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Assessor especial da presidência, Celso Amorim conversa com presidente Lula durante evento em junho de 2023
Assessor especial da presidência, Celso Amorim conversa com presidente Lula durante evento em junho de 2023| Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

A recente alocução do Ministro da Defesa, José Múcio, em evento na Confederação Nacional da Indústria (CNI), alertando, a seu modo, para os prejuízos econômicos, diplomáticos e militares que o Governo Lula vem infligindo ao Brasil, surpreende menos por configurar uma crítica direta à gestão a qual ele integra, e mais por escancarar dois pontos cuja constatação não demanda especulações muito ousadas.

O primeiro é o fato de que a atual política externa brasileira não possui rumo estratégico nem bússola moral, o que causa acelerada degradação dos recursos de poder do país. Alega-se, correta e frequentemente, que a diplomacia lulista é caracterizada por forte ideologização. No entanto, deve-se notar que qualquer ação política, externa ou doméstica, contém certa carga ideológica, pois sua implementação se dá com base na visão de mundo de seus formuladores e executores.

O problema sobrevém quando essa ideologização, que decorre da visão geopolítica obsoleta do grupo político do presidente da República e é incapaz de construir uma agenda estratégica que tracione os interesses externos do Brasil, passa a atentar contra os imperativos de segurança nacional e de nossa própria soberania. Na medida em que essa ação externa é executada às margens dos interesses da sociedade, do parlamento e das demais instituições públicas, e com base em dados e interpretações incorretas do cenário externo, ela não pode mais ser considerada política de Estado, mas exclusiva de um grupo corporativista – razão pela qual o Brasil acaba sendo reduzido ao liliputiano tamanho de Lula em suas relações internacionais.   

Esse processo de aparelhamento e esvaziamento da diplomacia começou na gestão Lula 1, quando a política externa passou a ser orientada em função do personalismo do presidente e da plataforma programático-ideológica do Partido dos Trabalhadores, engendrada pelo então Secretário-Geral das Relações Exteriores (o número 2 do Itamaraty), Samuel Pinheiro Guimarães, e pelo Assessor Internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia. A indigência intelectual da política externa lulopetista, que atingira seu nadir durante a presidência de Dilma Rousseff, demonstrou que a esquerda, quando chega ao fundo do poço, sempre encontra um alçapão. A condução da política externa de Lula 3 pelo chanceler paralelo Celso Amorim é prova da determinação petista em prosseguir nas profundezas da insciência.

A segunda conclusão que se pode depreender das palavras de José Múcio tange à visão do atual governo sobre o papel das Forças Armadas (FA). Lula traveste seu revanchismo e suas ânsias autoritárias da crença na sandice segundo a qual o fortalecimento da democracia passaria pelo enfraquecimento das Forças Armadas e de nossas capacidades militares. Poder-se-ia inferir que Lula e Amorim ignoram o fato de que um dos critérios adotados para mensurar o poder de uma nação corresponde – junto a indicadores econômicos sólidos e robustas alianças externas – justamente às capacidades de projeção de poder e de dissuasão (as quais demandam estímulo à Base Industrial de Defesa, a BID, doméstica). Essa suposta ignorância, contudo, camufla um intento mais pérfido: o de enfraquecer as FA para consolidar seu projeto autoritário doméstico, para o quê estão dispostos a promover cortes orçamentários sistemáticos às compras de material de defesa à BID e torpedear a parceria entre Brasil e Israel no setor de defesa, entre outros.

Na lógica apedeuta de Lula, orçamento militar em um país “pacífico” como o Brasil seria gasto desnecessário, em um contexto internacional no qual a prudência recomenda, mais do que modernização, ampliação de meios bélicos. Nesse ensejo, melhor seria seguir os exemplos de Kiribati, Nauru, Palau, Samoa e Tuvalu, que não possuem forças armadas, e transformar os militares em valorosos combatentes do fogo ou assistentes sociais, com todo o respeito que esses ofícios merecem. 

Para onde vamos, não ouso dizer. Mas com a economia – marcada por déficit fiscal crescente – patinando, e com a degradação de nossas capacidades militares, caberia à diplomacia papel de destaque para compensar o desequilíbrio causado pela fraqueza de outros pilares. A depender dela, todavia, continuaremos exercendo papel de coadjuvantes, aplaudindo iniciativas de países mais competentes, mas com pouca influência na elaboração de políticas globais ou na definição de nossos próprios interesses. 

Marcos Degaut é Doutor em Segurança Internacional, ex-Secretário Especial Adjunto de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e ex-Secretário de Produtos de Defesa do Ministério da Defesa 

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