ocidente.

O Ministério das Relações Exteriores da China, onde Zhao trabalha, também está travando uma guerra midiática com os Estados Unidos. Zhao anunciou recentemente que o ministério retiraria as credenciais de imprensa de todos os cidadãos norte-americanos que trabalhavam para o Wall Street Journal, New York Times e Washington Post. Uma expulsão de repórteres estrangeiros assim aconteceu pela última vez em 1949, quando da fundação da República Popular da China.

Essa hostilidade é uma forma de esconder a insegurança do Partido Comunista, sobretudo de seu líder, Xi Jinping. Xi entrou numa guerra comercial de 20 meses com os Estados Unidos. A guerra afetou a economia chinesa, que já dava sinais de perder força. Por fim, Xi chegou a um acordo que previa um aumento na compra de produtos norte-americanos e várias mudanças importantes na forma de se firmar contratos. O acordo foi uma vitória tão grande para os Estados Unidos que Pequim se recusa a expor os detalhes dele para a população.

Mas o maior problema da liderança de Xi é a forma como ele lida com o coronavírus. Tanto a cronologia do surto de coronavírus criado pela consultoria Axios quando o mapa interativo do New York Times mostram que o acobertamento por parte das autoridades chinesas os levou a perderem um tempo crucial que podia ter sido usado para impedir a disseminação da doença. Hoje os casos confirmados ao redor do mundo já passaram dos 1,2 milhão, e cerca de 2 bilhões de pessoas estão sob alguma forma de quarentena. Uma recessão econômica mundial aparece no horizonte.

As autoridades chinesas, cientes da raiva cada vez maior contra o Partido Comunista, estão tentando reverter as críticas, se vendendo como heróis e pondo a culpa nos outros. As democracias ocidentais e as redes sociais deveriam desenvolver uma estratégia conjunta para enfrentar a máquina de propaganda chinesa. Se o Ocidente não reagir, Pequim ganhará ainda mais coragem para suprimir a liberdade de expressão – na China e internacionalmente

Helen Raleigh é colaboradora do Federalist e escritora.

© 2020 City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês

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