Uma equipe de cientistas brasileiros e norte-americanos realizou uma pesquisa que mostrou resultados surpreendentes da eficácia do antiandrogênico Proxalutamida no tratamento da Covid-19. Houve redução de 77,7% no número de mortes de pacientes graves que tomaram o medicamento e uma diminuição no tempo de internação, e de 92,2% quando considerados os pacientes que fizeram o tratamento completo.
A tese dos pesquisadores era que os medicamentos antiandrogênicos poderiam ajudar no combate à Covid tendo como base a observação de que homens com alopecia androgenética, mais conhecida como calvície, tinham maior propensão a quadros graves de Covid-19. A partir daí a equipe buscou diversas empresas que produzem estes medicamentos antiandrogênicos e conseguiram parceria com a chinesa Kintor para utilizar a Proxalutamida, criada para tratar câncer de próstata. Segundo os pesquisadores, algo que foi um grande achado por ser o antiandrogênico mais potente no mercado.
Entretanto, os pesquisadores estão sendo duramente criticados e acusados, dentre outras coisas, de apresentarem dados “bons demais para ser verdade”. Essas afirmações foram, porém, sendo derrubadas uma a uma com o passar do tempo e decisões judiciais deram ganho de causa à equipe autora da pesquisa. Agora, o coordenador do estudo no Brasil, o médico doutor em endocrinologia clínica pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Flávio Cadegiani, fundador e diretor médico do Instituto Corpometria, foi acusado pelo senador Otto Alencar (PSD/BA) na CPI da Covid, no Senado, de receber dinheiro para divulgar medicamentos sem comprovação por causa de um outro estudo sobre Ivermectina.
Para Cadegiani, essa acusação foi a gota d’água, pois continha insinuações completamente falsas e difamatórias. Ele conta que foi procurado para levantar dados e elaborar um estudo sobre a Ivermectina, um projeto de pesquisa e que o estudo foi devidamente aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep). Além disso, Cadegiani diz que recebeu um valor bem abaixo do usual para elaborar esse estudo, considerando o tempo e a quantidade de trabalho envolvido.
“Querem saber de uma coisa? Deu. Sem mais estudos em COVID-19. Porque tanto faz pesquisar. Tudo está armado para que não haja opções terapêuticas viáveis. Não iremos iniciar nem esse estudo e nem outros. Não fiz absolutamente nada de errado para ser tão perseguido”, desabafou em publicação no Twitter.
As pesquisas
A pesquisa da Proxalutamida foi realizada pelo Grupo Samel de hospitais, do Amazonas, e a empresa de biotecnologia Applied Biology, dos Estados Unidos.Os testes foram realizados com 600 pacientes de hospitais do Amazonas, 317 pacientes receberam o medicamento e 328 usaram placebo, dos quais 294 pacientes que usaram o medicamento e 296 pacientes que usaram o placebo completaram o estudo. Ao serem analisados os dados, verificou-se que o estudo obteve resultados surpreendentes, houve redução de 92,2% no número de mortes de pacientes graves que tomaram o medicamento, e também houve diminuição no tempo de internação e aceleração de mais de 100% na velocidade de recuperação.
Embora o estudo ainda esteja em revisão, uma avaliação independente feita pela COVID-NMA – a maior iniciativa internacional para avaliação de estudos sobre Covid-19, que trabalha em conjunto com a Organização Mundial da Saúde (OMS) e é liderada por uma equipe de pesquisadores da Cochrane e de outras instituições e universidades ao redor do mundo --, classificou o estudo da Proxalutamida como tendo o mais alto grau de qualidade de estudo clínico randomizado em COVID-19, recebendo nota máxima em todos os critérios de avaliação.
Enquanto o estudo de Manaus sofria ataques, uma outra pesquisa realizada pelo grupo – também com a proxalutamida – em pacientes ambulatoriais, que mostrou redução de 91% na taxa de hospitalização, pegou todos de surpresa ao ser publicado no final de julho na revista científica Frontier in Medicine. Poucos sabiam, mas o estudo da proxalutamida em pacientes hospitalizados só ocorreu porque resultados inesperadamente positivos foram encontrados neste primeiro estudo, realizado em Brasília. Embora não tenha recebido atenção da mídia, esse estudo foi classificado pela Universidade McMaster, do Canadá, como tendo a qualidade mais alta, obtendo nota maior até que outros grandes estudos em Covid-19.
