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Quando a polícia prendeu uma rede especializada em furtos que operava em uma loja de bebidas na primavera passada (outono no Brasil), eles calcularam que as pessoas envolvidas haviam roubado pelo menos US$ 375.000 (mais de R$ 2 milhões) em mercadorias de varejistas como Walmart, Lowe's (loja de materiais de construção) e Walgreens (rede de farmácias). A dupla que liderava a quadrilha recrutava ladrões de pequeno porte, incluindo vários com histórico de detenção por tráfico de drogas, para descaradamente entrar nas lojas, furtar mercadorias caras e fugir em carros com placas falsas.
Embora a polícia e os promotores muitas vezes classifiquem o furto em lojas como um crime não violento, as farras da gangue resultaram em vários confrontos físicos, incluindo um em que um membro da gangue atacou um funcionário da loja com uma arma de choque. Isso pode parecer semelhante aos saques organizados que atormentaram lojas de luxo em São Francisco e outras comunidades do norte da Califórnia recentemente, mas essa gangue estava operando em Daytona Beach, Flórida — e fazia isso havia quase dois anos.
Na verdade, o crime contra o varejo tem aumentado nos EUA nos últimos cinco anos, com redes criminosas organizadas visando lojas em todos os lugares, de Woonsocket (Rhode Island) a Greensboro (Carolina do Norte) e Grafton (Wisconsin). A Federação Nacional de Varejo informou que as perdas nas lojas aumentaram de US$ 453.940 por US$ 1 bilhão em vendas em 2015 para US$ 719.458 em 2020. O maior aumento nesse período ocorreu não durante a pandemia, mas em 2019, quando as perdas totais com furtos em lojas subiram para US$ 61 bilhões, acima dos US$ 50 bilhões no ano anterior. Os lockdowns por causa da Covid-19 em 2020 e no início de 2021 moderaram as perdas, em grande parte porque as lojas estavam fechadas ou reduziram o horário de funcionamento. Agora que o varejo foi retomado, o crime aumentou novamente.
Ainda mais preocupante é o fato de que os furtos em lojas não se encaixam mais em seu molde tradicional como um crime não violento perpetrado principalmente por adolescentes ou usuários de drogas adultos. Quase dois terços dos varejistas pesquisados pela National Retail Federation (Federação Nacional dos Varejistas) disseram que a violência associada a furtos em lojas aumentou, liderada por gangues organizadas que revendem as mercadorias que roubam. Corie Berry, CEO da Best Buy (rede de produtos eletrônicos), disse recentemente que o crime em lojas se tornou tão disseminado que estava reduzindo os lucros e traumatizando os funcionários.
Assim como os varejistas, a polícia atribui parte da culpa pelo aumento do crime a uma diminuição generalizada das penas por furtos em lojas. “Como testemunhamos furtos descarados, as consequências são fundamentais”, disse Laura Cooper, presidente da Major Cities Chiefs Association (Associação dos Chefes de Polícias das Grandes Cidades dos EUA), antes do Dia de Ação de Graças. “Sem penas e responsabilização, as vítimas serão as comunidades e as empresas serão aterrorizadas.”
A recente onda de furtos em lojas da Califórnia chamou a atenção para a Proposição 47 — uma iniciativa de votação estadual de 2014, apoiada por uma série de grupos de esquerda e libertários, que, entre outras coisas, aumentou o limite criminal para furtos em lojas de US$ 450 em mercadorias para US$ 950. Logo depois que foi aprovada, os varejistas da Califórnia começaram a relatar um aumento acentuado no roubo de varejo, muitas vezes à vista de funcionários indefesos e clientes angustiados. “Esta é uma epidemia que tem efeitos de longo alcance, e é assustador e perturbador testemunhar”, relatou um morador recentemente ao jornal San Francisco Chronicle.
Em meio ao frenesi, redes nacionais como Walgreens e Target anunciaram que estão fechando suas lojas em São Francisco, enquanto outras reduziram o horário de funcionamento. Algumas autoridades inicialmente negaram que o crime estivesse aumentando, mas incidentes recentes forçaram o governador da Califórnia, Gavin Newsom, a anunciar que aumentaria o financiamento para combater o roubo no varejo. Enquanto isso, autoridades locais como o promotor público de São Francisco, Chesa Boudin, que processou menos ladrões de lojas do que seu antecessor, começaram recentemente a indiciar as gangues.
O que recebeu muito menos atenção, no entanto, é o fato de que a Proposta 47 da Califórnia não era uma exceção entre os estados. Nos últimos dez anos, quase metade de todos os estados aumentaram seus limites para roubos no varejo. Trinta e oito estados agora não consideram o furto em lojas um crime, a menos que US$ 1.000 ou mais em mercadorias sejam roubados. Um relatório da Federação Nacional dos Varejistas de 2020 sobre o crime organizado no varejo descobriu que dois terços dos varejistas nos estados que aumentaram os valores mínimos de furtos em lojas relataram — olha só — crescente roubo no varejo. Consequentemente, histórias como as de São Francisco se tornaram mais comuns.
