Num passado não muito distante, as escolas de Bangladesh atendiam basicamente à elite, que recebia instrução em inglês, com currículo seguindo o modelo britânico. À maioria da população cabia o trabalho em plantações de arroz. E boa parte das garotas era obrigada a se casar assim que entrasse na adolescência. Ao longo das últimas duas décadas, esse cenário mudou rapidamente.
Entre os anos 2000 e 2016, o percentual de jovens participando do ensino primário saltou de 72% para 93%. No secundário, foi de metade para 72% no mesmo período. No ensino superior, estava perto de 0% há 21 anos, uma época em que o país tinha poucas faculdades e os ricos mandavam os filhos estudar no exterior — a primeira universidade privada do país só foi fundada em 1992. Em 2016, havia alcançado 16%, segundo um levantamento realizado pelo Banco Mundial com base nos dados fornecidos pelo governo local. O índice de adultos sem formação escolar ainda é alto, 44%. Mas, na virada do século, estava em 63%.
Além do resultado do investimento na formação de seus pobres, o país deu um salto nos indicadores que medem qualidade de vida: entre 2004 e 2019, o país viu sua economia crescer a taxas anuais sempre acima de 5%, e nunca baixo dos 7% desde 2016.
A expectativa de vida ao nascer alcançou 72,32 anos em 2018 — em 1998, era 64,25; em 1978, 51,43 anos. De 1988 a 2018, a mortalidade infantil despencou de 107,1 para 25,6 por 1.000 nascidos vivos. Bangladesh, que completa 50 anos de independência no dia 26 de março, está no melhor momento de sua curta história.
Atenção para as meninas
Para alcançar sucesso em sua aposta na educação universal, o governo local precisou lidar com um desafio cultural: convencer as famílias, especialmente das zonas rurais, a permitir que suas filhas estudassem. O esforço vem sendo recompensado. Se em 1998 apenas 39% das meninas em idade para estar no ensino médio se encontravam matriculadas, em 2017 esse percentual havia saltado para 67%.
“A mudança mais dramática que aconteceu para Bangladesh foi a transformação do status das mulheres, especialmente as mulheres pobres”, declarou, ao jornal The New York Times, o economista Muhammad Yunus, nascido no país e vencedor do prêmio Nobel por suas iniciativas para facilitar o acesso a microcrédito para empreendedores e empreendedoras.
Atualmente, há proporcionalmente mais meninas do que meninos nas escolas. Ao ter acesso a informações, elas tendem a esperar um pouco mais para ter filhos. A redução na taxa de fertilidade, que em 50 anos foi de 6,9 para dois filhos por mulher, é apontada, pelo Banco Mundial, como um dos fatores de redução da pobreza em Bangladesh, porque permite que as mulheres tenham mais anos da vida adulta para trabalhar, e também porque a renda resultante se distribui para menos pessoas.
Essas mulheres também estimulam a vacinação, o que reduz as taxas de mortalidade infantil, e desestimulam os casamentos de crianças da próxima geração. “Desde o ano 2000, o país reduziu a pobreza pela metade e tirou 25 milhões de pessoas dessa situação”, informa o Banco Mundial em um relatório sobre os avanços do país, que atualmente tem 163 milhões de habitantes.
“Redução das taxas de fertilidade e ganhos na educação alimentam o crescimento econômico e a redução da pobreza. Os avanços na economia e na infraestrutura foram fortalecidos por essas mudanças demográficas”, prossegue o texto, que aponta que a expansão da cobertura educacional para as meninas, viabilizada pelo aumento exponencial da rede de escolas no interior e num trabalho de convencimento junto às famílias mais pobres, “tem reduzido as desigualdades de gênero no país”.
Exemplo de esforço
“Bangladesh é um país pobre e independente há pouco tempo”, lembra Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas. Como diretora sênior para Educação no Banco Mundial entre 2014 e 2016, ela conheceu pessoalmente as escolas de Bangladesh.
“Eles ainda encontram grandes dificuldades, incluindo os altos índices de repetência e a insistência com a cultura de que meninas devem casar jovens. As turmas são muito grandes e a infraestrutura é precária”, relata Costin. “Mas o esforço que o país tem feito para mudar essas situações é enorme”.
A professora lembra que o exemplo de Bangladesh deveria servir de exemplo para o Brasil. “Somos um país muito mais rico, apesar das desigualdades sociais, e ainda assim sofremos sérios problemas de infraestrutura”, avalia.
De fato, segundo o Censo Escolar 2018, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 16% das escolas da educação básica brasileira não têm banheiro, 49% não estão ligadas a rede de esgoto e 26% não contam com acesso a água encanada. “O caso de Bangladesh deveria nos desafiar a ir muito mais longe”, diz a especialista. “Temos desafios que não são aceitáveis num país como o nosso”.
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