Na terça-feira (20), o Grupo Dignidade, organização em defesa dos direitos LGBT, usou as redes sociais para lançar uma nota de repúdio a um artigo publicado na Gazeta do Povo. O texto “Como os grupos LGBT estão destruindo as normas e mudando a educação” é de autoria do articulista conservador Dennis Prager.
A nota chama o artigo de “LGBTIfóbico, preconceituoso e discriminatório”. O texto diz ainda que “a liberdade de expressão deve ser analisada em sua relação com as demais garantias fundamentais insertas na Constituição Federal”.
Rebatendo ponto a ponto o artigo de Prager, a nota argumenta que “No caso desta tradução, LGBTIs estão sendo usados como espantalhos do neoconservadorismo de extrema-direita estadunidense, replicados pelo bolsonarismo filo-fascista brasileiro”.
Por fim, a nota menciona a decisão recente do STF, que considerou a homofobia equivalente ao crime de racismo, para concluir que “o ato da publicação do artigo” é “lamentável, senão (sic) criminoso” e que “a responsabilidade da empresa de comunicação pela conduta LGBTIfóbica deve ser apurada”. Outras 23 entidades subscrevem a nota de repúdio.
O poder do diálogo
A Gazeta do Povo repercute a nota de repúdio do Grupo Dignidade e das demais entidades de defesa dos LGBTs porque acredita no poder do diálogo. A crença da Gazeta do Povo na força do debate está exposta em suas convicções. Diz o texto que “à convicção de que o homem é capaz de atingir a verdade segue-se a convicção de que ele é capaz de recebê-la e de compartilhá-la (...).Se a disposição ao debate estiver de mãos dadas com o respeito à autonomia do outro (que se fundamenta, por sua vez, na convicção forte de que a dignidade do homem requer que a busca da verdade e a orientação da própria vida sejam alcançadas pelo esforço próprio e jamais impostas de fora) e com a disposição de retificar quando se percebe o erro, será possível evitar diversas armadilhas derivadas do voluntarismo relativista, como a intolerância contra as ideias que não estejam na moda – em outras palavras, a opressão do politicamente correto”.
Sem a livre circulação de ideias, por mais desagradáveis que elas possam parecer a alguns, abre-se a possibilidade de instalação de um ambiente de silêncio autoritário, repressivo e estéril. Em seu voto sobre a equiparação entre racismo e homofobia, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso Mello, reforçou o entendimento de que as “liberdades de pensamento” são “prerrogativas essenciais” garantidas pela constituição. “A livre expressão e divulgação de ideias não deve (nem pode) ser impedida pelo Estado, cabendo advertir, no entanto – precisamente por não se tratar de direito absoluto –, que eventuais abusos cometidos no exercício dessa prerrogativa constitucional ficarão sujeitos à apreciação do Poder Judiciário, mediante controle jurisdicional a posteriori”, escreveu. E acrescentou: “Na realidade, qualquer interpretação em sentido diverso transgrediria o espírito de liberdade que deve informar, animar e condicionar as relações entre o indivíduo e o Estado, especialmente se se considerar que o pluralismo de ideias, enquanto fundamento desta República (...), revela-se subjacente à própria concepção do Estado democrático de direito, consoante prescreve o art. 1º da Constituição do Brasil”.
Quando Dennis Prager, o autor do texto publicado na Gazeta do Povo, fala sobre a participação de atletas transexuais nos esportes, por exemplo, não propõe que este grupo de pessoas sofra qualquer tipo de discriminação ou que seja impedido de praticar atividades físicas. O que o trecho deste artigo faz é discutir se seria justo que homens biológicos participem nas categorias femininas em esportes de alto rendimento, como atletismo. Em outro trecho, quando o mesmo autor propõe o debate acerca da adequação de Drag Queens protagonizarem eventos com crianças na primeira infância, não se ofendem as Drag Queens. Argumenta-se a coerência desse tipo de evento para crianças na primeira infância, tal como tantos outros são cotidianamente discutidos. Nos demais casos expostos pelo autor, esta lógica permanece.
Num ambiente democrático, não se pode considerar como ofensiva a simples proposição do debate sobre diferenças biológicas inatas. Certas ou erradas, são proposições que podem e devem ter livre curso na sociedade e que não podem ser cerceadas.
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