Ataques e perseguição
Enquanto muitos comemoram essa conquista e elogiaram o trabalho dos cientistas por sua descoberta, outros teceram duras críticas, principalmente divulgadores científicos. A justificativa era de que o estudo não tinha sido revisado por pares, e publicado em revista científica de renome, portanto os dados ainda eram insuficientes para qualquer conclusão.
Embora não tivesse sido avaliado e tampouco conhecido pela ‘comunidade científica brasileira’, esta prontamente criticou a outra pesquisa – realizada em Brasília - quando o estudo foi publicado em uma revista científica, agora argumentando que a revista tinha fator baixo de impacto, o que está longe de ser verdade, pois trata-se da elite das revistas de maior fator de impacto do mundo.
Em relação ao estudo realizado em Manaus, Cadegiani conta que o estudo não tinha sido publicado porque o editor Eric Rubin, da revista científica New England Journal of Medicine (NEJM), disse que os resultados eram “bons demais para ser verdade” e que que os dados primários precisavam ser revisados. Assim, o estudo foi rejeitado, mesmo a pesquisa tendo cumprido todos os protocolos e fornecido todos os documentos com total transparência, como a autorização do Conep concedida antes do início do estudo, órgão que regula todas as pesquisas realizadas no Brasil, os relatórios semanais do comitê independente de monitoramento de dados, as auditorias, e até o banco de dados completo, algo que praticamente nenhum outro estudo em covid comprometeu-se a fazer, segundo Cadegiani,
Isso revoltou Cadegiani porque a revista levou quatro semanas para dar o parecer sobre o estudo e não apresentou nenhuma informação sobre problemas nos dados. Segundo ele, fazer isso em um momento em que não existem opções no tratamento da Covid é algo incompreensível. Além disso, ele argumenta que além do estudo da cloroquina publicado no Lancet, um outro estudo publicado na NEJM, que mais tarde precisou ser retratado em um escândalo de fraude nos dados envolvendo a empresa americana Surgisphere, foi aceito pela revista sem o mesmo rigor pedido a ele e sua equipe.
“Estávamos quase aceitos na maior revista médica do mundo, depois de termos respondido todas as demandas e de todos os revisores terem aceitado o trabalho, o editor tomou uma decisão unilateral sem explicar. Nós fizemos auditorias e entregamos tudo o que foi pedido. Dizer que o estudo é bom demais para ser verdade é um argumento vazio, ridículo e não científico”, disse
Segundo Cadegiani, a grande mídia brasileira só começou a dar atenção aos estudos sobre a Proxalutamida após o presidente, Jair Bolsonaro, começar a fazer propaganda da droga, politizando a questão. Mas ele diz que nunca iria abandonar uma pesquisa por causa de boatos ou de insinuações políticas. Mesmo não sendo bolsonarista, passou a ser perseguido como se fosse.
Ele conta que o estudo teve repercussão negativa internacional a partir de uma reportagem do jornal O Globo que chamou a Proxalutamida de “nova cloroquina de Bolsonaro” e denunciou que o Conep preparou denúncia ao MP sobre diversas irregularidades na execução do estudo. De acordo com ele, dados de inquéritos sigilosos e falsificados foram vazados ilegalmente para esta reportagem, incluindo depoimento de um conselheiro do Conep que não se identificou. Cadegiani explica que durante a realização do estudo todas as exigências do Conep foram seguidas.
Perseguido pela mídia
Para o médico infectologista Ricardo Zimerman, colaborador de Cadegiani no estudo da Proxalutamida, as afirmações feitas pela reportagem eram absurdas e também contraditórias, pois apresentavam duas questões opostas.
“Fomos perseguidos. Falavam coisas como ‘morreram duzentas pessoas no estudo’. Não, a maioria das pessoas que morreram durante o estudo era do grupo placebo, não que tomou o medicamento. Eram duas coisas paradoxais. Nos acusavam de fraude, dizendo que os resultados eram bons demais para ser verdade, por outro lado nos acusavam de negligência, porque se a proxalutamida estava salvando deveria ter sido dada para todo mundo que participou do estudo”, disse.
Entretanto, ele explica que estudos deste tipo precisam ter um grupo de controle para que se saiba se as pessoas estão de fato melhorando por causa do remédio e que, como o estudo era duplo-cego, os pesquisadores não poderiam saber quem estava tomando o quê. E ainda, quando o grupo independente, que tem acesso aos dados, viu nos relatórios a superioridade da Proxalutamida diante do placebo, o estudo foi suspenso.
