Uma descoberta de pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sob liderança do geneticista Rodrigo Soares de Moura Neto, pode representar uma esperança de obtenção do canabidiol (CBD), substância terapêutica da maconha, a partir de outra planta nativa do Brasil, a grandiúva (Trema micrantha). A árvore de pequeno porte, que é comum nas Américas e se distribui do Uruguai à Flórida, tem CBD em seus frutos e flores, anunciou a equipe da UFRJ. Ainda não foi publicado estudo a respeito.
O CBD, que não tem os efeitos psicoativos relacionados ao uso recreativo da maconha, é usado para tratar doenças neurais com convulsões que começam na infância, propósito para o qual foi aprovado pela Administração de Alimentos e Drogas dos EUA (FDA, na sigla em inglês). Seu efeito terapêutico é associado às suas propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias. Uma revisão de 2020 sugeriu que o canabidiol é uma droga segura e com poucos efeitos colaterais.
Muitas outras aplicações médicas para o canabidiol foram propostas além do tratamento para diferentes tipos de epilepsia, porém ainda carecem de comprovação. Em 2018, botânicos reclassificaram a grandiúva e seus parentes do gênero Trema como pertencentes à família das canabáceas, com cerca de 170 espécies, que inclui a maconha (Cannabis sativa). Moura Neto e sua equipe da UFRJ informam que não encontraram na grandiúva o tetrahidrocanabinol (THC), molécula que produz os efeitos psicoativos da maconha. O CDB, contudo, pode ser convertido parcialmente em THC a temperaturas altas.
Não é a primeira vez que o CBD é encontrado em uma planta que não é a maconha. Em 2012, quantidades mínimas foram encontradas em sementes de linho. Porém, pesquisadores como o químico italiano Giovanni Appendino suspeitaram, em publicação de 2022, que foi contaminação pelo solo, como já foi mostrado no caso de plantas que se contaminam com nicotina a partir de bitucas de cigarro.
Mais promissora foi a trema oriental, canabácea do mesmo gênero da grandiúva que ocorre na África e no Sudeste Asiático. A planta, também uma árvore de pequeno porte, contém CBD em suas flores — mas junto com THC, como informou uma publicação de 2021. Tanto a trema oriental quanto a grandiúva (com vários outros nomes populares como pau-pólvora, periquiteiro e candiúba) são aplicadas como fitoterápicos tradicionais por povos que habitam sua área de distribuição.
Se a trema oriental serve como base, a equipe da UFRJ terá um desafio pela frente. Appendino e colegas informam que “o conteúdo de CBD era muito baixo” e que a substância não foi achada em todas as três localidades da Tailândia em que a trema foi coletada. Além disso, investigações anteriores da planta há duas décadas não encontraram CBD ou THC.
Uma outra sugestão foi feita de que o lúpulo, planta utilizada na preparação da cerveja, poderia ter canabidiol. Appendino e colegas são taxativos a respeito: “notável exemplo de fraude que vale a pena revisitar para se ter uma boa ideia de como os interesses comerciais em um mercado em grande parte não regulado (...) pode estimular a pseudociência”. Também já foi sugerida a presença de CBD na estévia, a mesma planta da qual é extraído um adoçante popular.
Os cientistas pedem mais estudos a respeito e permanecem céticos, aceitando como único caso de exceção à maconha como fonte de CBD a planta nativa da África do Sul Helichrysum umbraculigerum, uma erva conhecida em inglês como “sombrinha-de-lã” — que não é da família da maconha, mas da família dos crisântemos, margaridas e girassóis.
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