Grafton, uma comunidade suburbana a cerca de 32 quilômetros ao norte de Milwaukee, está localizada na saída da Interstate 43 e abriga vários grandes shopping centers — alvos ideais para gangues. Dois terços de todos os crimes relatados no distrito são agora roubo ao varejo. “As pessoas estão literalmente saindo com carrinhos cheios de ferramentas elétricas e aparelhos de ar condicionado”, disse o chefe de polícia da cidade no início de novembro. “Eles pegam e saem tranquilamente.” Em Wisconsin, o limite para roubo criminoso é de US$ 2.500, um dos níveis mais altos do país. Enquanto isso, policiais da zona rural de Cabarrus County, Carolina do Norte, desmantelaram uma rede de roubo ao varejo de cinco pessoas em setembro passado, encontrando US$ 400.000 em mercadorias roubadas de lojas como Lowe's e Home Depot, incluindo ferramentas elétricas ainda nas caixas e pequenos eletrodomésticos. Levou mais de 12 horas para inventariar tudo.
Mudanças nas leis de fiança também desempenharam um papel na onda de crimes, dizem os varejistas. Cada vez mais, aqueles que se envolvem em delitos contra a propriedade — considerados uma ofensa não-violenta — estão rapidamente de volta às ruas, onde alguns voltam a roubar. Os varejistas da cidade de Nova York foram ameaçados por um ladrão conhecido como Man of Steal (Homem do Roubo, um trocadilho que faz sentido em inglês pela semelhança sonora entre as palavras Steal - roubar - e Steel - aço), preso 57 vezes apenas nos primeiros nove meses de 2021, incluindo 46 vezes por furto em lojas. Ele é um dos 77 criminosos habituais com pelo menos 20 prisões por furtos em lojas nas ruas de Nova York, graças à reforma da lei de fiança do estado, chamada de “desastrosa” pelo comissário de polícia Dermot Shea.
As consequências não intencionais de outras políticas governamentais contribuíram para o problema. A obrigatoriedade do uso de máscara permite que os criminosos cubram seus rostos nas lojas sem atrair atenção. A proibição de sacolas plásticas de uso único tornou aceitável que os consumidores andassem pelas lojas com suas próprias sacolas reutilizáveis não transparentes, permitindo que os ladrões as carregassem nos corredores e se dirigissem para as saídas. Alguns usam sacolas revestidas com alumínio, para evitar a detecção dos sistemas de segurança do varejo.
O aumento do furto em lojas foi acompanhado por uma escalada geral do crime, incluindo crimes violentos, em um momento em que os recursos da polícia foram reduzidos. Somente os assassinatos aumentaram 29% nos EUA em 2020, sobrecarregando os departamentos de polícia e fazendo com que o aumento dos furtos pareça um problema menor em comparação.
Somente agora, após anos de crescente roubo no varejo e os recentes incidentes de arrastões em lojas na Califórnia, o problema começou a chamar a atenção da mídia — um lembrete de que quando crimes de baixo nível crescem sem controle, eles inevitavelmente evoluem para algo mais perigoso e caro. Varejistas e policiais estão procurando novas formas para ajudar a conter os roubos. Eles gostariam que os governos locais alterassem as leis de furto em lojas para que o valor agregado dos bens roubados de um infrator reincidente pudesse contar para atingir o limite para acusações criminais, em vez de simplesmente contar o custo dos bens roubados de cada incidente separadamente.
Da mesma forma, empresas e especialistas em segurança querem fianças mais altas para infratores reincidentes, mesmo que os crimes em questão sejam apenas contravenções. Eles também querem uma lei federal contra gangues de furtos que atuam em vários estados — um fenômeno cada vez mais comum.
Finalmente, os varejistas físicos querem que o governo federal reprima os sites online que vendem produtos roubados. A ascensão do varejo on-line deu aos criminosos organizados uma maneira fácil de se livrar de seus espólios. No verão passado, um especialista em segurança da rede de drogarias CVS disse ao Wall Street Journal que esperava fechar 73 lojas online que estavam vendendo produtos ilegais no valor de US$ 104 milhões. As lojas reclamam que os operadores de grandes mercados online, especialmente a Amazon, não fazem o suficiente para verificar se os itens vendidos em seus sites são legítimos. Os varejistas fizeram lobby por uma lei federal exigindo que os vendedores on-line divulguem mais informações sobre suas operações, embora a Amazon e outras grandes empresas de tecnologia estejam resistindo.
As compras neste último Natal se aproximaram da normalidade pré-pandemia. A única questão agora é se essa normalidade também incluirá arrastões, ladrões que perderam a vergonha de agir à luz do dia e funcionários e clientes aterrorizados.
*Steven Malanga é o editor sênior do City Journal e George M. Yeager Fellow no Manhattan Institute.
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