Em 02/08 foi expedida decisão pelo juiz Manuel Amaro de Lima, da 3ª vara cível do estado do Amazonas, para que as reportagens do blog Malu Gaspar, do O Globo, fossem retiradas do ar no prazo de 48 horas, sob pena de multa diária de cinco mil reais. Na decisão, o juiz argumentou que as postagens eram ofensivas e inverídicas, e extrapolaram o limite da liberdade de expressão e imprensa, denegrindo a imagem dos autores do estudo.
A decisão foi comemorada por Zimerman, mas ele lamenta a tentativa do veículo de denegrir o trabalho, a despeito da qualidade da pesquisa. Ele diz que não é a primeira vez que foi perseguido. Em 18 de junho, ele esteve na CPI da Covid, junto do também médico infectologista, Francisco Cardoso, para explicar sobre os dados do Tratamento Precoce. Antes que pudessem falar, diversos senadores abandonaram a comissão, como o relator Renan Calheiros (MDB-AL) que justificou que não iria debater o uso de medicamentos segundo ele “comprovadamente ineficazes”.
Zimerman também foi acusado de receber 30 mil reais do governo para defender a cloroquina. Mas ele explica que foi contratado pela Opas para produzir um manual para auxiliar no diagnóstico de Covid. O Ministério da Saúde (MS), porém, decidiu não utilizar o manual e a Opas o demitiu. Depois o estudo foi utilizado pelo MS para produzir o aplicativo TrateCov, retirado do ar após denúncias de que sempre daria a mesma resposta após diferentes preenchimentos de um formulário: a prescrição do “Kit Covid”. Zimerman diz que não participou da elaboração do TrateCov, apenas o estudo em que este se baseou. Segundo ele, a equipe recebeu pagamento de apenas 10 mil reais e não 30 mil, como tinha sido acordado.
“Eu já tinha feito documento para a OPAS, já tinha sido consultor do Ministério da Saúde para ajudar a tipagem do HIV no governo Lula, já tinha sido consultor da OMS, para o fundo global contra tuberculose. Sempre que me chamaram, ajudei. Me chamaram de novo, e eu fui ajudar. Mas, quando eu entreguei o documento, alguém lá não gostou e me demitiram. A desculpa oficial foi que eu infringi uma cláusula do contrato”, disse.
Ele também conta que foi de alguém constantemente convidado para congressos e palestras a persona non grata, com pessoas que considerava amigos virando as costas, em uma mudança radical de pensamento. Tratado como “bolsonarista” e “disseminador de fakenews”, pela imprensa, ele conta que nunca imaginou que esse tipo de politização iria ocorrer, porque procurou sempre se desvencilhar de questões políticas.
“Independentemente de em quem cada um de nós vota na vida privada, estamos em uma missão que é bem maior do que isso, que é salvar o maior número de vidas possíveis. A história depois que se encarregue de colocar os heróis e os vilões onde merecem. Não podemos pensar nisso agora, não podemos atuar com medo de parar no lado errado da história caso não ‘ganhemos’ uma guerra que não estamos travando. A nossa guerra não é contra o outro lado, é contra o vírus”, disse.
Olhando para frente, Zimerman diz estar animado com os sinais de que os ataques estão diminuindo à medida que avançam os estudos sobre a Proxalutamida e as metanálises sobre a Ivermectina. Para ele, há uma revolução em curso, com os cientistas se dando conta de que podem fazer pesquisa por iniciativa própria, buscando formas alternativas de financiamento, em vez de esperarem pela ação das farmacêuticas.
“Daqui pra frente acho que o gênio está fora da lâmpada. No início era mais fácil de sufocar a verdade, mas em biologia você não engana todo mundo por muito tempo. Porque a verdade se expõe, se impõe e se torna clara. Acho que estamos em uma nova era de compreensão da fisiopatologia de vírus respiratórios e do fator hormonal na gênese da infecção”, finalizou.
O que diz o outro lado
A revista NEJM disse que o processo de publicação é confidencial e que não pode negar ou afirmar nada sobre quaisquer manuscritos não publicados.
O Conep disse que os dados dos protocolos estão sob sigilo em razão do “compromisso de confidencialidade, respeito à proteção da individualidade, observância aos direitos e obrigações relativos à propriedade industrial”, informou em nota.